Tribuna do Norte Online

Bife, Ovo e Cavalo

Autor: Da Redação,
sexta-feira, 14/02/2025
Bife, Ovo e Cavalo Bife, Ovo e Cavalo

Na cidade de Apucarana, três amigos cresceram juntos, mas tomaram rumos muito diferentes na vida. Talvez fosse em Castro, como um tal Joca me contou, mas isso não muda em nada a história. Eles eram conhecidos como Bife, Ovo e Cavalo – apelidos que começaram como brincadeira, mas que, com o tempo, se mostraram assustadoramente fiéis à realidade.

Bife era o mais esforçado. Desde pequeno, carregava responsabilidades nas costas. Trabalhava, estudava, ajudava a família, sempre disposto a dar tudo de si. Ele não media esforços para fazer acontecer. Quando a vida o mastigava com dificuldades, ele se temperava com resiliência. Não reclamava, porque acreditava que o trabalho árduo trazia reconhecimento. Mas, toda vez que um projeto era concluído ou uma meta alcançada, via alguém levando os créditos. Ele ficava ali, abaixo de tudo, sustentando o prato, mas sem nunca ser a estrela. Bife, que não era um personagem de De Volta para o Futuro, entregava a sua vida pelos outros, mesmo que soubesse que isso não seria retribuído.

Ovo, por sua vez, sempre se ajeitou no topo. Ele gostava de estar presente, de fazer parte, mas nunca mergulhava de verdade. Tinha opinião sobre tudo, fazia questão de ser notado, mas sem se comprometer demais. Quando um problema surgia, ele se mantinha à margem, sem se arriscar. Estava lá, era visto, mas sua influência era sutil, passageira. No fundo, ele sabia que, se as coisas desandassem, ele não seria o primeiro a ser lembrado – e isso o confortava. E para ser sincero, maior esforço foi o da galinha que o pariu, ainda que ele fosse aquele que poderia ter sido e nunca foi.

Já Cavalo… Bem, Cavalo era esperto. Desde cedo, percebeu que o segredo da vida não era correr atrás de tudo, mas sim saber onde e quando aparecer. Ele nunca se desgastava demais, mas sempre estava no lugar certo, na hora certa. As oportunidades pareciam cair no colo dele. No trabalho, enquanto Bife carregava a equipe nas costas, Cavalo ficava com os créditos. Enquanto Ovo tentava ser notado, Cavalo já estava assinando o projeto e saindo na foto. Não que fosse cruel – apenas sabia jogar o jogo melhor que os outros. Seja por sorte ou esperteza, Cavalo não era o trabalhador que diziam por aí. Tinha tantas medalhas que mal se via o seu peito. Ele sabia tudo, até daquilo que nunca havia ouvido falar, afinal, não é o quê, é como.

Os três se reencontraram anos depois, num jantar casual. Sentados à mesa, sem perceber, pediram o mesmo prato: bife a cavalo.

Foi Bife quem riu primeiro. “Engraçado, né? Eu sempre fui o que mais se entregou e como nesse prato, fico sempre embaixo de todos. O ovo está ali, cobrindo o tal bife.

Ovo suspirou. “E eu sempre estive presente, mas sem realmente contar muito.”

Cavalo sorriu, sem pressa. “E eu? Bom… eu nem precisei estar no prato para ser lembrado.”

Houve um silêncio. Todos entenderam.

E então, sem aviso, Bife pousou os talheres e disse:

“Mas sabe o que mais me incomoda? A vida me fez acreditar que só existiam esses três papéis. Que ou eu me entregava por inteiro sem reconhecimento, ou eu me equilibrava na superfície sem realmente me comprometer, ou então eu aprendia a jogar para levar os créditos sem dar nada em troca. Mas e se eu não quiser ser nenhum dos três? E se eu quiser ser algo diferente?”

Ovo e Cavalo se entreolharam. Nunca tinham pensado nisso.

Ovo suspirou. “O problema é que o mundo já está montado assim. Tem gente que se doa, tem gente que observa e tem gente que aproveita. Mudar isso… é complicado.”

Cavalo cruzou os braços. “E quem disse que dá para mudar? O jogo sempre foi assim. Quem aprende a jogar melhor, vence.”

Bife sorriu, cansado, mas decidido. “Talvez. Mas não quero mais ser só uma peça nesse jogo. Quero lutar para que os Bifes sejam reconhecidos, para que os Ovos tenham coragem de mergulhar e para que os Cavalos percebam que levar o crédito sem esforço não significa vencer. Quero que o prato seja servido de um jeito diferente. E, se para isso eu precisar ser um pouco de cada, que seja.”

Ovo franziu a testa. “E se o mundo não quiser mudar?”

Bife pegou o garfo e apontou para o prato. “Então a gente muda o mundo. Nem que seja uma mordida por vez.”

O garçom trouxe os pratos. Mas, dessa vez, algo era diferente.

Eles não estavam apenas saboreando uma refeição. Estavam decidindo como queriam ser servidos à vida – e, mais do que isso, como queriam servir o mundo de volta.