Senado reage ao STF e aprova PEC do Marco Temporal para terras indígenas; texto vai à Câmara

Autor: Naomi Matsui (via Agência Estado),
Tuesday, 09/12/2025

O Senado aprovou nesta terça-feira, 9, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 48/2023 para incluir na Constituição a tese do marco temporal, que estabelece que os indígenas só têm direito às terras que ocupavam na data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. A aprovação da PEC vem antes da sessão presencial do Supremo Tribunal Federal (STF), marcada para esta quarta-feira, 10, em que a Corte analisará ações sobre o tema.

No primeiro turno da votação no Senado, foram 52 votos favoráveis à PEC contra 14 - além de uma abstenção. No segundo turno, foram 52 a 15, com uma abstenção.

O texto, que agora segue para a Câmara, foi modificado para incluir na Constituição garantias a particulares que comprovarem "posse de boa-fé", incluindo indenização pelo solo e por benfeitorias.

O PT e o governo pediram voto contrário. PL, União Brasil, PP, Republicanos, Podemos, PSDB e Novo orientaram pela aprovação. PSD, MDB e PSB liberaram suas bancadas.

Atualmente, o artigo 231 da Constituição garante aos indígenas os "direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam". O mesmo artigo define que "são terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente", além de outros fatores, mas sem estabelecer uma data de referência para a ocupação.

De autoria do senador Hiran Gonçalves (PP-RR), a PEC quer incluir na Constituição que os direitos valham para terras que estavam ocupadas em 5 de outubro de 1988. O relator, Esperidião Amin (PP-SC), adiciona um trecho para proibir a ampliação das terras "além dos limites já demarcados".

Outro trecho incluído mantém direitos de particulares com documentos (atos judiciais, compra e venda, etc.) ou que detenham "posse de boa-fé", nos casos em que não haja comprovação de ocupação indígena tradicional em 1988 nem prova de expulsão contínua da comunidade indígena.

O substitutivo estabelece que, se a União precisar desapropriar essas terras para destinar aos indígenas, deve indenizar previamente o particular pelo valor de mercado - a não ser que consiga compensar os indígenas com outra área equivalente. A indenização deverá ser feita pela terra nula (solo) e por "benfeitorias necessárias e úteis".

Segundo o relator, a proposta tem o objetivo de atender aos diferentes lados da disputa. "Espero poder contribuir para a vitória nem de A nem B, mas para a harmonia e para a segurança jurídica, que perdemos em função da supressão da ideia do marco temporal", declarou Amin.

O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), afirmou acreditar que a PEC não encerrará o debate, porque há falta de informações sobre quais terras estavam ocupadas em 1988. "Conhecemos vários casos de governos que tiraram indígenas do local e os colocaram em outros locais quando havia necessidade de uma obra pública", afirmou Wagner, que declarou voto contrário.

Defendida pela bancada da agropecuária, a PEC estava parada desde julho de 2024 e foi retomada pelo Senado numa reação ao ministro do STF Gilmar Mendes que, na semana passada, concedeu liminar para alterar o rito e tornar mais difícil o impeachment de ministros da Corte Máxima. A decisão incomodou o Congresso e foi alvo de manifestação crítica do presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União-AP).

Histórico de embates

Em setembro de 2023, o Supremo invalidou a tese do marco temporal e definiu que os proprietários que ocupavam as terras de boa-fé têm direito à indenização, a ser paga pela União. Dias depois, o Congresso aprovou uma lei que recria o entendimento do marco temporal. O caso voltou ao STF por meio de ações que questionam seu conteúdo. Gilmar Mendes, então, enviou as ações para conciliação para dar um fim ao que chama de "espiral de conflito".

O tema foi discutido em uma comissão no Supremo ao longo de mais de 20 audiências. A comissão foi encerrada em junho com poucos avanços, sem excluir a tese do marco temporal por falta de consenso. O Supremo deve avaliar se homologa ou não o acordo e também irá se pronunciar sobre pontos em que não houve consenso.

Gilmar tem indicado que deve descartar a tese do marco temporal em si, porque ela já foi declarada inconstitucional pela Corte. Mas o ministro deve buscar manter as mudanças propostas na comissão sobre os procedimentos de demarcação. Um desses pontos é a obrigatoriedade de participação de Estados e municípios onde se localiza a área reivindicada, em todas as etapas do processo.