Por Jones Santos
BELÉM, PA, 19 de setembro (Folhapress) - O fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, acusado de ser um dos mandantes da morte da missionária norte-americana Dorothy Stang, em 2005, enfrenta hoje, em Belém, o quarto julgamento pela mesma acusação.
Nos três julgamentos anteriores, Bida foi absolvido uma vez e condenado duas vezes. No último, em 2010, Bida foi condenado a 30 anos de prisão, mas o STF (Supremo Tribunal Federal) anulou o julgamento em maio deste ano, sob o entendimento de que a defesa do fazendeiro havia sido cerceada.
A defesa de Bida investe em dois elementos para tentar convencer o júri de sua inocência: o depoimento de um ex-policial federal que investigou a morte de Dorothy e um documento inédito que provaria que um delegado de polícia forneceu a arma do crime.
Bida era dono de um lote de terra em Anapu (a 766 km de Belém) visado por Dorothy para a criação de um assentamento.
Cinco pessoas são acusadas de participar do crime: além de Bida, Regivaldo Galvão, o Taradão, também foi condenado como mandante, mas foi solto por força de habeas corpus em 2012.
Rayfran das Neves Sales e Clodoaldo Carlos Batista foram condenados, respectivamente, como autor e coautor do homicídio. Amair Feijoli, o Tato, foi acusado de ser o intermediário entre os executores e os mandantes.
O julgamento
Em depoimento no julgamento, Bida negou ter pago R$ 50 mil pela morte da missionária. Disse ter se surpreendido ao ouvir de Rayfran a confissão da morte. Outra testemunha da defesa, funcionária do fazendeiro à época, reforçou a versão.
Rayfran também depôs e inocentou Bida --disse ter sido coagido pela polícia à época do crime para apontar o fazendeiro como mandante.
Tato, condenado como intermediário no caso, reforçou a tese da inocência e disse não se lembrar do depoimento, em troca de delação premiada, em que afirmou que Bida e Taradão ofereceram R$ 50 mil em troca da morte da missionária.
Francisco Cardoso dos Santos, amigo e vizinho de Dorothy, também testemunhou pela defesa e afirmou desconhecer atrito entre a missionária e Bida.
O depoimento considerado chave pelos advogados de Bida, do ex-agente da Polícia Federal Fernando Luiz Raiol, foi realizado ainda pela manhã. Raiol disse que participou das diligências que levaram à prisão de Rayfran e Clodoaldo nos dias seguintes à morte de Dorothy e que, tendo conversado com os pistoleiros, não ouviu menção a mandantes do crime.
Também pela manhã depuseram testemunhas arroladas pela Promotoria. A freira Roberta Lee Spires, conhecida como irmã Rebeca, falou das atividades desenvolvidas por Dorothy Stang com os PDS (Projetos de Desenvolvimento Sustentável) e do impacto que causavam na região, marcada pelo conflito fundiário.
O delegado Waldir Freire, que presidiu o inquérito, reafirmou a validade das investigações policiais que apontaram Bida e Taradão como mandantes.
O servidor do Incra Bruno Kenter falou sobre grilagem (apropriação ilegal) de terras na região e da militância de Dorothy pela desapropriação das áreas de conflito para a reforma agrária.
O promotor Edson Souza reafirmou que Dorothy foi morta em um crime encomendado por Bida e Taradão. "O que a defesa trouxe como fatos novos são, na verdade, dados inconsistentes que podem, inclusive, auxiliar em uma nova condenação", disse.
Os advogados de Bida se disseram confiantes na absolvição. "Os depoimentos mostram que houve uma operação para incriminar o Bida", afirmou o advogado Eduardo Imbiriba.
A previsão era que a sentença fosse divulgada amanhã de madrugada.
O crime
O assassinato de Dorothy Stang, de repercussão internacional, foi motivado por disputa de terras, segundo a acusação.
A missionária foi assassinada aos 73 anos em 12 de fevereiro de 2005, com seis tiros disparados à queima-roupa por Rayfran, que estava acompanhado por Clodoaldo.
O crime ocorreu em uma estrada de terra de Anapu (766 km de Belém) próxima a um lote pertencente a fazendeiros que Dorothy queria para transformar em assentamento rural.
Rayfran e Clodoaldo trabalhavam para Tato, que tinha um pedaço de terra naquele lote.
Tato comprou sua terra de Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida. Este, por sua vez, comprou de Regivaldo Pereira Galvão, o Taradão.
Os dois foram condenados como mandantes da morte, mas negam envolvimento com o crime.
Rayfran deixou o regime fechado neste ano, e cumpre prisão domiciliar. Tato cumpre pena em regime fechado, e Clodoaldo permanece foragido.
Bida está preso, e Taradão foi solto por um habeas corpus em agosto do ano passado.