Há uma linha que divide o Hemisfério Sul e o Norte quando o assunto é inovação. De acordo com o Global Innovation Index 2024, da World Intellectual Property Organization, o Brasil está na posição 50 de um ranking que conta com 133 países. Quando o assunto são as life sciences (ciências da vida, em tradução literal), área que estuda os organismos vivos e os processos relacionados à vida, fica um pouco melhor, mas há espaço para avanços, defende Sue Ann Costa Clemens, professora titular da Cadeira de Saúde Global e Desenvolvimento Clínico na Universidade de Oxford e diretora do Oxford Latam Research Group.
"Focando na inovação em ciência, em relação aos líderes globais de pesquisa, estamos na posição 21. Entre os países de baixa e média renda, somos o número 2, o que é excelente", contou ela no Summit Saúde e Bem-Estar, promovido pelo Estadão nesta segunda-feira, 14.
"Na parte de produção científica, estamos, no ranking global, na posição número 14. A USP, na posição número 1 na América Latina, mas quando olhamos a nível global, na posição 106. O que está faltando? Está faltando a gente traduzir pesquisa e inovação em impacto em saúde", apontou.
Superar essa lacuna em ciência translacional, isto é, em converter os achados de uma pesquisa em um "produto" e oferecê-lo à sociedade, é fundamental, afinal, inovação está diretamente ligada à melhoria da qualidade de vida e ao aumento dos anos de vida, segundo Sue.
"Certamente, se estamos aqui hoje, gozando de boa saúde, com essa recepção tão calorosa, inovação e pesquisa tiveram muito a ver com esse desfecho", destacou ela, no início do evento, ao lembrar que sua primeira participação no Summit foi completamente remota, enquanto o mundo era assolado pela pandemia da covid-19.
O que é inovação?
Embora a primeira coisa que venha à cabeça quando o assunto é inovação seja um produto novo, nem sempre é assim, destaca Sue. "A inovação também pode ser um aprimoramento de algo que já existe."
Um requisito fundamental, destaca, é a criatividade. "A inovação é disruptiva, desafia o status quo, e isso, às vezes, nos deixa um pouco cautelosos." É por isso que ela defende que é necessária muita transparência. "Se for transparente e for explicado, ela se torna muito mais fácil de ser absorvida, de trazer fomento e gerar empregos e crescimento econômico."
Oportunidades
Durante o evento, apontou que, na área das ciências da vida, os focos para inovação são:
- Oncologia personalizada
- Preparação para a pandemia
- Resistência antimicrobiana
- Erros inatos do metabolismo
- Distúrbios genéticos
- Impactos das mudanças climáticas na saúde
- Obesidade
- Longevidade
"Mais uma vez, nós temos talentos e provamos isso via nossa produção científica em diferentes nichos, mas se esses nichos não se conectarem, a gente não entrega impacto. Ou seja, a inovação não é sustentável, não está aplicada a nossa realidade."
Nesse sentido, há muitos desafios para os pesquisadores, segundo ela. No Brasil, especialmente, em geral, eles não têm dedicação exclusiva, destaca. "Ele tem vários empregos e, além disso, tem que fazer a pesquisa." Ela defende mais fomento, capacitação, mentores capacitados, além de um desenvolvimento de carreira programado e um investimento da indústria nacional.
"É muito fácil a gente chegar aqui e falar: 'vamos fazer isso'. Mas se você não tem um profissional qualificado Às vezes, ele é bem qualificado tecnicamente, na doença, na patologia, mas não no desenvolvimento. O pesquisador tem uma formação diferente do médico e do enfermeiro."
O papel da IA
Especialista na área de vacinas, Sue se mostrou animada com os avanços que a inteligência artificial pode trazer. Segundo ela, a IA é preditiva para o controle de doenças infecciosas e para a identificação de alvos e design de produtos candidatos. "Ao invés de ficarmos anos na pesquisa de bancada, entendendo qual é o receptor, o antígeno, qual é a melhor plataforma para o desenvolvimento daquele produto, a inteligência artificial nos ajuda a acelerar esse processo com qualidade."