A atual geração praticamente desconhece os orelhões. Em tempos de 5G, a nova tecnologia de comunicação que chegou oficialmente ao Brasil nesta semana, esses equipamentos parecem obsoletos e itens de museu. No entanto, o Telefone de Uso Público (TUP) – o nome oficial do orelhão – ainda é realidade. Em Apucarana, segundo levantamento da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), 89 orelhões estão ativos na cidade. Em Arapongas, são 62 em funcionamento. Os dados têm como referência o mês de maio.
O número é muito menor em comparação com a era pré-digital. Na época, os aparelhos estavam espalhados por praticamente todas as cidades e as filas para fazer ligações eram comuns. O “sumiço” dos orelhões ocorreu por conta da atualização da política de comunicações no Brasil. Um decreto publicado pela Anatel em 2018 liberou as concessionárias de telefonia da obrigação de investir em orelhões. Em troca, as empresas deveriam levar o sinal de celular 4G para todo país.
Segundo a Anatel, no entanto, esses equipamentos vão continuar existindo em locais estratégicos, como delegacias, hospitais, escolas, entre outros prédios públicos. A reportagem encontrou esses telefones públicos em Apucarana justamente nesses pontos.
Na calçada do Colégio Estadual Professor Izidoro Luiz Cerávolo, dois orelhões estão ativos e funcionando. No entanto, esses aparelhos públicos de telefonia são completamente ignorados pelos estudantes, a maioria com celulares em punho.
O estudante do 1º ano do ensino médio, Flávio Pereira de Miranda, aguardava a van ao fim da aula. Ele estava checando uma mensagem no celular ao lado dos orelhões. O adolescente conta que nunca utilizou esse serviço. “Sempre usei o celular”, afirma o garoto, que tem um aparelho de telefonia móvel desde a infância. “Nem lembro quando ganhei (o celular). Era criança”, disse o estudante, pedindo licença para entrar na van já estacionada junto à calçada.
Além do Colégio Cerávolo, outro equipamento funcionando foi encontrado em frente ao Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac). Já o orelhão na esquina da Prefeitura de Apucarana com o Colégio Estadual Santos Dumont estava “mudo” no início da tarde desta quinta-feira (7).
Entre 2015 e 2019, a Oi - empresa responsável pelo serviço - foi punida pela Anatel por conta do "baixo desempenho na disponibilidade dos telefones públicos" (menos de 90% dos orelhões em funcionamento no estado e menos de 95% em funcionamento nas localidades que só dispõem de telefone público) e, por isso, as ligações locais e interurbanas deixaram de ser cobradas em todos os orelhões. Segundo a Anatel, desde o início de 2019, a empresa não mais está obrigada a conceder a gratuidade de chamada a partir de seus terminais.
A reportagem testou dois orelhões. Em um, conseguiu realizar a chamada sem cartões. Em outro, não. A reportagem procurou bancas de jornais, padarias e postos em busca de cartões telefônicos. No entanto, não conseguiu encontrá-los em vários locais procurados na cidade. Segundo a Anatel, a concessionária deve comercializar os cartões "por meio de postos de venda instalados em conformidade com a distribuição geográfica dos terminais, na proporção de um posto para cada 12 orelhões, ou setores de atendimento presencial e estabelecimentos associados à marca da concessionária, bem como por meio de postos de revenda instalados em conformidade com a distribuição geográfica dos orelhões, na proporção de um posto para cada 24 orelhões".
Caso não haja disponibilidade de cartões, a empresa é obrigada a liberar ligações sem cobrança por determinado período. "Cabe ressaltar que, nos termos do parágrafo único do art. 40 do Regulamento do Telefone de Uso Público do Serviço Telefônico Fixo Comutado - STFC, aprovado pela Resolução nº 638, de 26/06/2014, naqueles TUP (orelhões) instalados em localidades sem Postos de Venda ou Postos de Revenda ou em localidades sem oferta de cartões indutivos por qualquer motivo, fica a concessionária obrigada a permitir a realização de chamadas locais e de longa distância nacional com destino a terminal de acesso fixo, de forma não onerosa, com duração de, no mínimo, 5 (cinco) minutos".
HISTÓRIA
Projetado pela arquiteta e designer Chu Ming Silveira, nascida na China, esse formato de telefone de uso público foi lançado em 1972 inicialmente nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo. Nas décadas seguintes, os orelhões (que na verdade são protetores acústicos para as ligações) se espalharam por todo Brasil e países da América Latina, como Peru, Colômbia e Paraguai, em países africanos como Angola e Moçambique, na China e em outras partes do mundo.
Chu Ming Silveira nasceu em Xangai, mas chegou ainda na infância ao Brasil, e formou-se na Faculdade de Arquitetura da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em 1964.
Por Fernando Klein