Sete das 20 pessoas que mais enviaram Pix ao ex-presidente Jair Bolsonaro já haviam doado R$ 470 mil para a campanha à reeleição do ex-presidente.
A lista dos maiores doadores inclui o integrante de uma empresa acusada de exigir dos funcionários voto em Bolsonaro nas eleições de 2022 e um marinheiro que ganha R$ 4 mil e doou R$ 20 mil. Os dados aos quais o Estadão teve acesso foram levantados pelo Coaf a pedido da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga os ataques aos Três Poderes em 8 de janeiro.
No total, Bolsonaro recebeu R$ 17,2 milhões via Pix ao longo deste ano. O valor corresponde quase à totalidade dos R$ 18,5 milhões que circularam nas contas do ex-presidente em 2023.
Em junho, assessores, deputados e influenciadores promoveram uma campanha pedindo doações por Pix a Bolsonaro. Os aliados alegaram que o ex-presidente seria vítima de "assédio judicial" e que precisava de ajuda para pagar o que chamaram de "diversas multas em processos absurdos". As multas, contudo, ainda não foram pagas e Bolsonaro investiu o valor arrecadado. Em evento na semana passada, ele disse que o dinheiro era suficiente para comprar pastel e caldo de cana para ele e a ex-primeira-dama Michelle.
Professora da Faculdade de Direito da USP, Elizabeth de Almeida Meirelles considera que, caso fique comprovado que a quantia arrecadada não foi utilizada para o fim anunciado na campanha de arrecadação, os organizadores podem ser obrigados a devolver o dinheiro. "As pessoas que doaram e que estiverem se sentindo lesadas podem entrar com uma queixa criminal contra os organizadores da campanha", diz Elizabeth. Para a professora, o próprio Ministério Público (MP) pode alegar que houve fraude ou tentativa de golpe, visto que a campanha foi pública.
Já o professor Eduardo Tomasevicius Filho, da Faculdade de Direito da USP, diverge. Para ele, a campanha de arrecadação foi estruturada de tal modo que configuraria uma doação pura, ou seja, feita sem condições ou encargos. "(Neste caso), quem doa, não pode reclamar que doou", conta.
O relatório do Coaf enviado à CPMI traz a lista dos 20 maiores "remetentes". As doações, por sua vez, variam entre R$ 5 mil e R$ 20 mil no período.
No topo está o marinheiro reformado Pedro Cipriano, de 78 anos, que enviou R$ 20 mil para o ex-presidente. Ele também doou à campanha de Bolsonaro nas últimas eleições, mas o valor foi bem mais modesto: R$ 2. Cipriano foi cabo da Marinha e está reformado desde maio de 2001. Ele tem uma remuneração bruta de R$ 4.019,31, segundo informações do Portal da Transparência. O militar também é sócio, ao lado de outras 16 pessoas, de uma empresa de navegação, a Itajaí & Navegantes, com capital social de R$ 38 mil.
Apesar da doação de R$ 20 mil, o marinheiro acumula hoje em seu nome dívidas ativas de R$ 4,1 mil em IPTU à Prefeitura de Itajaí, além de R$ 1,6 mil ao governo de Santa Catarina. Essas informações foram obtidas pelo Estadão junto aos órgãos públicos. A reportagem tentou contato com Cipriano, mas não houve sucesso.
A lista dos maiores doadores inclui ainda o empresário Gilson Lari Trennepohl. Ele é vice-prefeito de Não-Me-Toque, no interior do Rio Grande do Sul, e sua família é dona da Stara, empresa do ramo de máquinas e implementos agrícolas. A companhia foi alvo de uma ação do Ministério Público do Trabalho (MPT) acusada de assédio eleitoral a favor de Bolsonaro durante a campanha eleitoral de 2022. Na ocasião, a Stara emitiu um comunicado ameaçando cortar 30% do orçamento caso Lula ganhasse a eleição.
Em abril deste ano, a Stara firmou um acordo com o MPT e assegurou pagar R$ 1,5 milhão em indenização por danos morais coletivos. O valor será revertido a projetos sociais na região. Duas parcelas de R$ 250 mil foram pagas.
Gilson Lari já havia doado R$ 350 mil para Bolsonaro nas eleições de 2022, o que o deixou entre os maiores financiadores do TSE. Agora, repassou mais R$ 5 mil para ajudar o ex-presidente a pagar suas dívidas. A Stara também enviou tratores para a comemoração do bicentenário da Independência, em 7 de Setembro de 2022, em um movimento que flertou com ataques às instituições democráticas.
As doações também foram realizadas pelo ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Admar Gonzaga, pelo locutor de rodeios Cuiabano Lima e pelo empresário Marcos Ermírio de Moraes, herdeiro do Grupo Votorantim. Em entrevista ao Estadão, o ex-ministro disse que "não está preocupado se Bolsonaro vai usar o dinheiro para pagar Pix".
Confira a lista das pessoas que mais enviaram recursos a Bolsonaro em 2023:
- Partido Liberal - R$ 47.865,34
- Cecilia Nascimento Crippa - R$ 20.000,00
- Pedro Cipriano - R$ 20.000,00
- Carlos Monteiro De Oliveira - R$ 10.010,00
- Jurema Caldas Siqueira Amaral - R$ 10.000,00
- Marcos Ermírio De Moraes - R$ 10.000,00
- Andraus Araujo De Lima - R$ 10.000,00
- Banco Daycoval S.A. - R$ 9.647,43 (62 lançamentos)
- Paolo Papaiz - R$ 5.000,00
- Maria Bernardete Demeterco Raad - R$ 5.000,00
- Marcelo De Toledo Cerqueira - R$ 5.000,00
- Rosângela Deliza - R$ 5.000,00
- Luiz Ricardo Samia - R$ 5.000,00
- Amauri Heitor De Mendonça - R$ 5.000,00
- João Carlos Colpo - R$ 5.000,00
- Gilson Lari Trennepohl - R$ 5.000,00
- Admar Gonzaga Neto - R$ 5.000,00
- Karina Carvalho De Almendra Freitas Mendes - R$ 5.000,00
- Haroldo De Sa Quartim Barbosa - R$ 5.000,00
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