Cinco dias antes de renunciar ao cargo de presidente da Comissão Permanente de Direitos e Prerrogativas da OAB-SP, assim como da candidatura ao Conselho Federal da Ordem, o criminalista Luiz Fernando Pacheco foi alvo de uma representação por suposto abuso de poder político feita à Comissão Eleitoral da entidade. A ação, que tinha como pivô um comentário feito por Pacheco no Instagram, também chega a pedir multa e uma eventual cassação da chapa OAB sempre em frente - encabeçada pelo vice-presidente da entidade Leonardo Sica, que concorre à chefia da seccional pela situação - em caso de "reincidência".
O comentário que gerou o imbróglio foi feito por Pacheco no último dia 27 para criticar o também advogado Ezequias Alves da Silva, após este declarar incentivo à oposição. "Lamento fortemente por você que é preto se juntando a uma oligarquia, preto prestigiando quem se acha monarca", escreveu Pacheco.
Logo em seguida Pacheco disse "reconhecer o tom desregrado do que escreveu". Sobre a representação eleitoral da qual foi alvo, Pacheco afirmou neste domingo, 3, que tudo o que foi requerido no documento ele já havia realizado "espontaneamente, por decisão pessoal".
"Inclusive fui além: apaguei a postagem que havia publicado no Instagram do dr. Ezequias, assumi meu equívoco, pedi desculpas particularmente a ele e publicamente também. E me abstive de qualquer outra publicação sobre o tema em redes de internet", frisou.
Pacheco ainda disse não "admitir a pecha de racista". "Me conheço bem, sei quais são os valores que pautam minha vida. A militância ativa pelo antirracismo sempre fez parte das minhas lutas", frisou.
A representação eleitoral contra Pacheco e sua antiga chapa foi impetrada na segunda, 28, pelo ex-presidente da OAB-SP Caio Augusto Silva dos Santos - que tenta um novo mandato na seccional na chapa Caio+Gandra+DUrso pela Ordem.
No sábado, 2, cinco dias depois, Pacheco anunciou sua renúncia ao cargo e à sua candidatura ao Conselho para o próximo triênio. O advogado sustentou que a decisão foi motivada "pelo compromisso com a integridade da chapa e por coerência com as pautas da gestão, com enfoque nas políticas de equidade racial e antirracistas".
À Comissão Eleitoral da OAB-SP, os ex-concorrentes de Pacheco alegaram que o advogado "abusou de seu direito de manifestação ao proferir, em rede social do advogado Ezequias comentários desrespeitosos e discriminatórios que ofenderam não apenas a honra do advogado, mas também todos os integrantes da chapa".
Para o grupo, o comentário "não só ridicularizou e desdenhou da escolha de Ezequias por apoiar a chapa, como também fez referências ofensivas que visaram, de forma explícita, menosprezar e deslegitimar a chapa como um todo". A representação alega que o comentário expôs os membros da chapa "a uma situação vexatória e prejudicando a lisura e a igualdade de condições no processo eleitoral".
"A prática, portanto, é configurada como um ato de abuso do poder político, violação à honra e ética, e evidente demonstração de violência política, ao denegrir o caráter de todos os envolvidos na chapa e ao comprometer a legitimidade do processo eleitoral em curso", alega a chapa.
O grupo ainda atribui a Pacheco racismo, o que pode gerar desmembramentos do caso. "Ao enfatizar a condição racial de Ezequias como elemento depreciativo e ao associá-la a uma alegada submissão, Luiz Fernando recorre a estereótipos racistas que buscam deslegitimar a autonomia e a dignidade do colega. Tal manifestação não só fere a honra individual de Ezequias, mas também representa uma afronta direta aos princípios constitucionais de igualdade e de não discriminação, aos quais a Ordem dos Advogados do Brasil está integralmente comprometida", sustentam.
COM A PALAVRA, O ADVOGADO EZEQUIAS ALVES
Tomei conhecimento, pela imprensa, da renúncia, pelo Dr. Luís Fernando Pacheco, ao cargo de presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB-SP, no último sábado, 02/11/2024. Conquanto possa ter sido consequência - face à repercussão negativa da ofensa no seio da Advocacia -, o ato de renúncia, em si, não repara a ofensa irrogada a mim e a meus iguais. A renúncia ao cargo que ocupava na OAB, daquele que me ofendeu, foi tão somente o resultado de uma ação conjunta de parte da advocacia que me ombreia, composta por muitos negros e negras e também por pessoas brancas. Cabe consignar que, não houve por parte da atual gestão OAB/SP qualquer manifestação contrária de censura ao ato criminoso perpetrado pelo ofensor. Aquele que me ofendeu ocupava o cargo de Presidente da Comissão de Prerrogativas da OAB, o qual possui formação que lhe confere instrumentos para aferir a repugnância do ato cometido contra um homem negro! Em suas palavras, proferidas em aberto para o grande público, um homem negro tem pouca inteligência, assume conduta servil, é perdedor, por simplesmente exercer um direito que é de todos - declarar seu voto! Trata-se de uma conduta absolutamente repugnante, criminosa que ofende a todos e todas que entendem que a liberdade de escolha é um bem maior a ser zelosamente defendida. Uma atitude que deveria ter sido rechaçada primeiramente pela OAB, vez que envolve dois integrantes de uma instituição essencial à construção da democracia e sobretudo porque se trata de um ataque racial, que perpetua desigualdades. Infelizmente não foi o que se viu. Temos até aqui, apenas uma tardia decisão individual do ofensor que arrefece diante da nota sobre o ocorrido, em que este declara seus feitos na esfera dentro da OAB a fim de contrapor a alcunha racista. Desculpas, demonstração de arrependimento, são ações válidas se em conjunto com atitudes que assinalem a tomada de consciência do erro. Inapropriado que alguém que teve conduta racista busque em seus feitos antídoto para a ação ilícita. Mas felizmente grande parte da advocacia pensa como eu e seguirá ao meu lado até as últimas instâncias. Pessoas que acreditam que a ofensa à dignidade de qualquer pessoa humana é uma ofensa a toda humanidade e que a sociedade, como um todo, precisa intensificar esforços para construção de uma sociedade mais inclusiva e justa. Informo por oportuno que, seguiremos firmes no propósito de buscar a reparação devida, pelos meios previstos em Lei, inclusive pelo Desagravo Público, previsto no Estatuto da Advocacia.
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