O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que a negociação para uma base de apoio ao governo no Legislativo precisará ser construída no varejo, a cada votação no Congresso. Neste início de governo, o Palácio do Planalto enfrenta dificuldades para constituir uma frente governista entre os parlamentares e principais bancadas partidárias. Nos últimos dias, após reveses no plenário da Câmara, o governo acelerou a liberação de recursos para deputados e senadores.
O ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou ontem que o governo já liberou aos parlamentares R$ 4 bilhões em emendas negociadas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que estavam "penduradas". O ministro procurou atribuir à gestão anterior o que chamou de "calote" em Estados e municípios pelo não pagamento da verba programada.
Os recursos compõem o pacote de restos a pagar do orçamento secreto, mecanismo declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Como mostrou o Estadão, o governo Lula não colocou em prática procedimentos para dar transparência à distribuição das emendas. O valor total deve chegar a R$ 9 bilhões. As verbas serão liberadas pelos ministérios das Cidades e da Integração Nacional e poderão ser pagas conforme o resultado das votações e a "fidelidade" dos parlamentares.
Além de ser pressionado também pela liberação do saldo deixado por Bolsonaro, o Planalto mandou pagar R$ 10 bilhões em emendas do Orçamento de 2023.
TESTE
Ao participar do lançamento de um programa de escolas de tempo integral, em Fortaleza (CE), Lula afirmou que é o governo que precisa do Congresso, defendeu negociação com o Legislativo e sugeriu que vai testar sua base de apoio a "cada votação".
"Eles (parlamentares) serão testados em cada votação, cada votação você tem que conversar com todos os deputados, nenhum deputado é obrigado a votar naquilo que o governo quer, do jeito que o governo quer", disse o presidente.
Ainda de acordo com Lula, os congressistas podem "pensar diferente" do governo. (O deputado) Pode fazer uma emenda, querer mudar um artigo, e nós temos que entender que isso faz parte do jogo democrático. Não tenho que perguntar de que partido ele (parlamentar) é, tenho que tentar pedir para ele votar em nós."
A decisão de liberar verbas do orçamento secreto que ficaram represadas é uma tentativa de Lula de acalmar o Congresso e conseguir algum conforto nas votações, após as primeiras derrotas sofridas com o adiamento do Projeto de Lei das Fake News e a derrubada de decretos que alteravam o Marco Legal do Saneamento.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), havia cobrado pessoalmente Lula pelo pagamento das verbas "penduradas". Os R$ 9 bilhões remanescentes do orçamento secreto poderão ser pagos gradualmente. Durante a campanha eleitoral, Lula chegou a dizer que o mecanismo era "a excrescência da política brasileira" e o "maior esquema de corrupção da história".
AUTORIZADOS
Padilha disse que o pagamento das emendas prioriza obras em andamento, ações que reduzam filas de cirurgia e exames no Sistema Único de Saúde (SUS), além de projetos da área de educação. "São recursos autorizados pelo Supremo Tribunal Federal no final do ano passado e que o governo anterior estava dando um calote. Eram empenhos realizados que o governo tinha dado calote, paralisando obras", afirmou o ministro.
Sobre a transparência na distribuição dos recursos, Padilha disse que "a diferença é como da água para o vinho". "Você consegue dizer exatamente para quem foi liberado o recurso, com transparência." O ministro, no entanto, não deu detalhes de como teria se concretizado essa mudança. Disse apenas que os ministérios avaliaram os projetos prioritários para o governo, com foco nas áreas de saúde, infraestrutura e educação.
A atuação de Padilha na interlocução com os parlamentares vem sendo duramente atacada, e o presidente decidiu assumir as rédeas da coordenação política. O pagamento das emendas ocorreu na esteira desse movimento. Na mesma linha, o governo nomeou anteontem o ex-deputado bolsonarista Heitor Freire para um cargo na diretoria da Sudene. Indicação do União Brasil, partido da base governista, mas pouco fiel nas votações, ele se disse "arrependido" de ter se aliado ao ex-presidente.
INDIVIDUAIS
O governo também começou a liberar os recursos das emendas individuais previstas no Orçamento de 2023. Segundo Padilha, R$ 1,6 bilhão foi empenhado desde 26 de abril, quando os ministérios ficaram autorizados a distribuir os valores solicitados pelos parlamentares. Ele negou, porém, que a liberação das emendas foi acelerada para facilitar a negociação com o Congresso.
"O presidente tem um compromisso de diálogo e respeito com o Congresso, de que indicações feitas pelos parlamentares para projetos prioritários - educação, saúde, assistência social, obras - terão todo o apoio do presidente Lula e nós vamos continuar honrando esses investimentos", afirmou.
Padilha participou do ato solene "Heróis da Saúde", na Assembleia Legislativa paulista. Segundo ele, a comitiva da pasta vai dialogar com parlamentares de todos os partidos para dar andamento à votação do novo marco fiscal na próxima semana.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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