O ministro das Comunicações, Juscelino Filho, mantém seu piloto de avião particular e o gerente de seu haras, em Vitorino Freire (MA), como funcionários da Câmara com salários de R$ 10,2 mil e R$ 7,8 mil pagos com dinheiro público. Eles estavam nomeados no gabinete de Juscelino até o começo deste ano, quando o então deputado se licenciou do cargo para integrar o primeiro escalão do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
Ambos foram mantidos nos cargos pelo suplente e aliado do ministro, Dr. Benjamim de Oliveira (União Brasil-MA), que não tem haras nem avião. O político que substituiu Juscelino na Câmara ainda contratou Pedro Pereira Bringel Filho, tio do ministro. Ele entrou na vaga da mulher, a advogada Mara Bringel. Entre 2021 e 2022, Juscelino Filho empregou no gabinete a própria tia.
Em nota divulgada nesta segunda-feira, 27, o ministro defendeu as nomeações, que, segundo ele, foram feitas "em conformidade com as regras da Câmara". "Prestam suas atividades com zelo, profissionalismo e regularidade, no apoio à atividade parlamentar em Brasília e no Estado, seja presencialmente, seja em modelo híbrido ou remoto na pandemia", disse.
A Comissão de Ética Pública começa a analisar nesta terça-feira, 28, o comportamento do ministro em outro episódio envolvendo mau uso de dinheiro público. O Estadão revelou que ele solicitou voos da Força Aérea Brasileira (FAB) e diárias para ir a São Paulo e participar de leilões de cavalos de raça entre 26 e 31 de janeiro, alegando compromissos urgentes. Cobrado a se explicar por Lula, após a reportagem, o ministro devolveu parte da verba recebida e alegou erro do sistema. Pressionado pelo União Brasil, partido do ministro, Lula o manteve no cargo.
O Estadão revelou ainda que o ministro omitiu da Justiça Eleitoral ter R 2,2 milhões em cavalos de raça. Os animais ficam no haras Luanna, em Vitorino Freire, que, no papel, tem sua irmã como sócia ao lado de um ex-assessor demitido do Senado após reportagem do jornal mostrar que ele era funcionário fantasma. É esse haras que tem como gerente um funcionário lotado na Câmara.
Klennyo Ribeiro foi contratado por Juscelino em 2016 e mantido no cargo por seu suplente com salário de R$ 7.849,16. No mês passado, em conversa com o Estadão, Ribeiro admitiu trabalhar para o haras. "Acompanho as coisas lá (no haras)", disse. Procurado novamente ontem, mudou de versão e afirmou não ter vínculo com o empreendimento e não saber quem era o gerente. "Não mexo lá (no haras) mais, não."
Suplente de Juscelino, o deputado Dr. Benjamim admitiu que Ribeiro trabalha no haras, mas, "às vezes, em outro horário". Indagado por que ele manteve contratados o gerente do haras, o piloto e, ainda, empregou o tio do ministro, afirmou: "Porque eu quis. Contrato quem eu quiser para o meu gabinete". Dr. Benjamin manteve, em seu gabinete, 16 dos 28 funcionários que trabalhavam para Juscelino Filho.
Nas redes sociais, Benjamin chama Juscelino de amigo e diz que os dois vão trabalhar juntos pelo Maranhão. "Quero agradecer ao meu colega, médico, Juscelino Filho, que sempre me deu apoio e sempre confiou em mim, e por isso estou aqui hoje", escreveu o suplente. Ele já esteve ao menos três vezes no gabinete de Juscelino no ministério.
A relação de Ribeiro com o haras está documentada. É o número de telefone do assessor, por exemplo, que aparece à disposição do público para atender a demandas envolvendo a 18.ª vaquejada do haras. Nesse período, ele já estava lotado no gabinete de Juscelino.
O assessor é homem de confiança da família do ministro. Em 2008, foi candidato a vice-prefeito de Vitorino Freire na chapa encabeçada pela mãe de Juscelino. Eles saíram derrotados. Já como funcionário da Câmara, ele emprestou seu carro para Juscelino usar na campanha de 2018, conforme registro no TSE. Um irmão do Klennyo ganhou cargo na Prefeitura de Vitorino Freire. Ele foi secretário de Saúde do município durante a pandemia do novo coronavírus e hoje aparece como fiscal de contratos.
Jatinho
A Câmara já pagou mais de R$ 1,2 milhão ao gerente do haras e ao piloto do ministro, considerando salários, férias e gratificações de 2016 até fevereiro deste ano.
Leumas Rendder Campos Figueiredo, o piloto, foi contratado por Juscelino em novembro de 2018, após prestar serviço para ele na campanha daquele ano. Ele se recusou a detalhar seu trabalho no gabinete de Juscelino e, agora, do suplente do ministro. "Eu não devo satisfação da minha vida pra ninguém", disse, antes de desligar o telefone e não mais atender a reportagem.
Conforme revelou o Estadão, o ministro é dono de um jatinho Piper PA-34-220T Seneca V, que ele abastece com dinheiro público. Documentos mostram que o assessor pilota essa aeronave. O ministro tem uma pista de pouso em sua fazenda em Vitorino Freire (MA), mesma cidade onde está o haras. Ele mandou dinheiro do orçamento secreto para asfaltar o acesso à pista.
Cargo
O piloto está contratado como secretário parlamentar da Câmara. O cargo tem como atribuições básicas receber, entregar e redigir correspondências, fazer pesquisas, discursos e pareceres e outras atividades afins inerentes ao gabinete. No Instagram, porém, se define como "pilot" (piloto, em inglês) de avião e de helicóptero. O Estadão teve acesso a 49 fotografias publicadas em seu perfil, no qual ele compartilha seu dia a dia. Nos comentários, o chamam de "piloto mais estourado do Maranhão".
Em 3 de setembro de 2021, quando já era contratado por Juscelino, postou uma foto dentro de um avião: "E hoje amanheci o dia assim, trabalhando e com essa vista do escritório", afirmou. Outras postagens que mostram a atividade como piloto privado e nenhuma referência a função de assessor parlamentar. "Piloto voa mais que juízo de doido, já estamos na balsinha de açúcar. Simbora", escreveu em 2021. "Balsinha de açúcar" é o apelido da cidade de Balsas, no Maranhão.
Além do cargo na Câmara, o piloto é sócio-administrador de duas empresas com sede em São Luís. A Like Serviços Aéreos funciona como agência de viagens, locação de aeronaves sem tripulação e serviços de malote não realizados pelo Correio Nacional. Já o Centro de Instrução de Avião Ltda., controladO com outro sócio, faz comércio varejista de suvenires, bijuterias e artesanatos e cursos de pilotagem.
O manual de requisitos e impedimentos para a posse de funcionários de gabinetes da Câmara proíbe expressamente a nomeação de comissionados que sejam administradores ou gerentes de empresas.
O ministro também contratou no seu gabinete sua tia. Mara Bringel foi lotada de 2020 a 2021. Assim que ele virou ministro, ela é substituída pelo marido, Pedro Bringel, irmão da mãe do ministro. A reportagem não o localizou. A advogada Mara Bringel não respondeu aos contatos.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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