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Novo ministro foi 'dúbio no discurso', diz representante de delegados

ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A troca de guarda no Ministério da Justiça "gera incerteza" para o futuro da Lava Jato, diz o presidente da ANDP (Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal), Carlos Eduardo Sobral. O novo

Da Redação

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Escrito por Da Redação
Publicado em 01.06.2017, 01:45:10 Editado em 01.06.2017, 21:05:35
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ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A troca de guarda no Ministério da Justiça "gera incerteza" para o futuro da Lava Jato, diz o presidente da ANDP (Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal), Carlos Eduardo Sobral.

O novo titular da pasta, Torquato Jardim, ainda é uma incógnita e, em sua estreia, foi no mínimo "dúbio no discurso", sem dar pistas se quer ou não a permanência do chefe da PF.

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Em áudio, o senador agora afastado Aécio Neves (PSDB-MG) disse ao empresário Joesley Batista que era preciso "tirar esse cara", esse cara sendo Leandro Daiello, há seis anos, três presidentes e seis ministros à frente da instituição.

"Equívocos" na Operação Carne Fraca podem ter sido usados como pretexto para tentar derrubar Daiello, reconhece Sobral.

O "cerne da questão", contudo, não deveria ser a dança das cadeiras em Brasília, ele afirma à reportagem, por telefone. A PF precisa se desvincular do Ministério da Justiça para ser uma instituição "de Estado, não de governo".

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O delegado, que já coordenou operações de combate a fraudes bancárias e pornografia infantil, esteve no Instituto de Direito Público (IDP) de São Paulo, do qual Gilmar Mendes é sócio, nesta segunda-feira (29). Ele diz manter apenas uma "relação acadêmica" com o ministro do Supremo Tribunal Federal.

O novo ministro da Justiça, Torquato Jardim, disse nesta quarta (31) que uma troca no comando da PF não equivaleria a um freio à Lava Jato. Há motivos para desconfiar?

Carlos Eduardo Sobral - Na verdade, todo cenário político no qual se promove a troca do ministro já gera incerteza. Mas o cerne da questão é a falta de autonomia da PF e a falta de um mandato para nosso diretor-geral. Se tivéssemos autonomia financeira e institucional, e que fosse prevista na Constituição, a substituição do ministro não traria toda essa insegurança para a continuidade das ações. O que temos que evoluir no Brasil é no sentido de colocar na Constituição que a instituição é de Estado, não de governo, para que a PF não fique na dependência da vontade de um ou outro governo. Temos a PEC [Proposta de Emenda à Constituição] 412 na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara que estabelece essa autonomia.

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Essa independência é praxe em polícias federais de outros países? O presidente dos EUA, Donald Trump, demitiu o diretor do FBI...

Sobral - Mas o FBI tem mandato [de dez anos] e autonomia orçamentária. Toda instituição que tem como finalidade combater uma corrupção que pode ter relação com poder é dotada de autonomia. Em todo o mundo é assim. Defendemos mandato de três anos, com possibilidade de recondução por igual período. E três anos para não ser coincidir com o mandato do governo [federal].

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A indicação continuaria nas mãos do presidente?

Sobral - Pelo presidente da República com sabatina pelo Senado [como é hoje].

Vê vontade política para votar a PEC que dá autonomia à PF?

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Sobral - O fortalecimento das instituições nem sempre é tranquilo. É preciso um movimento da sociedade, da imprensa, de convencimento do Parlamento. Estamos vendo várias delas se fortalecendo: Ministério Público, Controladoria... Está ficando evidente que a PF precisa e merece tratamento diferenciado.

As regras atuais, como a necessidade de comunicar o ministro da Justiça sobre operações policiais, atrapalha?

Sobral - Hoje o entendimento é de que temos que comunicar a deflagração das operações em função da posição hierárquica. Outra relação [de dependência] é a nomeação dos cargos de gestão pelo ministro da Justiça ou pela Casa Civil. É uma forma de vinculação com o governo. Também não conseguimos propor orçamento -quem o faz é a Justiça, depois [a proposta] vai Planejamento, que pode contingenciar o valor, o que tem acontecido nos últimos anos. Semanas atrás, a informação é de que cortariam 44%. Veio a público redução de 29%, o que é muito grande. Dizem que todas [as pastas] teriam que dar seu sacrifício [por causa da crise econômica]. Neste momento histórico, essas instituições que combatem a corrupção nessa profundidade não podem ter corte. E não há a realização de concurso público, então a gente não consegue compor o efetivo. Do jeito que está, em três, quatro anos voltaremos ao efetivo de 20 anos atrás. Hoje somos 1.650 delegados em atividade e 600 cargos vagos que não conseguimos preencher, pois não temos autorização do Planejamento.

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O que o sr. acha do ministro Torquato Jardim?

Sobral - Nós não o conhecemos, ele não é da área de segurança pública, não tem contato mais aproximado.

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Mas causou uma boa primeira impressão?

Sobral - Foi evasivo. Sentimos, num primeiro momento, falta de compromisso com a autonomia da PF. Vi que ele ressalta que apoiara o fortalecimento da instituição, mas entendemos que foi dúbio no discurso. Não confirmou se vai manter ou não [o diretor-geral da PF, Leandro Daiello].

Como o ex-ministro Osmar Serraglio era visto dentro da instituição?

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Sobral - Ficou só dois meses. Não tivemos reunião de trabalho com ele, já entrou no meio da crise.

Em áudio, Aécio Neves e Joesley Batista dizem, sobre o chefe da PF, que era preciso 'tirar esse cara. Já sentiu ingerência política na instituição?

Sobral - Há várias formas de interferir no trabalho da PF. Cortando recursos, direcionando indicações com viés politico... Hoje há uma cultura interna para não permitir nomeações de caráter político nos cargos da instituição. Mas há casos mais públicos, como a nomeação de um determinado delegado que foi vetado por ter operado em ações que atingiram membros do poder. Prefiro não citar o nome de colegas. [Em 2014, a Casa Civil de Dilma Rousseff vetou o delegado Sérgio Barbosa Menezes para a direção de logística, que administra finanças da PF.]

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Aécio disse a Joesley que o governo deveria usar a Operação Carne Fraca, criticada por hiperbolizar um esquema no setor de carnes brasileira, como desculpa para trocar o chefe da PF. A Carne Fraca queimou o filme da PF?

Sobral - Foi uma operação que, em razão da divulgação, acabou tendo uma dimensão reconhecida como um equívoco da PF -não estou dizendo que foi...

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Não foi?

Sobral - Temos como politica, até em respeito à liberdade de imprensa e informação, comunicar as nossas operações. Nesse caso, como envolvia mercado extremamento sensível de âmbito internacional, a divulgação acabou gerando repercussão -e acabou sendo compreendida como erro de divulgação. Poderia ter sido trabalhada de outra forma. Com esse dialogo [de Aécio e Joesley], entendemos que a PF tem errado pouco, e esse equívoco teria gerado oportunidade para a troca do diretor.

Fora a crise econômica, cujas sequelas no orçamento são óbvias, como a crise política pode afetar a PF?

Sobral - Projetos que precisam de decisões do mais alto nível ficam paralisados, já que assuntos da crise tomam toda a agenda. Algumas ações dependem do Ministério da Justiça, como concurso público ou a fixação de policiais nas fronteiras, e elas não avançam.

O diretor-geral Leandro Daiello já passou por três presidentes [Lula, Dilma e Michel Temer] e seis ministros diferentes. Ao que atribui sua resiliência?

Sobral - Trabalho da PF vem sendo realizado de forma técnica, vem trazendo reconhecimento da sociedade. A permanência do diretor-geral foi objeto de clamor social. A ação que nos tornou mais popular foi a Lava Jato. É natural que a sociedade tenha desenvolvido carinho ainda maior [por nós]. Já éramos das mais respeitadas instituições do Brasil. Agora a sociedade passou a dar publicidade a esse orgulho pela PF.

Atribui-se à PF vazamentos de peças de investigação. O próprio ministro Gilmar Mendes acusou a Procuradoria-Geral da República e a PF por eles.

Sobral - Nossa posição é muito certa sobre vazamentos: é crime e tem que ser apurado, com o responsável punido.

Alguém já foi?

Sobral - Quando há vazamento, são instaurado inquéritos. Não saberia dizer se algum chegou a resultado de concluir pela responsabilidade da PF.

O IDP [Instituto de Direito Público], do qual o ministro Gilmar Mendes é sócio, anunciou Temer em seminário patrocinado pelo governo. O sr. já participou de mais de um evento no instituto. Qual é a sua relação com o ministro? Como evitar o conflito de interesses?

Sobral - Não tenho relação pessoal com o ministro. Tive no IDP de Brasília uma única vez, num seminário internacional, e no IDP de São Paulo para ministrar uma aula sobre a importância do uso da tecnologia nas investigações criminais. Dou aula sobre o tema há dez anos. Minha relação é acadêmica. Conversei com Gilmar uma única vez, no IDP de Brasília. Vi que este seminário [com Temer] é grande, inclusive terá Daiello [na programação]. E também é de caráter acadêmico.

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