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Imoral não é negociar com corruptos; é não desvendar crimes

FERNANDA MENA SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A crise no Brasil começará a ser resolvida quando a classe política que fracassou der lugar a uma nova geração de líderes interessados no bem comum dos brasileiros e não em seus interesses pessoais. A avaliação

Da Redação

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Escrito por Da Redação
Publicado em 28.05.2017, 07:30:10 Editado em 28.05.2017, 22:15:21
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FERNANDA MENA

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A crise no Brasil começará a ser resolvida quando a classe política que fracassou der lugar a uma nova geração de líderes interessados no bem comum dos brasileiros e não em seus interesses pessoais.

A avaliação é de José Ugaz, presidente da Transparência Internacional, organização de combate à corrupção. Segundo ele, a Operação Lava Jato é uma oportunidade para a revisão do sistema político e do modo como o setor privado brasileiro faz negócios.

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Ugaz, procurador peruano que investigou o ex-ditador Alberto Fujimori, vem ao Brasil a convite da ministra Cármen Lúcia para assinar acordo entre a ONG e o CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

Reportagem - Como avalia as mais recentes revelações no país?

José Ugaz - Há um misto de surpresa e confirmação. De alguma maneira, esperávamos que isso ocorresse porque havia suspeitas sobre Michel Temer e evidências que o vinculavam a casos de corrupção. Era questão de tempo. O que ocorreu simplesmente adiciona gravidade a um tema de urgência no país.

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O que a ampliação do espectro político dos envolvidos aponta?

Alguns setores haviam dito que a Lava Jato era uma perseguição à esquerda. Outros, que era uma crise da direita empresarial. Mas o que ocorreu confirma: corrupção não tem ideologia. Ela é transversal na política. E todos, de alguma maneira, tentam desmerecer a Lava Jato.

O acordo de delação feito com o dono da JBS foi criticado por ter sido brando. Qual é o limite nas negociações?

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No Peru, usamos muito [o conceito de delação premiada] no caso de Fujimori [ex-ditador preso desde 2005] e Montesinos [braço direito de Fujimori]. Setores conservadores defendiam ser imoral negociar com os corruptos. Eu sempre sustentei que imoral era não chegar aos crimes, não repatriar o dinheiro e manter a impunidade.

A empresa se propôs a pagar 0,5% de seu faturamento em acordo de leniência, ou R$ 1 bilhão. A Procuradoria pede R$ 11,2 bilhões, ou 5,8% do faturamento. Não é pouco?

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Qualquer acordo tem que estar centrado no princípio de proporcionalidade ao dano causado e ao dinheiro desviado. Na nossa perspectiva, todo o dinheiro que foi matéria de corrupção deve ser devolvido.

Como a delação pode ser feita sem passar a impressão de impunidade? É preciso equilíbrio. Soa mal que este senhor [Joesley Batista] tenha uma vida de luxo em NY, com apartamento, avião e iate. Mas, do outro lado, é preciso avaliar o que sua delação permitiu em termos de avanço justamente no combate à impunidade.

Houve a revelação de áudios privados. Vale tudo no combate à corrupção?

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Não vale tudo no combate a qualquer crime. O respeito ao processo legal é fundamental porque dá legitimidade à investigação. Pode ter havido excessos ou erros na divulgação ou retenção de áudios, e uma função instrumental para quem os tornou públicos. Mas isso não parece contaminar a essência da Lava Jato.

Quais condições favorecem negociatas ilegais entre as elites política e econômica?

A corrupção na América Latina é um problema estrutural, sistêmico e histórico. Diria que tem a ver com o padrão colonial imposto por Portugal e Espanha, que favorecia o clientelismo, gerando o que chamam de neopatrimonialismo ou autoritarismo burocrático. Isso promoveu instituições fracas, em que classes dirigentes tomam o poder para benefício próprio, e não do bem comum. Por isso a América Latina é o continente mais desigual do mundo.

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Quais medidas podem reduzir os incentivos à corrupção? É preciso simplificar as regras de atuação, aumentar a transparência e fortalecer a educação em valores. Em alguns casos, é preciso aumentar as penas para corruptores e romper a impunidade. No fundo, trata-se de aumentar o coeficiente democrático do país, que hoje é uma democracia formal, mas não real.

Como assegurar a sustentabilidade de um processo anticorrupção?

Na América Latina, abre-se uma grande oportunidade para reconstruirmos as estruturas mínimas de relação com o poder. Empresários acreditavam que era mais rentável pagar subornos que trabalhar com integridade. Hoje está claro que os custos são imensos e que é grave o comprometimento da reputação e o risco à existência das empresas. Este setor tem que fazer uma reflexão profunda. Além disso, precisamos revisar nossas estruturas políticas: como estão organizados os partidos e como se financiam.

Existe a impressão de que a repatriação é modesta diante dos valores confessados.

Existem tramas muito sofisticadas para retirar recursos de um país por meio de offshores. Um processo de repatriação de dinheiro implica desmontar todas elas, o que não é fácil, e distinguir o dinheiro legal do ilegal.

Como a corrupção afeta o desenvolvimento de um país?

Em um discurso histórico de 1996, o então presidente do Banco Mundial, James Wolfensohn, disse que a corrupção era um câncer que aprofundava a pobreza e impedia o desenvolvimento. Suas implicações não são apenas morais, elas desviam recursos que deveriam ser usadas para resolver problemas fundamentais dos cidadãos.

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