AMANDA NOGUEIRA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Da última vez que estivemos aqui, vocês nos fizeram chorar, disse a cantora e tecladista Lisa-Kaindé Díaz no começo da apresentação do Ibeyi no Cine Joia, em São Paulo, nesta quarta-feira (31).
Com sua outra metade, a percussionista Naomi Díaz, o duo franco-cubano fez um show potente com o repertório do álbum Ash, lançado em setembro de 2017.
Em turnê sul-americana, elas também levam as novas faixas para o Circo Voador, no Rio de Janeiro, na noite desta quinta (1º), depois de um show de abertura da cantora paulista Tulipa Ruiz.
Se tudo correr como em São Paulo, o público verá as irmãs de características complementares uma é afeita ao jazz e a outra, chegada ao hip-hop desencadeando uma profusão sonora que carrega o cajón tradicional da cultura afro-cubana, elementos de estilos como jazz, pop e hip-hop e corais mântricos.
A mistura arquitetada pelas filhas do percussionista cubano Anga Díaz, que integrou o coletivo Buena Vista Social Club, funcionou de forma harmoniosa. E ainda contou com participação do rapper Emicida.
O início com I Wanna Be Like You serviu como uma espécie de cartão de visitas a quem assistia pela primeira vez às garotas, que também apresentaram no Brasil o álbum de estreia, autointitulado, em 2016.
Trata-se de uma composição de Lisa que se transformou em uma homenagem à irmã. Queria saber fazer twerk como Naomi, brinca a cantora ao introduzir a canção.
Em uma entrevista por e-mail à reportagem, elas explicam que Ash foi um álbum concebido durante turnês, sobre o que têm visto ao redor nos últimos dois anos
Já o debute trazia lembranças do pai e da irmã mais velha, Yanira, morta após um AVC. Foi uma maneira de dizer a eles que os celebraremos enquanto estivermos vivas, afirmam. Não ficamos nostálgicas porque sempre sentimos a presença das pessoas amadas que já se foram, completam, sem especificar a autoria das respostas.
Um dos pontos altos da apresentação é quando cantam Deathless, cuja letra autobiográfica lembra quando Lisa foi presa injustamente por um policial francês quando tinha 15 anos.
Sua maneira de combater o racismo e o sexismo, dizem, é cantando sobre isso, conscientizando, falando sobre isso e tornando uma má experiência em uma música.
Ao fim da canção, público fazia barulho marchando com os pés e cantando o refrão regido pelas garotas Díaz.
Os coros também acompanharam faixas como Mama Says, River e Oya, do primeiro álbum, e até mesmo trechos cantados em iorubá, língua nigero-congolesa falada por povos que migraram para Cuba e também para o Brasil, especialmente para a Bahia, onde foram denominados de nagôs.
A produção mais minimalista do que a de outros shows não diminuiu o impacto de No Man is Big Enough for My Arms, que já foi apresentada com projeções de Michelle Obama ao fundo.
A faixa ganhou contornos militantes ao incluir uma frase da ex-primeira-dama (A medida de qualquer sociedade é como ela trata suas mulheres e meninas) ao retrucar comentários misóginos do presidente americano Donald Trump (agarre-as pelas xoxotas). É importante que as mulheres se sintam livres para falar e parar de se sentir envergonhadas por sofrerem abusos, dizem, ao serem questionadas sobre o movimento #MeToo, contra casos de assédio sexual.
Em mais um de seus contrastes, as canções de Ibeyi transmitem otimismo e resiliência, mesmo quando tratam de temas áridos e políticos. Em Transmission, por exemplo, Lisa vai ao teclado e Naomi assume os vocais para entoar: Nós cantamos e nossas lágrimas secam. Sentimos absolutamente a necessidade de ter esperanças e de dar esperança, caso contrário é melhor ficar em nossas camas e não fazer nada, dizem.
Para elas, há algo de comum entre todos, de leste a oeste, do Sul ao Norte: a necessidade de alegria, esperança, pertencimento, amor. É o que buscamos em nossos shows, sentir a união e a força de cantar juntos e pertencer a algo.
Sem músicos de apoio no palco, Ibeyi soa inevitavelmente diferente no show do que no álbum, que conta, por exemplo, com participações do saxofonista americano Kamasi Washington e da cantora espanhola Mala Rodriguez. Mas não entrega uma experiência menor.
Escoladas no canto e nos respectivos instrumentos, Lisa e Naomi encontraram em Ibeyi irmãos gêmeos, em iorubá um escape do cotidiano em conservatórios. Não sabemos se artistas podem mudar o mundo, mas eles mudaram nossas vidas, nos deram força para seguir em frente, dizem. Arte é um grande espelho da humanidade. Esperamos poder inspirar outros a fazerem seus próprios sonhos se tornarem realidade, completam.
IBEYI
QUANDO qui. (1º), às 22h
ONDE Circo Voador, r. dos Arcos, s/n, Rio de Janeiro, tel. (21) 2533-0354
QUANTO de R$ 80 a R$ 160 em ingressorapido.com.br
CLASSIFICAÇÃO 18 anos
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