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Vizinhos de parque em SP relembram medo do fogo e desespero dos animais

MARINA ESTARQUE SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Durante a missa deste último domingo (17), a fuligem caía lenta e insistente do céu. Entrava pelas frestas do telhado, forrava os bancos da igreja, maculava a hóstia e cobria a estátua da padroeira, Nossa Senho

Da Redação

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Escrito por Da Redação
Publicado em 20.09.2017, 13:55:10 Editado em 20.09.2017, 13:55:10
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MARINA ESTARQUE

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Durante a missa deste último domingo (17), a fuligem caía lenta e insistente do céu. Entrava pelas frestas do telhado, forrava os bancos da igreja, maculava a hóstia e cobria a estátua da padroeira, Nossa Senhora da Esperança. Apesar do incêndio que castigava o parque estadual e parte do Complexo Hospitalar do Juquery, em Franco da Rocha, a missa não foi cancelada.

Naquele domingo, o fogo tinha cruzado montanhas e chegado bem perto da igreja do bairro Jardim Esperança, em Caieiras, vizinha a Franco da Rocha, na Grande SP. "A gente viu aquela cortina de fumaça vindo do morro. Precisamos cobrir as Bíblias e os cálices para proteger tudo", conta o secretário da igreja, Alison Pereira, 25.

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Nesta terça-feira (19), as cinzas ainda sujavam os móveis e objetos da paróquia, mesmo após as limpezas diárias. "O fogo acabou ontem, mas ainda tem fumaça, e a fuligem continua caindo", diz.

A reportagem visitou bairros de Caieiras e Franco da Rocha vizinhos ao parque consumido pelas chamas na última semana. Encontrou um cenário com as marcas do incêndio e ouviu relatos de medo daqueles que, da janela de suas casas, ouviam os gritos dos animais e viam as labaredas se aproximarem cada vez mais de suas residências.

Muitos sofreram com a fumaça, aulas foram interrompidas e famílias fizeram mutirão com balde e mangueiras para conter o fogo. Em Caieiras, uma escola estadual foi afetada. Na última quinta-feira (14), professores precisaram liberar os cerca de 140 alunos do turno da tarde porque a fumaça tinha invadido as salas de aula.

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"Telefonamos para os pais virem buscar, e levamos os alunos para o pátio, onde fizemos algumas atividades", conta a diretora, Deise Ramos. A professora de inglês Maria José, 40, precisou cancelar a prova. "Fiquei com a garganta inchada, era muita fumaça, muito aluno tossindo."

O número de focos de queimada no Estado de SP mais do que quadruplicou neste mês em relação a setembro de 2016 –foram 2.242 até agora, contra 487 no ano passado. É a maior marca do mês desde o início da série histórica, em 1998, segundo os satélites do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).

No acumulado até setembro, a quantidade de queimadas também aumentou. Houve 4.572 neste ano, ante 2.933 em 2016 (56% a mais).

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CINZAS NA CAMA

A queimada virou o assunto da semana em Caieiras, Franco da Rocha e cidades próximas ao parque. Vizinha da escola afetada, a dona de casa Genilda da Silva, 40, viu da janela de seu quarto as labaredas chegarem cada vez mais perto, durante seis dias. O fogo consumiu boa parte da mata diante do seu apartamento, em um conjunto habitacional na região.

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"Deu medo. A gente escutava o barulho dos animais, os macacos gritando. Primeiro veio uma nuvem de fumaça e depois o fogo. Até ontem ainda estava queimando", diz.

Os móveis, o chão e até a roupa de cama ficaram cheios de fuligem. "Tirávamos os lençóis antes de dormir e batíamos na janela, para tirar aquele pó", afirma a dona de casa, que passa a mão no chão e mostra os dedos pretos de carvão. "Já limpei várias vezes e continua sujo. A roupa do varal tive que lavar toda, ficou igual churrasco."

Para dormir com as crianças, Genilda colocava uma bacia de água e toalhas molhadas no quarto. "Fechamos todas as janelas com panos molhados, foi terrível." A filha Gabriely, 7, é alérgica e acabou doente. "Tossi muito e vomitei", diz a menina.

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Relatos de moradores que precisaram ir ao médico por crises respiratórias após o incêndio são comuns na região. A funcionária pública Aline Berno, 32, e o filho de oito anos passaram mal. "Temos rinite. Eu fiquei com falta de ar. Fechamos tudo pela fumaça e ficamos em casa sufocando de calor. Prejudicou a vida de todo mundo aqui."

BALDE E MANGUEIRA

Em Franco da Rocha, moradores precisaram combater um incêndio com balde e mangueira até a chegada dos bombeiros. A técnica em enfermagem Angela de Sá, 33, e o filho Luis Henrique, 12, estavam em casa quando ouviram o crepitar do fogo no terreno em frente. Conseguiram conter as labaredas com baldes de água, mas logo o fogo voltou e se alastrou. "Mãe, corre!", gritou o menino.

Angela ligou para os bombeiros e pediu ajuda para dois vizinhos, que acudiram com mangueiras. Mãe e filho pegaram máscaras e óculos de proteção nas ferramentas do pai, um metalúrgico, e trabalharam quatro horas na contenção do fogo. No terreno diante da casa, então em chamas, a família havia criado um espaço de lazer para crianças do bairro.

"Quando a gente chegou aqui não tinha nada, era só um mato alto cheio de aranha e escorpião. Meu marido carpiu, fez banquinhos de madeira, uma cesta de basquete e as traves do gol para as crianças jogarem". A família construiu também um deque de madeira, apoiado nas árvores, e plantou uma horta. "Fiquei desesperada, fizemos o jardim e brinquedos com tanto cuidado", lembra Angela.

Os objetos de madeira foram salvos, mas Angela viu a sua laranjeira, jabuticabeira e pitangueira serem consumidas pelo incêndio. "Que dó", diz ela, apontando para as árvores todas secas.

Boa parte do cemitério do Complexo Hospitalar de Juquery também não escapou do fogo. O complexo abriga o hospital psiquiátrico, inaugurado em 1898 como colônia agrícola, e tem edifícios tombados pelo patrimônio histórico e uma área verde, com um cemitério, hoje desativado.

Nesta terça-feira, o cenário era desolador: lápides e cruzes, antes brancas, estavam chamuscadas e cobertas por galhos retorcidos. Entre os túmulos, uma camada grossa de cinzas. Ao fundo, uma imensidão de árvores queimadas.

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