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'O pesadelo que estamos vivendo está bem documentado', diz historiador

FERNANDA MENA, ENVIADA ESPECIAL PARATY, RJ (FOLHAPRESS) - Nenhum assento para o público pagante da Flip (Festa Literária Internacional de Paraty) na Igreja Matriz ficou vazio na segunda mesa deste sábado (29). O encontro foi entre a romancista cearense An

Da Redação

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Escrito por Da Redação
Publicado em 29.07.2017, 16:15:08 Editado em 29.07.2017, 16:15:08
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FERNANDA MENA, ENVIADA ESPECIAL

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PARATY, RJ (FOLHAPRESS) - Nenhum assento para o público pagante da Flip (Festa Literária Internacional de Paraty) na Igreja Matriz ficou vazio na segunda mesa deste sábado (29). O encontro foi entre a romancista cearense Ana Miranda, cujas obras dialogam com fatos e personagens da nossa história, e o historiador João José Reis, referência mundial em escravidão, que acaba de receber da Academia Brasileira de Letras o Prêmio Machado de Assis, em geral concedido a romancistas.

O debate, conduzido pela historiadora e biógrafa de Lima Barreto, Lilia Moritz Schwarcz, tratou do território fluído entre ficção e não ficção no tratamento da escravatura brasileira e da vida de escravos e negros alforriados do país.

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"Costumo dizer que os romancistas são historiadores que fingem estar mentindo e os historiadores são ficcionistas que fingem estar dizendo a verdade", brincou Miranda, que leu trecho do recém-lançado "Xica da Silva - Cinderela Negra" (Editora Record).

A obra traz fatos históricos precisos e outros romanceados, identificados pelo texto em itálico. Já Reis, célebre por sua vasta e reveladora pesquisa em documentos de época, explicou como lida com as lacunas que os registros deixam.

"Nós, historiadores, temos de ter imaginação e trabalhar com probabilidades e verossimilhanças para preencher os buracos que a documentação nos deixa. É um ofício 80% documentação e 20% imaginação", disse Reis, autor de "Rebelião Escrava no Brasil: a História do Levante dos Malês (1835)", obra de 650 páginas que desconstruiu o mito de passividade dos escravos africanos no país.

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Ela e Reis falaram sobre os personagens sobre as quais se debruçaram, célebres e anônimos. Miranda disse que as mulheres sobre as quais escreveu de alguma maneira espelham a ela própria, e Reis explicou que, apesar de ter escrito sobre três ex-escravos que ascenderam socialmente após conquistarem a liberdade, esses eram minoria absoluta.

"A imensa maioria dos 5 milhões de escravos que chegaram ao Brasil, morreram escravos. Há que fazer reparação no país mesmo que não tivéssemos tido a escravidão. Basta para isso a desigualdade", disse, antes de ser muito aplaudido.

Reis rememorou o discurso que fez na ABL na cerimônia do prêmio recém-recebido no qual destacou a importância e que chamou de sucesso das cotas raciais nas universidades brasileiras, criticou o fato de a obrigatoriedade de estudos sobre África ter sido retirada dos planos de educação pelo governo atual e sobre a escravidão contemporânea.

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"A nova lei trabalhista permite certas práticas que podem conduzir a uma espécie de escravidão consentida", disse. "Isso porque o contrato negociado entre trabalhador e empresário pode valer sobre aquilo que está legislado. Essa reforma foi pactuada, não com a classe trabalhadora, mas com os empresários", concluiu, antes de se ouvir ecoarem pela primeira vez dentro a Igreja Matriz os gritos de "Fora, Temer".

Ao final, os autores falaram sobre o momento atual do país. "Parece que vivemos uma ficção. Um romance gótico, de terror", disse Miranda.

"Estamos atravessando uma realidade muito dura. Quilombolas assassinados, massacres sistemáticos de índios. Poderes locais estão se achando com licença de fazer essas coisas. Não é ficção. Esqueça a ficção. O pesadelo que estamos vivendo está muito bem documentado", completou o historiador.

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