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Gestão Doria citou médicos sem aviso em pedido de internações à força

FERNANDA PERRIN, NATÁLIA PORTINARI E LEANDRO MACHADO SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O pedido de internação forçada de usuários de drogas feito à Justiça pelo prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), usou como justificativa a opinião de três especialistas d

Da Redação

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Escrito por Da Redação
Publicado em 25.05.2017, 19:50:07 Editado em 25.05.2017, 19:50:10
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FERNANDA PERRIN, NATÁLIA PORTINARI E LEANDRO MACHADO

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O pedido de internação forçada de usuários de drogas feito à Justiça pelo prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), usou como justificativa a opinião de três especialistas dadas em duas reportagens, uma de 2011 e outra de 2013.

A ação cita três frases, identificando as reportagens das quais foram retiradas, como exemplos de especialistas favoráveis à internação compulsória.

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Nenhum dos especialistas citados no pedido de Doria foi consultado pela prefeitura para avaliar a aplicação da medida no caso de usuários da cracolândia, apesar de serem usados como exemplos de pessoas favoráveis à medida.

Neste domingo (21), a cracolândia passou por uma operação policial que prendeu traficantes e dispersou usuários de drogas das ruas Dino Bueno e Helvétia, no centro da cidade. Dependentes de drogas formaram uma nova cracolândia, na praça Princesa Isabel, a cerca de 400 metros da antiga área.

Na noite de terça (23), a prefeitura pediu autorização para internar dependentes de drogas à força, desde que aprovado por equipe municipal de médicos e psicólogos. Hoje, para internar uma pessoa compulsoriamente, é necessário aval do Ministério Público e da Justiça — isso depois de uma avaliação médica. Os casos devem ser analisados individualmente.

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Questionada, a prefeitura diz não ter usado apenas frases, uma vez que também anexou as reportagens completas ao pedido. "O texto buscou dar um contexto ao juiz, buscando para isso dar também um histórico do problema que assola a cidade há 20 anos", informou, por meio da assessoria de imprensa.

A ação civil pública cita o psiquiatra Arthur Guerra, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e coordenador do Programa do Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, professor da Unifesp e diretor do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Políticas Públicas do Álcool e outras Drogas, além do médico e escritor Drauzio Varella.

"Eu não defendo internação compulsória como política pública, isso é um absurdo completo. Eu nunca disse que acho que se resolve a cracolândia com internação compulsória", disse Varella à reportagem.

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Para ele, esse tipo de tratamento só pode ser prescrito por médicos, a partir do estabelecimento de critérios que confirmem a incapacidade da pessoa tomar decisões por conta própria.

No documento protocolado pela prefeitura, a frase de Varella foi retirada de uma entrevista dada à revista "Época" em 2011, em que o médico diz apoiar a internação compulsória como um recurso extremo. "Mas, pelo menos, eles têm uma chance" foi o trecho destacado no pedido.

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Guerra, da USP, também negou ter sido consultado. "Se eu dei essa entrevista [em 2013], eu nem lembro", afirmou o psiquiatra. "Se eu estivesse viajando. Mas todo mundo consegue falar comigo, então pergunta minha opinião. Não precisa pegar lá de 2013", afirmou.

Ele disse estranhar essa prática vindo do prefeito João Doria. "Isso não é padrão do prefeito". Para Guerra, a internação compulsória só deve ser usada em "situações raríssimas". Na ação civil pública, o município diz ter 270 vagas disponíveis para esse tipo de tratamento.

O psiquiatra defende a manutenção do sistema atual, em que um médico avalia o paciente e recomenda a internação, um segundo médico, que recebe essa paciente para internação, faz outra avaliação e, se confirmada a medida, um médico do Ministério Público é avisado para analisar o caso, explica Guerra. Depois, ainda é necessário uma autorização judicial.

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"Eu não entendo, francamente, por que a prefeitura ou o governo têm que pedir autorização se esse é o procedimento médico. Pede autorização para o Ministério Público, isso já funciona assim e nunca teve problema dessa forma", disse.

Laranjeira, da Unifesp, confirmou que não foi procurado pela prefeitura, mas não deu entrevista por estar em viagem.

BUSCA E APREENSÃO

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No pedido, a prefeitura solicita autorização para "busca e apreensão das pessoas em estado de drogadição que estavam vagando pela cidade". A ideia da gestão Doria é ter autorização para levar dependentes à força para avaliação médica.

Segundo a lei antimanicomial de 2001, porém, a internação só pode ser pedida judicialmente após a autorização do especialista médico, e o pedido deve ser feito através do Ministério Público, não pelo Poder Executivo.

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O secretário da Saúde, Wilson Pollara, afirmou que muitos dos usuários se recusam a conversar com agentes de saúde. Para ele, a medida facilitaria a "conversa".

"Não existe previsão legal para busca e apreensão de dependentes químicos", afirma o defensor público estadual Rafael Lessa. "Foi inventado nessa petição. A lei prevê o tratamento ambulatorial e a possibilidade de internação em caso de surtos, em momentos de crise. É uma internação rápida, sempre depois da avaliação do médico."

Sérgio Salomão Shecaira, professor de direito penal da USP, também afirma que "busca e apreensão é de coisas, não de pessoas".

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Além disso, o fato de o pedido de internação ter sido feito de forma genérica (todas as pessoas em estado de "drogadição") também não segue a lei de internação compulsória de 2001, segundo especialistas.

"O pedido de internação deve ser de uma pessoa específica, depois de haver uma avaliação médica", diz Shecaira. "Senão, qual o critério? Quem tiver uma aparência de drogado? O pedido tem uma atitude extremista."

O Ministério Público criticou a proposta de Doria, dizendo que a prefeitura quer promover uma "caçada humana" na cracolândia.

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SALDO DO REDENÇÃO

O programa: É estruturado em seis eixos de trabalho (saúde, social, urbanístico, segurança, zeladoria e governo/Justiça) e estabelece 32 ações.

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Objetivos: Redução da vulnerabilidade e resgate da autonomia dos usuários, além da revitalização da região da Luz e de outras áreas de uso de drogas.

Críticas: O Ministério Público e o Cremesp, que discutiam o projeto com a prefeitura, dizem que administração não seguiu o plano acordado.

ITENS DESCUMPRIDOS

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Saúde

- Instalar unidades móveis de saúde

- Criar um Caps (Centro de Atenção Psicossocial) móvel

- Ampliar atendimento do Caps da Sé para a noite

- Criar carreta oftalmológica para avaliação da população

Social

- Cadastrar usuários

- Criar planos de ação personalizados para cada usuário

- Transferir pessoas da região para moradia adequada

- Realizar mutirões de beleza, odontologia etc.

Justiça

- Realizar desapropriações (moradores e comerciantes foram removidos sem aviso)

- Articular ações com a sociedade civil

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