Quem vê a seleção espanhola em campo durante a Copa do Mundo feminina não imagina que o clima no vestiário é tenso e dividido. Apesar das goleadas aplicadas ao longo da fase de grupos, de vitórias convincentes no mata-mata e de um bom futebol apresentado no torneio, há uma enorme rusga entre jogadoras, comissão técnica e a própria federação de futebol.
O fim da partida contra a Holanda nas quartas de final do Mundial, um jogo disputado e vencido na prorrogação, deixou isso evidente. As atletas espanholas comemoravam entre si a classificação histórica, mas não cumprimentavam a comissão técnica, distanciando-se especialmente do treinador Jorge Vilda. Era como se elas quisessem passar uma mensagem: ganhamos apesar dele, não com ele.
A campanha da Espanha é histórica. É a primeira vez que a seleção chega nessa fase da competição e disfarça bem o mal-estar do elenco. Mas a verdade é que o clima dentro da equipe já não vem bem há algum tempo. A insatisfação espanhola veio à público em setembro do ano passado quando veículos esportivos divulgaram que 15 jogadoras espanholas haviam escrito uma carta para a federação de futebol do país pedindo melhorias estruturais na seleção.
A carta afirmava que o ambiente do time era "tóxico", que os treinamentos e métodos utilizados pela comissão técnica eram defasados e terminava com um ultimato: ou o técnico Jorge Vilda, principal fonte dos problemas de acordo com as jogadoras, era demitido, ou as 15 atletas que assinaram o documento não jogariam mais pela Espanha.
O pedido das jogadoras foi exposto publicamente pela federação por meio da imprensa, algo que não agradou as atletas. De acordo com elas, o documento não foi feito para o público e a postura da federação era um afronte à intimidade das jogadoras. "A RFEF não vai permitir que as jogadoras questionem a continuidade do treinador e de sua comissão técnica, pois tomar essa decisão não está dentro de suas responsabilidades", afirmou a federação espanhola em comunicado oficial.
A repercussão com os torcedores espanhóis, no entanto, não foi das melhores, e parte das atletas que formularam o documento vieram à publico afirmar que não haviam pedido a demissão do técnico Vilda, somente uma reestruturação na seleção. Além das 15 jogadoras que assinaram a carta propondo o boicote, outras atletas compartilharam o documento em suas redes sociais.
Nomes importantes da seleção como Alexia Putellas, Aitana Bonmatí, Jenni Hermoso e Irene Paredes não assinaram a carta, mas propagaram o texto para seus seguidores. De acordo com a imprensa espanhola, Putellas, Bonmatí e Paredes já teriam pedido a demissão de Vilda no fim de agosto.
Há oito anos no comando da seleção da Espanha feminina, o técnico teve o apoio da federação e convocou a equipe para a Copa do Mundo com importantes ausências de jogadoras que optaram por não atuar no torneio. Dentre as 15 signatárias do documento, apenas três retornaram ao time. "Essa confusão foi montada por interesses. Isso é um absurdo a nível mundial. A minha solução diante do que aconteceu é divulgar essa lista e olhar adiante. Tenho de convocar jogadoras que estejam 100% com esta seleção", afirmou o técnico Vilda.
Se a boa campanha parece ter apaziguado parte da animosidade entre atletas e comissão técnica na Copa, o assunto ainda está quente na imprensa espanhola. Na véspera da partida contra a Suécia, o jornal Marca questionou a jogadora Aitana Bonmatí sobre o motim e sobre sua decisão de jogar a Copa sob o comando de Vilda.
"Estou tranquila. Tenho personalidade e gosto de mostrar sempre a minha cara quando as coisas vão bem e quando vão mal. Eu não me afeto pelas pessoas que falam sem conhecer, que não sabem de tudo que passamos, que não sabem como está a situação, que não sabem de nada e que só falam do sofá em casa", afirmou a meio-campista, um dos destaques da equipe na competição.
Em busca de um título inédito, a Espanha encara a Suécia nesta terça-feira, às 5h (horário de Brasília), pela semifinal da Copa do Mundo.
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