Uma possível permissão para que Estados criem um novo tributo, incluída de última hora na votação da reforma tributária na Câmara, pode atingir em cheio os principais produtos da pauta de exportação brasileira e, assim, aumentar o chamado Custo Brasil - na contramão de um dos objetivos centrais da proposta, de desonerar o produto vendido para o mercado internacional -, segundo associação do setor e especialista na área.
Uma emenda aglutinativa - que, como o próprio nome diz, juntou os pedidos de vários grupos de interesse - trouxe o trecho que abre a brecha para a taxação por iniciativa estadual. O relator da reforma tributária, Aguinaldo Ribeiro (Progressistas-PB), nega que haja essa permissão na emenda.
No entanto, o presidente executivo da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, afirma que o artigo funciona na prática como um "imposto de exportação", ao permitir que os Estados e o Distrito Federal possam taxar com uma contribuição os produtos primários e semielaborados até 2043. "Minério e petróleo são os dois produtos que estão na linha de tiro", disse Castro. As vendas da soja brasileira, principal produto da pauta de exportação do País, também seriam atingidas. São produtos nos quais o Brasil é mais competitivo no mercado internacional.
O presidente da AEB diz que a Argentina está tributando as exportações, e que a medida não tem dado certo. "A reforma na Constituição nasce com uma insegurança jurídica. Como o exportador vai vender um produto sem saber se ele poderá ser tributado ou não?", questiona.
"Esse artigo é o oposto do que a reforma tributária propõe: onera as exportações e ainda permite a tributação na origem", afirma Breno Vasconcelos, tributarista do Mannrich e Vasconcelos Advogados e pesquisador do Insper.
Demanda
Ribeiro admitiu no plenário da Câmara que o artigo 20 foi um atendimento aos governadores do Centro-Oeste. "Foi um pedido, que foi aquiescido pelos governadores, para atender ao governador Caiado, que fez campanha contra reforma tributária. Nós estamos atendendo a isso."
O Estadão apurou que Ronaldo Caiado (União Brasil), governador de Goiás, recebeu uma ligação do presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), na tarde da quinta-feira passada, 6, horas antes da votação, para fechar um acordo pró-reforma. O governador do Mato Grosso, Mauro Mendes (União Brasil), que até então defendia que a votação fosse adiada para agosto, passou a apoiar o texto e pediu que os deputados do Estado votassem a favor.
Na negociação, os Estados do Centro-Oeste argumentaram que os recursos do novo tributo - permitido pela emenda - seriam usados para a manutenção de rodovias, pelas quais é escoada a produção de grãos, e outras obras de infraestrutura. Por isso, tanto para o Estado quanto para os produtores a permanência da receita seria um bom negócio.
Hoje, esses investimentos são feitos por meio de fundos abastecidos por taxações que atingem, principalmente, o setor de commodities. Tecnicamente, essas contribuições são voluntárias. Mas, caso as empresas não optem pelo modelo, ficam impedidas de ter benefício fiscal. A reforma, porém, inviabilizaria esses fundos, pois acaba com os incentivos fiscais.
Para o relator, está havendo uma interpretação equivocada do trecho aprovado na Câmara. No entendimento dele, o texto só estica a validade de fundos já existentes até 2043 - e apenas para os que financiam investimentos em infraestrutura e habitação.
Procurado, Caiado afirmou que não negocia "assuntos acessórios" e que sua discussão se trata da "preservação das prerrogativas do cargo de governador". Já Mendes disse que os Estados do Centro-Oeste usam os recursos dos fundos para a manutenção das rodovias, pelas quais é escoada a produção de grãos.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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