Depois de 25 anos de negociação, Mercosul e União Europeia chegaram na sexta-feira, 6, a um acordo comercial que só foi possível por movimentações nas placas tectônicas da geopolítica que aproximaram os blocos separados pelo Atlântico. A volta de Donald Trump à Casa Branca, marcada para 20 de janeiro, é vista pelos observadores das relações internacionais como um evento decisivo para que a parceria não levasse mais tempo.
As promessas de Trump durante a campanha e suas declarações posteriores apontam a tarifas mais altas para todos os lados, não apenas sobre produtos da arquirrival China, contra quem os Estados Unidos tentam defender a sua hegemonia econômica. Trump já anunciou que os parceiros comerciais vizinhos, México e Canadá, terão que pagar para entrar nos Estados Unidos. Também ameaçou aplicar tarifas de 100% contra o Brics, caso o bloco de economias emergentes do qual o Brasil faz parte insista na criação de uma nova moeda para substituir o dólar. A Europa também é alvo do tarifaço prometido por Trump.
A escolha de secretários sem experiência no setor público, e que não devem se opor ao futuro presidente, é um sinal de que os planos mais agressivos de Trump não serão apenas retóricos. Assim, pelo menos nos próximos dois anos, antes das eleições legislativas de meio de mandato, tudo indica que os Estados Unidos vão levar adiante uma agenda de maior isolacionismo comercial.
Tanto o Brasil, maior economia da América do Sul, quanto a Europa têm nos Estados Unidos um dos principais destinos das exportações e uma das maiores fontes de investimento. Desse modo, a vitória do protecionismo de Trump trouxe um bom motivo para que ambos trabalhassem mais rápido por um aperto de mãos.
Um diplomata ouvido reservadamente pelo Broadcast diz que se Trump tivesse perdido a disputa para a democrata Kamala Harris, os europeus fariam um jogo mais duro. Seria mais difícil que cedessem nas mudanças do capítulo relacionado às compras governamentais, cobrariam mais salvaguardas ambientais, um dos motivos que fizeram com que as negociações fossem reabertas após um acordo fechado em 2019.
"Consumiria mais tempo. A chegada de uma administração nos Estados Unidos que será potencialmente muito mais protecionista, isolacionista, funcionou como uma força catalisadora do acordo", avalia.
Para a Europa, a aliança com o Mercosul ganhou importância estratégica. Não apenas pela necessidade de, diante do risco de guerra comercial, fortalecer posição em mercados onde a China está avançando, mas também pelo acesso a uma região onde está parte das maiores fontes de recursos essenciais na transição energética - lítio, grafite e energia renovável - quando os europeus buscam alternativas ao gás russo.
Do lado de cá, mudanças políticas também favoreceram o acordo. No Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva colocou no centro da política externa o meio ambiente, uma das frentes mais criticadas do governo anterior, de Jair Bolsonaro. Na Argentina, a posse, um ano atrás, do presidente Javier Milei, deu fim à oposição ao acordo com a União Europeia que existia nos governos peronistas, incluindo o do antecessor, Alberto Fernández.
Ainda que Milei seja aliado de Trump, a pauta comercial não é o principal tema da agenda da Argentina com os Estados Unidos. É mais importante a renegociação da dívida com o Fundo Monetário Internacional (FMI), onde o governo americano é o sócio majoritário.
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