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'Maior medo é uma nova crise alimentar', afirma diretora-geral da OMC

A invasão da Ucrânia pela Rússia vai prejudicar a normalização das cadeias globais de fornecimento, que sofrem com interrupções desde o começo da pandemia, diz a diretora-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), a economista nigeriana Ngozi Okonjo-

Da Redação

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Publicado em 02.03.2022, 17:00:00 Editado em 02.03.2022, 17:08:27
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A invasão da Ucrânia pela Rússia vai prejudicar a normalização das cadeias globais de fornecimento, que sofrem com interrupções desde o começo da pandemia, diz a diretora-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), a economista nigeriana Ngozi Okonjo-Iweala, em entrevista ao Estadão/Broadcast, a primeira a um jornal da América Latina. Mas, em relação à guerra, ela - que completou nesta quarta-feira um ano à frente da instituição - diz estar preocupada principalmente com a alta do preço dos alimentos, já que Rússia e Ucrânia são importantes produtores de trigo e milho e podem suspender suas exportações, o que afetaria especialmente as pessoas mais pobres nos países em desenvolvimento.

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Quais serão os impactos econômicos e no comércio global da invasão russa?

Primeiramente, queria expressar meus sentimentos a todos que estão sofrendo. O impacto na economia mundial será substancial, mas o que mais me preocupa é o comércio de alimentos e de produtos agrícolas. A Ucrânia, por exemplo, é o 5.º maior exportador de trigo do mundo e o 4.º maior de milho. A Rússia também é um grande exportador de trigo, para a África especialmente. Os problemas que tivemos na crise alimentar de 2008, quando grandes exportadores de trigo, como a Ucrânia, ficaram sem exportar, foram sentidos no preço do pão. Em muitos países pobres, pão é uma comida básica. Tenho medo que o mesmo tipo de impacto aconteça agora. Vai ter impacto na carne, pois o preço do milho, usado para alimentar animais, vai aumentar. Vai ter impacto nos fertilizantes, porque a Rússia é um grande exportador. Para mim, a preocupação é com o comércio de produtos agrícolas e com as pessoas pobres, que serão atingidas por isso, especialmente na África e em países em desenvolvimento.

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A OMC pode fazer algo em relação a isso?

A única coisa que podemos fazer é incitar os outros membros da OMC a aumentar suas exportações.

A sra. já afirmou que os gargalos nas cadeias globais de fornecimento vão permanecer por mais tempo do que se esperava. Quando superaremos isso?

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Pensamos que pode durar até o fim deste ano ou começo de 2023, porque hoje ainda tem muito atraso. Mas, com a questão Rússia-Ucrânia, a situação fica mais difícil. Há alguns indicadores na cadeia de fornecimento que parecem um pouquinho melhores. Sabemos que ainda há congestionamento em portos, mas os tempos de entrega estão melhorando em todo o mundo. Pelo menos estavam antes do problema entre Rússia e Ucrânia. Com as sanções que estamos vendo na Rússia, vai ficar mais difícil. É uma pena porque, com a retirada das restrições da covid em muitos países, iria ficar mais fácil lidar com esse problema.

A sra. havia dito que buscava uma solução para a questão da isenção do direito de propriedade intelectual das vacinas até fevereiro. Como está isso?

A situação ainda é difícil. As negociações estão ocorrendo entre um pequeno grupo de países. Estamos buscando uma estrutura que possa ser uma base para todos os membros, para que todos concordem em como lidar com a isenção. O avanço é lento, mas ainda tenho esperança. Vamos ver se conseguimos antes da Conferência Ministerial (agendada para junho, após sucessivos adiamentos devido à covid. A Conferência é a principal reunião do órgão).

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O Brasil não está muito contente com a forma como as conversas estão ocorrendo, pois foi excluído desse pequeno grupo de países.

Temos um respeito enorme pelo Brasil. Já tentamos negociar em muitas configurações: com vários países, com dez países, com oito. Não funcionou. Essa é uma tentativa para ver se, com um grupo pequeno, temos algum progresso e, então, trazer o Brasil e os outros países imediatamente para a mesa. Não há tentativa de deixar o Brasil de fora.

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Como a OMC avalia a proposta da União Europeia de proibir a importação de bens, commodities, de origem de áreas desmatadas?

Esperamos que questões de mudança climática e proteção do meio ambiente não virem medidas protecionistas ou sejam relacionadas a acesso a mercados. Mas, é claro, devemos trabalhar duro com a questão ambiental e o comércio pode ser parte da solução. O comércio pode ajudar tecnologias menos intensivas em carbono a viajarem o mundo.

Mas proibir a importação de bens com origem em áreas desmatadas pode ser uma ferramenta para combater o desmatamento e o aquecimento global?

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Isso é algo que nossos membros terão de analisar. Eles têm de discutir essa questão e chegar a um acordo.

O Brasil está com uma disputa agrícola na OMC contra a Índia, que quer mais subsídios e proteção para seus produtores. Alguma solução à vista?

O Brasil levou a Índia para o Sistema de Solução de Controvérsias. Não posso falar disso porque não posso tomar um lado como diretora-geral.

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Mas esse assunto estará entre as prioridades da Conferência Ministerial? Há uma pressão do Brasil para isso.

Com certeza. A negociação sobre temas agrícolas, incluindo subsídios, será um dos temas importantes.

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Há uma certa crítica de que a OMC não tem trabalhado com os temas mais relevantes, como a questão dos subsídios agrícolas.

Se a OMC não tivesse funcionado, o Brasil não teria trazido o caso. Ainda que tenhamos problemas com o Sistema de Solução de Controvérsias, os Painéis estão funcionando. Entendo a frustração, porque, há 20 anos, as negociações na área de agricultura estão travadas. Quando dizem que a OMC não está funcionando, pergunto: Quem é a OMC? São os membros. Se eles não concordam em ser flexíveis e ceder, tudo trava. Mas tivemos muito mais progresso em 2021 do que em muitos anos. Agora, há ao menos algo em andamento e podemos conversar sobre ter algum entendimento na área agrícola na Conferência Ministerial.

Há pouco mais de um ano, quando a sra. apresentou suas motivações para se tornar diretora-geral, a sra. afirmou que a Organização parecia paralisada. Hoje, a sra. mencionou que iniciou as conversas para a reforma da OMC, mas, ainda assim, tudo parece muito travado.

Você me perguntou sobre o que fiz, e listei o que a OMC já fez. Muito está acontecendo. Sobre o Sistema de Solução de Controvérsias, isso estava parado há duas ou três administrações. Não é da noite para o dia que vai avançar. Pelo menos agora os americanos estão dispostos a começar a conversar sobre o processo da reforma. Antes, eles não queriam nem discutir.

Alguns diretores da OMC, incluindo brasileiros, estão deixando a organização. Recentemente, foi dito que há uma espécie de insatisfação na OMC.

Isso é uma notícia falsa da imprensa local, que entendeu a informação de forma errada. Tem pessoas deixando a OMC por vários motivos. Alguns por questão de saúde, outros anunciaram já há algum tempo que se aposentariam - Vitor do Prado é um deles, um brasileiro. Não sei de onde essas histórias surgiram, mas, quando você faz mudanças internas, sempre saem histórias que não são corretas.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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