Em dia de cautela no exterior, o Ibovespa parecia a caminho de descer novo degrau, para a linha de 102 mil pontos, afastando-se mais um pouco da marca dos 106 mil que havia conseguido manter entre 11 e 18 de abril. No melhor momento do mês, mostrava recuperação de 5 mil pontos - correspondente ao fechamento do dia 12 - em relação ao fim de março.
Agora, a referência da B3 perde força e se reaproxima do ponto em que estava em 31 daquele mês (101,8 mil pontos), contida pela incerteza interna quanto ao (elevado) nível da Selic, que pressiona o caixa das empresas e dificulta a rolagem de dívidas, bem como por cenário externo ainda desafiador, com atividade econômica em desaceleração - e também sem sinal de corte de juros no horizonte.
Hoje, o Ibovespa oscilou entre 102.633,10 e 103.946,58, da abertura, para fechar em baixa de 0,70%, aos 103.220,09 pontos, com giro financeiro modesto, a R$ 20,6 bilhões. No mês, a recuperação do índice é limitada a 1,31%, o que coloca a 5,94% a perda no ano - na semana, recua 1,10% no combinado das duas primeiras sessões.
O mercado tomou nota da participação do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, em audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, em que reiterou as razões pelas quais a Selic deve ser mantida onde está - para quem esperava que alguma luz no fim do túnel pudesse aparecer na audiência, a expectativa não se materializou.
"Já há divisão no mercado quanto ao nível da Selic, se é adequado ou não para lidar com a situação. Empresas têm queimado caixa, têm encontrado dificuldade para rolar dívidas e mesmo recorrido a operações de 'follow on' para se financiar. E não há qualquer sinal de que a Selic pode vir a cair depois de um arcabouço decepcionante, que mostrou dificuldade em apontar de onde virão as receitas", diz Felipe Moura, sócio e analista da Finacap Investimentos. "O principal 'trigger', no momento, para retomada sólida do apetite por ações seria indicação de queda de juros. Fora disso, o Ibovespa sobe um pouco, cai depois."
Lá fora, os resultados trimestrais do setor bancário nos Estados Unidos pesaram nesta terça-feira, reforçando a expectativa de que a maior economia esteja se aproximando de recessão "um pouco mais pesada", com efeito global, no momento em que os principais BCs ainda lutam contra a inflação, observa Charo Alves, especialista da Valor Investimentos. "Os resultados ruins dos bancos americanos realmente pesaram", desde a manhã, ressalta o analista. Em Nova York, as perdas ficaram entre 1,02% (Dow Jones) e 1,98% (Nasdaq) nesta terça-feira.
Aqui, por outro lado, o desempenho majoritariamente positivo das ações de grandes bancos, com Bradesco à frente (ON +1,57%, PN +2,24%), impediu que a correção do Ibovespa fosse maior na sessão, marcada por queda acentuada do setor metálico (Vale ON -2,72%, Gerdau PN -3,50%) em meio a ajuste nos preços do minério na China, frente a preocupações quanto ao consumo de commodities em cenário de desaceleração global e de juros elevados. Petrobras ON e PN, por sua vez, recuaram hoje respectivamente 0,53% e 0,40%, em dia também negativo para o petróleo, que cedeu mais de 2% na sessão.
"O movimento de queda das commodities - especialmente no minério de ferro -, pelo peso conjunto que tem no Ibovespa, tem ditado o ritmo do índice, em um momento no qual se projeta esfriamento da demanda por matérias-primas na China, o que tem se refletido nas cotações do insumo por lá", diz Stefany Oliveira, head de análise de trade da Toro Investimentos. Assim, nesta terça-feira, o índice de materiais básicos (-2,26%) voltou a apresentar desempenho inferior ao de consumo (-1,23%), mais correlacionado ao ciclo doméstico.
Na ponta do Ibovespa, destaque para Braskem (+4,97%), São Martinho (+2,69%), Banco Pan (+1,74%) e BTG (+1,20%), além das ações do Bradesco. Do lado oposto, MRV (-7,72%), Soma (-6,44%), CVC (-4,81%), Méliuz (-4,55%) e Natura (-4,19%).
O Brasil manteve o posto de maior gerador de resultados do grupo Santander no mundo, com lucro líquido atribuído aos controladores de 469 milhões de euros no primeiro trimestre deste ano. Em euros, houve uma queda de 25%, de acordo com o informe de resultados do grupo divulgado nesta terça-feira. A Unit do Santander Brasil fechou o dia em alta de 0,72%.
Na agenda macroeconômica doméstica, destaque pela manhã para a divulgação da Pesquisa Mensal do Comércio, do IBGE. "As vendas do comércio varejista caíram 0,1% em fevereiro, na série com ajustes sazonais, revertendo o forte crescimento no mês anterior. Com isso, no acumulado do ano, o varejo teve alta de 1,8% e a média móvel trimestral foi de 0,2%", aponta o economista Rafael Perez, da Suno Research. Em nota, ele destaca queda no mês "bastante disseminada" entre os segmentos que compõem a pesquisa, em especial para supermercados, alimentos e bebidas, em retração de 0,7%, e em combustíveis e lubrificantes (-0,3%).
"O cenário doméstico desafiador deve impedir uma retomada mais robusta do setor de varejo, já que a perda de dinamismo do mercado de trabalho e o aumento do endividamento e da inadimplência tendem a afetar o ímpeto por maiores gastos", acrescenta o economista.
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