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'Entramos em um mundo com maior incerteza', afirma Paulo Leme da XP Private

A consequência econômica mais "nefasta" da invasão da Ucrânia pela Rússia não está na alta do preço do petróleo e do gás natural, mas na quebra de um contrato de ordem internacional que prevalecia desde o fim da URSS, avalia Paulo Leme, presidente executi

Da Redação

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Escrito por Da Redação
Publicado em 01.03.2022, 08:18:00 Editado em 01.03.2022, 08:27:44
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A consequência econômica mais "nefasta" da invasão da Ucrânia pela Rússia não está na alta do preço do petróleo e do gás natural, mas na quebra de um contrato de ordem internacional que prevalecia desde o fim da URSS, avalia Paulo Leme, presidente executivo de alocação da XP Private. "Invadir um país pacífico não está no script. O prêmio de risco global aumentou. Isso pode acabar reduzindo a cooperação internacional e o comércio global", diz. Para ele, porém, o impacto no Brasil desse conflito pode ser minimizado se um bom presidente for eleito em outubro. "Não vou entrar na discussão política, mas, com um bom presidente, um bom programa econômico, que gere bom relacionamento com o mercado e investimentos, o potencial do País é espetacular." A seguir, trechos da entrevista concedida ao Estadão.

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Há analistas falando de estagflação global, como nos anos 70. Isso pode ocorrer?

É mais um risco do que uma certeza. A guerra afeta marginalmente a economia mundial por dois canais. Primeiro, por um aumento de preço de commodities. É importante deixar claro que uma coisa é seis mil ogivas nucleares, e outra é PIB. Em termos de economia mundial, a Rússia é pouco relevante. É 1,7% da economia mundial e representa 1,3% do comércio global. A Ucrânia corresponde a 0,3% do comércio global. Se não fosse por commodities, o impacto seria pequeno. Mas a Rússia é o quinto maior exportador do mundo de energia. Aí tem o risco de interrupção de fornecimento para a Europa e do aumento do preço do gás natural e do petróleo. À medida que as sanções são implementadas, isso contribui para elevar o preço do petróleo e afetar a política monetária dos Bancos Centrais. Se o Fed (Federal Reserve, o BC dos EUA) já tinha de subir muito os juros, terá de subir mais. Então, o segundo canal de transmissão, não direto, acaba afetando o crescimento global. Uma política monetária mais restritiva pode levar, na margem, a um PIB (global) menor. Por último, o impacto intangível é muito mais nefasto e duradouro do que preço de energia, PIB ou inflação. É o impacto do rompimento de um contrato da ordem internacional, de um acordo que se tinha, implícito ou não, desde a dissolução da URSS, de não agressão. Invadir um país pacífico não está no script.

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Quais são os efeitos disso?

A incerteza e os riscos contratuais aumentam. Por exemplo, uma empresa exportadora que tinha relações com a Rússia agora não consegue ser paga. Você também faz uma regra de três: a Rússia está para a Ucrânia assim como Taiwan está para a China. O prêmio de risco global aumentou. Isso pode acabar reduzindo a cooperação internacional e o volume de comércio global. Acaba sendo prejudicial para o desenvolvimento e o crescimento econômico. A estrutura do pós-Guerra podia não funcionar bem, havia excessos - por exemplo, os EUA invadiram o Iraque -, mas agora entramos em um mundo com um grau muito maior de incerteza. Isso custa crescimento. Inicialmente, vai ser pelo canal de commodities, por inflação. Depois, força os BCs a subirem mais os juros. Não vamos culpar a Rússia pela inflação. A culpa foi de um erro de cálculo dos BCs. Talvez a exceção seja o nosso BC, que começou antes (a aumentar o juro).

Não teve também a pandemia, que interrompeu cadeias de fornecimento?

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Os BCs foram lentos. Houve o problema das cadeias de produção, mas a liquidez injetada pelos BCs chega a US$ 10 trilhões, 12,5% do PIB mundial. O excesso de oferta monetária é excesso de demanda por bens e serviços. O excesso de demanda mais a oferta inelástica (causada pela interrupção das cadeias) gerou essa pressão de inflação. O Fed errou ao segurar a normalização da política monetária, e não foi por uma semana. Foi por pelo menos um ano. Um bom BC normaliza as condições monetárias em dia de sol e em tempo bom. Quanto mais ele espera, mais fica vulnerável às intempéries e não percebe o que pode acontecer. Agora aconteceu Rússia e Ucrânia.

A Rússia pode ser asfixiada financeiramente?

As sanções estão evoluindo à medida que cenas lamentáveis aparecem na TV. Políticos na Europa e nos EUA estão mais reativos do que proativos. Mas as sanções podem levar a uma desorganização importante da economia russa e vão levar a uma recessão profunda do país. O problema é que um Putin desmoralizado e encurralado pode ter reações inesperadas. Ele já teve na semana passada. Nem os ucranianos nem o mercado acreditava que ele iria invadir. É preciso avaliar que uma pessoa normal e racional age com certos valores que não são os do presidente Putin. O desespero de um Putin acuado pode levar a medidas bastante ruins para todo o mundo.

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O Brasil vinha deslocado da tendência global, com Bolsa em alta e moeda se valorizando. Isso muda?

O Brasil estava operando com um prêmio de risco elevado devido às incertezas eleitorais e às preocupações fiscais. O câmbio e a Bolsa estavam baratos, enquanto o preço do minério de ferro, de grãos e de todo o complexo de commodities já vinha em tendência de alta. O Brasil vinha se beneficiando de um choque de preços internacionais. Isso valoriza o câmbio, melhora o balanço de pagamentos.

Como isso fica agora?

O Brasil é dono do seu destino dado seu tamanho e o fato de ser uma economia fechada. Não vou entrar na discussão política, mas, com um bom presidente, com um bom programa econômico, que gere bom relacionamento com o mercado e investimentos, o potencial do País é espetacular. E o cenário externo, no momento, tem coisas positivas e negativas. Por um lado, a parte de matérias-primas beneficia. Por outro, o Fed vai tirar o oxigênio do sistema subindo o juro. O que sobra para fluxo de capitais para emergentes diminui. Pode também haver certa aversão ao risco em relação a emergentes devido a incertezas.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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