O Ibovespa retomou o sinal positivo e quase a linha dos 130 mil pontos, não vista em fechamento desde 6 de novembro, na contramão da cautela externa que prevaleceu nesta terça-feira, com a afirmação do presidente eleito Donald Trump de que irá impor tarifas a países como Canadá, México e China tão logo inicie o segundo mandato na Casa Branca, em 20 de janeiro. Assim, os rendimentos dos Treasuries, que ontem haviam se ajustado à bem recebida escolha do gestor Scott Bessent para a secretaria do Tesouro, hoje subiram, limitando fôlego dos índices de ações em Nova York - ainda assim, entre +0,28% (Dow Jones) e +0,63 (Nasdaq) no fechamento, em dia de novos recordes em NY para Dow Jones e S&P 500.
Aqui, o câmbio subiu um pouco, com o dólar à vista em alta limitada a 0,04%, a R$ 5,8081, no encerramento da sessão. O Ibovespa, contudo, sustentou ganho de 0,69%, aos 129.922,38 pontos, mais perto da máxima (130.360,79), quando subia pouco mais de 1%, do que da mínima (129.042,24) desta terça-feira, quase correspondente ao nível de abertura (129.042,62). O giro financeiro, em recente recuperação, ficou em R$ 21,5 bilhões na sessão. Com o desempenho de hoje, o Ibovespa passa a subir 0,16% no mês, ainda cedendo 3,18% no ano. Na semana, avança 0,47%.
Nesta terça-feira, a principal ação do índice, Vale ON, caiu 1,27%, mas tal desempenho foi mais do que compensado pelo avanço do setor financeiro, com destaque para Itaú (PN +1,91%), que chegou a subir cerca de 3% na sessão, e Banco do Brasil (ON +1,30%). Petrobras operou sem direção única, mas fechou com a ON em baixa de 0,51% e a PN, de 0,13%. Na ponta ganhadora do Ibovespa, Brava (+9,33%), Magazine Luiza (+6,29%) e Copel (+5,27%). No lado oposto, BRF (-2,31%), Braskem (-2,14%) e Cosan (-2,05%).
"Apesar de certa aversão a risco lá fora, o Ibovespa conseguiu se manter em alta desde cedo, em dia que já vinha ruim da sessão na Ásia e também na Europa, com a tensão derivada desse segundo mandato de Trump que está para começar, depois da ameaça de tarifas sobre México, Canadá e China", diz Matheus Spiess, analista da Empiricus Research. "Não que seja algo novo: já se sabia que algo viria. Mas sempre há uma materialização do ruído quando vem uma notícia como essa. O estilo dele é esse mesmo: jogar pra cima com ameaça, para conseguir o máximo."
Assim, no plano global, as ações de montadoras - um segmento de atividade conhecido por cadeias de suprimentos que se estendem além das fronteiras nacionais - estiveram entre as que mais se depreciaram na sessão, observa Spiess. "O Ibovespa se descolou um pouco dessa realidade, hoje, à espera do pacote fiscal, com a ideia de que virá algo relevante, de fato", acrescenta.
Destaque da agenda doméstica nesta terça-feira, o IPCA-15 de novembro, considerado a prévia da inflação oficial do mês, veio acima do esperado, com algumas nuances da leitura vistas de forma, também, menos favorável. "Em relação ao qualitativo, observamos mais pontos negativos do que positivos no IPCA - ou seja, uma dinâmica menos benigna", diz Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research.
"Pelo lado negativo, houve uma aceleração de todas as métricas - adicionando grupo de serviços - no acumulado dos últimos 12 meses e na média móvel de três meses anualizada e ajustada sazonalmente. Essa piora pressiona o cenário do Banco Central", acrescenta o economista, observando que "diante da perspectiva de que o mercado de trabalho continue apertado, os preços de serviços devem continuar pressionados" - o que faz crer que o IPCA feche o ano acima do teto da meta oficial de inflação, de 4,5%, possivelmente a 4,8%, prevê a casa.
Apesar da leitura pouco propícia ao apetite por risco, o IPCA-15, desde a manhã, pouco influiu no desempenho do Ibovespa, que se manteve em alta hoje mesmo com o dólar a R$ 5,8285 na máxima da sessão, aponta Virgílio Lage, especialista da Valor Investimentos. "Mercado segue em compasso de espera para o pacote fiscal, e a Bolsa seguiu em alta sem interferência do IPCA, apesar do dólar."
"Rali de final de ano na Bolsa é sempre uma possibilidade, mas os investidores ainda aguardam o pacote de cortes de gastos, que vem sendo adiado há sucessivas semanas pelo governo e que se espera, agora, que venha a sair até esta quinta-feira", diz Gabriel Pereira, sócio e advisor da Blue3 Investimentos, mencionando o principal fator de incerteza doméstica, o grau de ajuste fiscal a ser implementado para que o arcabouço fique de pé. "Até que se tenha essa definição, fica difícil montar posição em ativos de risco, como ações", acrescenta.
"Embora o pacote possa trazer alívio às contas públicas no curto prazo, ajudando na consolidação fiscal, será essencial observar se virá acompanhado de medidas robustas e estruturais, capazes de equilibrar o crescimento econômico e conter as pressões inflacionárias de longo prazo. Um pacote mal estruturado ou com cortes insuficientes pode frustrar o mercado", diz Lucas Almeida, sócio da AVG Capital.
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