RAQUEL LANDIM
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - "Se a função é atender ao interesse público, a empresa não deveria ser de economia mista, mas uma estatal puro-sangue
Francisco Petros, membro do conselho de administração da Petrobras
O advogado Francisco Petros acredita que empresas de economia mista como a Petrobras, o Banco do Brasil e a Eletrobras sofrem de "esquizofrenia", pois não conseguem atender ao mesmo tempo o interesse público e o privado.
"A gestão dessas empresas precisa ser protegida", disse Petros, 52. "A União tem que se convencer de que a utilização política dessas empresas resulta em riscos macroeconômicos, como desemprego e queda dos investimentos."
Ele avalia a questão de um ponto de vista privilegiado, pois é membro do conselho de administração da Petrobras, mas ressalta que emite opinião pessoal sobre o assunto.
Pergunta - As crises da Petrobras, do grupo X e das construtoras da Lava Jato provocaram um grande debate sobre a qualidade da gestão das empresas Brasil. Qual é a sua opinião?
Francisco Petros - Nos últimos tempos, a governança corporativa teve um enorme avanço formal --ou seja, o que está previsto na lei ou nas normas internas e internacionais--, mas ainda existe um carência material importante. Se estivéssemos discutindo a legislação, seriam as leis que não pegam. No caso de governança corporativa, são as práticas que ficam só no papel. Nesse aspecto, há muito a melhorar, particularmente nas empresas de economia mista.
Por que a situação é pior nas empresas de economia mista?
As empresas de economia mista passam por uma esquizofrenia, porque atendem a dois regimes jurídicos: público e privado. Essa confusão prejudica a sua gestão, porque compromete a eficiência.
Outro ponto importante é que essas empresas são vistas pelos burocratas do Estado e pelos políticos como oportunidades para execução de políticas públicas. Não dá para confundir atividade empresarial com interesse público, sob o risco de não atender a nenhum dos dois.
Se são parcialmente públicas, não é função delas atender ao interesse público?
Se a função é atender ao interesse público, a empresa não deveria ser de economia mista, mas uma estatal puro-sangue. Uma empresa que se utiliza da captação de recursos privados não pode ter o interesse público norteando suas funções.
Em empresas como Petrobras, Eletrobras --no passado, também a Vale--, o interesse público é apenas uma pequena parte do seu objeto social.
A União precisa se convencer de que a utilização política das empresas públicas resulta em riscos macroeconômicos importantes, como desemprego, queda da atividade, falta de investimentos.
Nesse caso, o exemplo da Petrobras é paradigmático, porque a sua crise não é só microeconômica, mas tem larga repercussão na economia.
A solução é privatizar?
Algumas empresas passam por esse debate e a sociedade decide que devem permanecer como estatais. Mas, sem dúvida, a privatização é também uma oportunidade estratégica, pois aumenta a eficiência.
Infelizmente, as hostes ideológicas ainda encaram esse debate como uma mera relação entre público e privado. É preciso observar o interesse público de um ponto de vista mais amplo. Às vezes, para que o interesse público seja atendido, é preciso que o interesse privado prevaleça.
O sr. disse que há políticos que enxergam as estatais como oportunidade para fazer políticas públicas, mas as investigações da Lava Jato apontaram corrupção e caixa dois. O que é mais comum?
Há políticos de boa-fé que acreditam que essas empresas têm que atender o interesse público, o que acho um equívoco. Todavia, além disso, existe a distorção desse interesse, que é a corrupção e o apadrinhamento.
Corrupção é inaceitável sobre qualquer regime jurídico. Só para citar um exemplo: os Correios são uma empresa puramente estatal e lá houve uma corruptela do interesse público, recheada de nepotismo, corrupção, empreguismo.
As indicações políticas ainda são realidade nas estatais, apesar das novas legislações. Essas leis foram ineficazes?
A indicação meramente política é deplorável, mas, se obedecesse a critérios profissionais, poderia até ser aceita.
O Estado tem bons técnicos que podem colaborar com essas empresas, mas como burocratas, e não apenas como indicados políticos.
Deixe seu comentário sobre: "Empresas mistas sofrem de esquizofrenia, diz advogado"