As plantas do Cerrado evoluíram, ao longo de milhares de anos, na presença de queimadas espontâneas. O efeito da fumaça na germinação de sementes de 44 espécies vegetais típicas desse bioma foi tema de pesquisa publicada por cientistas da Universidade Estadual Paulista (Unesp) no periódico Plant Ecology. Segundo os autores, os resultados poderão ser utilizados para otimizar a restauração de áreas degradadas.
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O estudo foi conduzido pelo doutorando Gabriel Schmidt Teixeira Motta, sob a orientação da professora da Unesp Rosana Marta Kolb.
“Pesquisas anteriores investigaram a ação da fumaça sobre algumas poucas espécies, mas o levantamento feito neste estudo é o mais completo já realizado no Cerrado. O Gabriel avaliou o efeito da fumaça na germinação de 44 espécies do estrato herbáceo-arbustivo do bioma, envolvendo gramíneas, outras ervas [não gramíneas], subarbustos e arbustos”, diz Kolb.
A pesquisadora informa que a fumaça contém centenas de substâncias, que podem favorecer ou prejudicar a germinação de sementes, dependendo das espécies. As mais conhecidas delas são as carriquinas, reguladores da germinação e do crescimento encontrados na queima de material vegetal. As carriquinas interagem com os hormônios das plantas, promovendo a germinação de certas sementes e inibindo o desenvolvimento de outras.
“Como a pesquisa feita diretamente com fumaça gasosa envolve variáveis difíceis de replicar, optamos por utilizar ‘água de fumaça’ disponibilizada comercialmente. Ela produz um efeito equivalente ao da chuva depois da queimada. E sua ação pode ser facilmente reproduzida por outros pesquisadores”, explica Kolb. E conta que, em seu laboratório, foram empregadas duas concentrações de “água de fumaça”: 2,5% e 5,0%.
Aplicações práticas
O estudo em pauta enfocou o efeito individual das duas concentrações de água de fumaça na germinação das sementes das 44 espécies, sem se preocupar com a definição de estratégias de manejo. Mas as aplicações práticas são óbvias: sementes que respondem bem poderão ser semeadas em áreas que sofreram a ação do fogo ou ainda previamente tratadas com “água de fumaça”, na concentração adequada, antes da semeadura em campo, em áreas degradadas por pecuária e outros usos do solo. “Verificamos que, não apenas as plantas típicas de savanas, mas até mesmo algumas espécies de campos úmidos, que não evoluíram na presença de fogo intenso e frequente, responderam bem ao tratamento com fumaça”, destaca Kolb.
Das 44 espécies estudadas, 14 delas (32% do total) mostraram aumento na germinação em resposta à fumaça, com variações dependendo da concentração. Por outro lado, quatro espécies (9% do total) exibiram uma redução significativa na germinação, particularmente na concentração mais alta, de 5%. As gramíneas, em especial, germinaram mais rapidamente em resposta à fumaça, com destaque para Ctenium polystachyum e Saccharum villosum, que apresentaram redução substancial no tempo médio de germinação após tratamento com “água de fumaça”.
“Os resultados indicam que a fumaça pode atuar como um estímulo importante para a germinação em algumas espécies do Cerrado, oferecendo uma vantagem competitiva no ambiente pós-fogo. A pesquisa sugere que as respostas à fumaça são altamente específicas para cada espécie e variam de acordo com a forma de crescimento e o tipo de comunidade vegetal”, resume Kolb.
Além de Motta e Kolb, Natashi Pilon e Alessandra Fidelis participaram do estudo. A pesquisa recebeu apoio da FAPESP por meio do projeto “Atributos adaptativos ao fogo de sementes de espécies do Cerrado”, coordenado por Fidelis, e da bolsa de pós-doutorado concedida a Pilon.
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