O uso de petróleo no Brasil vai cair a zero antes que a produção de petróleo caia a zero, por isso não faz sentido justificar a exploração da Foz do Amazonas, na Margem Equatorial brasileira, para evitar uma possível futura volta da importação de petróleo no País, disse em mesa redonda patrocinada pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS) o professor do Programa de Planejamento Energético da Coppe/UFRJ, Roberto Schaeffer.
"Isto é uma bobagem", afirmou o acadêmico, sobre especulações de uma possível volta da importação de petróleo após o declínio dos reservatórios do pré-sal no Sudeste do País, o que deve ocorrer no final desta década. Para ele, poderá haver redução em relação ao volume atual, quando cerca de 40% da produção de petróleo brasileiro é exportada, mas não haverá demanda para uma eventual importação.
Para ele, a exploração na Margem Equatorial pode acontecer, mas não há justificativa para ser iniciada na bacia da Foz do Amazonas, onde há poucos anos foi descoberto um banco de corais desconhecidos na região, "e que devem ser únicos no mundo", ressaltou Schaeffer no evento.
Mediada pela coordenadora de Iniciativas do Portfólio de Energia do iCS, Amanda Ohana, a mesa redonda teve como objetivo destacar a incoerência do governo e do Congresso Nacional, que dão sinalizações contraditórias na área de energia.
"O governo se diz pró-transição energética, mas nada fez sobre as térmicas emergenciais a gás natural e a Petrobras, que criou uma diretoria de transição energética, quer avançar na Foz do Amazonas. O discurso é incoerente", explicou Ohana.
De acordo com Schaeffer, o consumo global de petróleo que hoje gira em torno dos 100 milhões de barris diários (bpd), deve cair para 40 milhões de bpd em 2030 e para algo entre 15 milhões e 25 milhões de bpd em 2050, que terão que ser usados para fins não energéticos, segundo o professor.
"O que se questiona é ir perfurar no local mais frágil da Margem Equatorial, que é a Foz do Amazonas. A Margem Equatorial não é só a Foz", destacou. A Margem Equatorial é uma região que se estende do Rio Grande do Norte ao Amapá e contém cinco bacias: Foz do Amazonas, Potiguar, Pará-Maranhão, Barreirinhas e Ceará.
Ele explica ainda que a exploração no local joga por terra os argumentos do governo de que o petróleo do pré-sal é menos poluente do que outros petróleos, como o da Venezuela, e por isso seria um dos últimos a sair do mercado. "O risco ambiental de se achar e produzir petróleo é muito alto, e se (a qualidade) do petróleo não for bom como é do pré-sal, será economicamente pior", explicou.
De acordo com Schaeffer, o petróleo do pré-sal tem uma pegada de carbono de 8 quilos de CO2 por barril de petróleo produzido, contra uma média global de 22 kg de CO2/barril.
Sem plano
Também presente ao debate, o ex-diretor do Operador Nacional do Sistema (ONS), Luiz Barata, criticou outra mensagem contraditória do governo, desta vez um problema herdado do governo anterior, que são as termelétricas a gás natural inflexíveis, inseridas no projeto de privatização da Eletrobras.
"Estamos chegando a junho e não vemos movimento para reverter essa questão. Temos visto ampliação de subsídios para renováveis, que já são fontes mais baratas (eólica e solar). Não pode continuar a dar subsídios para fontes mais baratas", disse durante o evento. "Estamos no início do novo governo e não temos um plano para o setor elétrico", complementou.
Barata afirmou que dificilmente o Brasil vai conseguir cumprir o Acordo de Paris, principalmente agora que está se incentivando o consumo de combustível fóssil com o programa do governo para ajudar a indústria automobilística. Pelo acordo, assinado em 2015, a meta é de redução das emissões de gases do efeito estufa em até 37%, em relação aos níveis de emissão de 2005, até 2025. Essa meta aumenta para uma redução de 43% na emissão até 2030.
"Estamos indo na direção contrária, na contramão do desenvolvimento, mas temos condições de continuar sendo a matriz elétrica mais limpa do mundo", avaliou. "Estudos têm mostrado que as hidrelétricas são capazes de complementar a geração das renováveis. Se tiver termelétrica a gás, somente se for flexível, o que descartamos são as inflexíveis", esclareceu.
De acordo com Barata, as decisões equivocadas e os subsídios aumentam a conta para o consumidor final de energia elétrica, o que pode piorar se forem aprovados planos de subsidiar a construção de gasodutos, projeto que chegou a ser avaliado pelo Congresso Nacional.
"Os subsídios têm que ser revistos. Quando a CDE (Conta de Desenvolvimento Energético) foi criada, era de R$ 2 bilhões. Hoje está em R$ 35 bilhões, isso tem que ser revisto", concluiu.
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