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Prisão de influencer da Cracolândia expõe sistema de 'carrossel' da droga em SP

Investigação da Polícia Civil identificou uma nova dinâmica de venda de drogas na Cracolândia. Com o território dominado pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) e faturamento do tráfico estimado em mais de R$ 200 milhões por ano, a feira de entorpecentes a

Da Redação

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Escrito por Da Redação
Publicado em 30.07.2021, 17:00:00 Editado em 30.07.2021, 17:08:51
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Investigação da Polícia Civil identificou uma nova dinâmica de venda de drogas na Cracolândia. Com o território dominado pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) e faturamento do tráfico estimado em mais de R$ 200 milhões por ano, a feira de entorpecentes a céu aberto passou a se manter em movimento contínuo, girando entre a Estação Julio Prestes e a Rua Helvétia, em uma espécie de "carrossel do crack".

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As cerca de 30 tendas itinerantes são uma resposta do crime organizado à tentativa da Prefeitura de ocupar o território a partir da realização de ao menos três faxinas por dia. As adaptações do tráfico são alvo de inquérito do 77.º Distrito Policial (Santa Cecília) que em seis meses resultou em duas fases da Operação Caronte e na prisão de 15 pessoas. Entre elas, está Lorraine Cutier Bauer Romeiro, de 19 anos, que tinha milhares de seguidores em redes sociais.

Segundo a investigação, as barracas (ou "lojas") passaram a ser agrupadas em três blocos separados, que se deslocam em grupo à medida que a varrição avança. "Para as ações de limpeza ocorrerem, há no 'fluxo' um indivíduo nominado 'salveiro', que dá o 'salve' e assim começa uma desmontagem da estrutura do tráfico", aponta relatório de inteligência da polícia, obtido pelo Estadão. "O 'fluxo' sai da Praça do Cachimbo, entra na Rua Helvétia e se fixa nesta."

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Por remeter a um trem em movimento, a nova estrutura foi nomeada pelos investigadores de "vagão". "Cada um dos vagões reunia de dez a 15 mesas para os traficantes", descreve o delegado Roberto Monteiro, titular da Seccional Centro.

Lucro diário

Apesar de a dinâmica do "carrossel do crack" ser nova, o modelo de negócios é parecido com o que se via na Cracolândia antes da megaoperação policial de 2017. As tendas são arrendadas pelo PCC que cobra, em média, R$ 1 mil por semana aos traficantes "franqueados". Pelo esquema, o barraqueiro fica obrigado a comprar a droga da facção e, em troca, é protegido no território.

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A polícia estima lucro diário de cada barraca entre R$ 5 mil e R$ 6 mil - que é dividido entre os "arrendatários". Normalmente, são três por tenda. Com um casal, que foi preso tentando fugir durante a operação, os agentes chegaram a encontrar R$ 67,7 mil em espécie.

A rentabilidade do negócio atrai criminosos de diferentes regiões. Boa parte dos barraqueiros detidos vivia, na verdade, em cidades da Grande São Paulo, como Barueri, Carapicuíba e Itapecerica da Serra.

Moradora de uma casa comum em Barueri, Lorraine aparece nos relatórios da polícia com o codinome de Lo Bauer e é acusada de atuar em uma das barracas. Em imagens colhidas pela investigação, foi flagrada em meio à feira de drogas, usando jaqueta, capuz e máscara preta. Na mesa à sua frente, havia calhamaços de dinheiro.

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Os barraqueiros mais abastados são chamados de "VIPs" e pagam mais por regalias, como descansar durante o dia ou pernoitar em hotéis e invasões nas proximidades do fluxo. Esses imóveis são usados ainda para armazenar armas e entorpecentes, segundo os relatórios. Ontem, a Prefeitura interditou um desses hotéis da região.

A investigação constatou que um hotel próximo "destina-se, primordialmente, ao recebimento em suas dependências de traficantes que buscam esconderijo e descanso, assim como de usuários de drogas, que querem permanecer fora do fluxo e protegidos pelas paredes do decadente prédio, que se encontra em situação física precária", disse a Prefeitura.

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Também aconteceriam reuniões e "tribunais do crime" nesses locais. "Muitos prédios já foram lacrados pela Prefeitura, porém foram novamente invadidos e seguem sendo utilizados para finalidades criminosas, inclusive para prostituição, com a exploração de menores", afirma um dos documentos.

Na hora do transporte de barracas, usuários de drogas ficam responsáveis por montar e desmontar as estruturas em outro lugar. São os" travessias". Também vão buscar mais drogas nos imóveis para abastecer as tendas ao longo do dia. A estratégia é para que os dependentes sejam escudo, evitando que traficantes acabem incriminados.

Em paralelo ao tráfico, o PCC mantém no local uma feira de produtos furtados - com venda ilícita de celular, bicicleta, roupa, fio de cobre e até documentos para usar em golpes. "Essa feira estrategicamente situada serve como blindagem a qualquer intervenção dos órgãos de segurança no local, dando tempo de fuga e causando distúrbio quando há possível ameaça ao 'fluxo'", diz um relatório.

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Na quarta-feira, 28, o 77.º DP cumpriu mandado contra um motorista de aplicativo. A prisão pode ajudar a desvendar o esquema do PCC para abastecer a Cracolândia e movimentar o dinheiro do tráfico. Ele é suspeito de participar de esquema para levar drogas para a área. Além da entrada contínua de pequenas porções (modalidade "formiguinha"), a polícia acredita que parte dos produtos é entregue por motoristas.

Outra função seria recolher a quantia arrecadada com as tendas, normalmente em espécie, mais fácil de ser apreendido pela polícia, e fazer a distribuição entre lideranças da facção.

O prefeito Ricardo Nunes (MDB), disse na quarta-feira que o efetivo da Guarda Civil Metropolitana (GCM) na região da Cracolândia foi dobrado e que barracas de venda de crack não serão mais admitidas no local. "Chamei a equipe, mostrei (as filmagens da polícia) e determinamos: não vai ter na cidade de São Paulo barraca de crack. Houve mais de 10 prisões nos últimos dias", afirmou em entrevista à Rádio Eldorado. "Barraca de venda de crack não tem mais, a cidade de São Paulo não vai admitir. Pode ir lá hoje, pode ir amanhã".

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O prefeito afirmou ainda que a gestão tem feito um acompanhamento "muito forte" na área. "Eu dobrei o efetivo da Guarda Civil. Eram 80, hoje temos 160 (guardas). Dobramos o número de viaturas. Hoje temos 32 constantes e mais 12 motos." Segundo Nunes, já houve uma melhora. "No começo do ano, ali havia mais de 860 pessoas. Ontem eram 420. O número quase caiu pela metade".

58 mil seguidores

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Nas redes sociais, Lorraine Cutier Bauer Romeiro aparentava uma vida confortável. Antes de ser presa duas vezes por tráfico de drogas em menos de um mês, a jovem branca e loira era seguida por 36 mil pessoas no Instagram e postava fotos em poses sensuais em locais paradisíacos, com praias ou cachoeiras ao fundo. Nesta quinta-feira, o número de seguidores saltou para 58,8 mil.

Para a investigação da Operação Caronte, Lo Bauer (alcunha que consta em relatório de inteligência da Polícia Civil) era responsável por uma das cerca de 30 barracas da feira de drogas a céu aberto na Cracolândia. As tendas são arrendadas pelo Primeiro Comando da Capital (PCC), que controla a área, cobra aluguel e fatura ao menos R$ 200 milhões por ano.

Órfã do pai e mãe de uma bebê que tem menos de 10 meses, a investigada morava com a filha, a mãe e o irmão em uma casa comum de Barueri, na Grande São Paulo. Após ter a prisão preventiva decretada pela Justiça na sexta-feira passada ela está na carceragem do 89.º Distrito Policial (Portal do Morumbi).

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Policiais suspeitam que Lo Bauer tenha se associado à facção e começado a atuar na Cracolândia entre seis meses e um ano atrás. "Não era rica, mas também não precisava. Foi uma forma que ela encontrou para ostentar e pagar passeios de barco em Angra (dos Reis, RJ)", diz Luiz Carlos Zaparoli, da Seccional do Centro.

Segundo policiais, o envolvimento com o tráfico teria começado a partir de seu relacionamento com André Luis Santos Almeida, o MC Tatu China, o primeiro líder da tenda. Na Cracolândia, o casal ainda tinha um ajudante. Com a prisão do namorado no mês passado, Lo Bauer teria assumido a gerência do ponto, mas seu comando na barraca durou apenas 22 dias.

Diante da repercussão do caso, o irmão da investigada chegou a publicar vídeo em que afirma: "Infelizmente ela se envolveu com pessoas erradas. Sempre teve vida boa, uma família boa, que a apoiou e deu conselhos. Mas acabou tomando escolhas erradas. Agora vai pagar pelo que fez. A gente, a família dela, de maneira alguma vai lhe passar a mão na cabeça."

A família já havia enfrentado uma primeira tragédia em 2014. O empresário Ricardo Bauer Romeiro, pai dela, foi baleado e morreu em um assalto em Barueri, de acordo com a polícia. "Sem dúvida, é um drama familiar", afirma o delegado Severino Pereira de Vasconcelos, titular do 77.º DP (Santa Cecília), que comanda as investigações na Cracolândia.

Apesar de Romeiro aparecer em dois registros policiais, os investigadores descartam que ele tivesse envolvimento com o crime. Seus antecedentes seriam de lesão corporal, por causa de um acidente de trânsito, e posse de droga.

Duas prisões

Lo Bauer foi detida dia 30 de junho pela Guarda Civil, numa rodada de faxina na Cracolândia. Ao perceber os guardas, saiu andando e foi abordada na Rua Helvétia, portando 9,9 gramas de maconha, 9 de cocaína e 15 pedras de crack, escondidos no sutiã e na calcinha. No bolso, tinha um aparelho celular avaliado em mais de R$ 6 mil.

Na segunda prisão, ela foi encontrada às 7 horas na casa do namorado, também em Barueri. No local, a polícia relata ter encontrado 295 porções de cocaína, 97 de lança-perfume, 85 de maconha, 16 de ecstasy e oito de crack.

Ao mandá-la para a carceragem, a juíza Celina Macedo Stern escreveu: "A conversão do flagrante em prisão preventiva se faz necessária a fim de se evitar a reiteração delitiva, eis que em liberdade e, até mesmo, em prisão domiciliar, frise-se, (Lo Bauer) já demonstrou concretamente que continuará a delinquir". O advogado criminalista José Almir, contratado pelos parentes para defendê-la, disse que só iria encontrar a investigada ontem e ainda não poderia se posicionar ainda sobre o caso. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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