“Parecia uma cidade fantasma. A cidade entrou em lockdown. Há duas semanas, nada funciona, as escolas, o comércio, setores públicos, as empresas”. O relato é do mineiro Renato Abreu, de 33 anos, que vivia em Ashkelon, cidade no sul de Israel, a cerca de 10 quilômetros da Faixa de Gaza.
“Tínhamos que seguir a recomendação de segurança de não sair às ruas, de forma alguma”, detalha o coordenador de projetos, que morava em Israel desde 2016, com exceção do período da pandemia de covid-19, quando ficou no Brasil.
Renato é um dos 69 passageiros que chegaram ao Brasil na manhã deste sábado (21), no avião Embraer KC-390 Millennium, da Força Aérea Brasileira (FAB). Foi o sétimo voo da Operação Voltando em Paz, realizada em conjunto com o Ministério das Relações Exteriores (MRE), que decolou na noite de sexta-feira (20) de Tel Aviv.
A aeronave pousou primeiro no Recife, na manhã deste sábado, onde desembarcaram dois passageiros. Os demais seguiram para a Base Aérea do Galeão, no Rio de Janeiro, incluindo três bolivianas, uma mãe e as duas filhas menores de idade. Nove animais de estimação também foram trazidos de Israel.
Mistura de sentimentos
Renato disse que só ficou sabendo que seria repatriado em voo da FAB na manhã de sexta-feira, quando recebeu um telefonema da embaixada brasileira. Ele morava com um irmão, que seguiu para Londres em um voo comercial. Na cidade que fica colada à Faixa de Gaza, ele deixou o tio e o primo.
“Os barulhos são muito altos, a nossa rua foi bombardeada por quatro mísseis. O Sul [de Israel] realmente virou uma zona de guerra”, detalhou o brasileiro que conhecia Karla Stelzer Mendes, de 42 anos, uma das três brasileiras mortas pelos ataques do grupo extremista palestino Hamas, há duas semanas.
Para Renato, que depois de pousar no Rio seguiu a viagem para Belo Horizonte, a volta ao Brasil é uma mistura de sensações. “Alegre por ter dupla cidadania e estar no Brasil, triste porque eu tive amigos que falaram que queriam estar no meu lugar”.
Vida parada
O brasileiro Pedro Terpins passou mais tempo da vida em Israel do que no Brasil. Aos 23 anos, ele desembarcou no Rio de Janeiro após viver 18 anos no Oriente Médio. O barman e estudante de ciência política morava em Tel Aviv e enfrentou uma rotina de exceção nos últimos dias.
“Eu estava desempregado, a minha faculdade parou, toda a minha vida está parada. Eu estava havia duas semanas só no meu quarto, sem sair, sem encontrar amigos, sem trabalhar”, relata Pedro, que tem família em São Paulo.
Ele contou que conhecia, ao menos, três das pessoas que foram mortas nos ataques de 7 de outubro, incluindo a brasileira Bruna Valeanu, de 24 anos.
“Tem mais pessoas que eu ainda não sei se estão [sequestradas] em Gaza ou se estão mortos e ainda não foram descobertos os corpos”, lamenta.
Mais de 1,2 mil repatriados
Até agora, a operação para repatriar brasileiros soma sete voos que trouxeram 1.204 passageiros e 44 pets. De acordo com o MRE, as três cidadãs bolivianas foram incluídas no avião “após constatado o não comparecimento de passageiros brasileiros”.
A administradora Michele Antunes morava havia cinco anos em Jerusalém e descreveu o cotidiano dos últimos dias na cidade. “Tivemos que, várias vezes, ir para bunkers. Mas nada que se aproximasse do que se passou perto de Gaza. Graças a Deus, a gente estava um pouco mais seguro, mas era um desespero porque não tinha ninguém nas ruas, todo mundo com medo de tudo”.
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