Após o incêndio do dia 2 de setembro de 2018, que consumiu o palácio principal do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), na Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro, o trabalho de resgate conseguiu recuperar parte significativa da Coleção Imperatriz Teresa Cristina. Segundo a equipe de resgate, pelo menos 30% das peças foram recuperadas, sendo que cerca de 100 foram encontradas inteiras.
A coleção foi trazida ao Brasil pela imperatriz Teresa Cristina de Borbone, princesa do Reino das Duas Sicílias, no sul da Itália, que chegou ao país em 1843, já casada por procuração com o imperador Dom Pedro II. As peças da imperatriz foram recuperadas de escavações arqueológicas em Pompéia, Herculano e Veio, cidades soterradas pela erupção do vulcão Vesúvio no ano de 79. Uma parte da coleção foi doada pelo irmão dela, Fernando II, e outras são fruto de trabalho de escavação promovidos por ela.
A coleção completa da imperatriz incluía cerca de 750 peças, entre objetos de bronze, cerâmica, vidro e afresco, datados do século VII a.C ao III d.C. Apesar de não serem peças brasileiras, a coleção tem forte relação com o Museu Nacional, por trazer a memória do palácio enquanto residência da família imperial.
Para a arqueóloga Ângela Rabello, uma das responsáveis pelo trabalho de resgate após o incêndio no museu, “as peças foram recuperadas com o trabalho árduo da equipe e trazem esperança para o Museu Nacional”.
“Temos uma resposta positiva, 30% da coleção foi resgatada. Agora, se ela estará em condições de ser mostrada ao público, vai depender do que pode ser restaurado. Cerca de 100 peças estão inteiras, não sofreram danos. Isso é altamente positivo. São 200 peças ao todo, quase 30% de 750, diante do fogo, da tragédia que foi, do desabamento, do nível de destruição, é altamente positivo. Durante o inventário a gente pode ser surpreendido e esse número pode aumentar”.
Coleção
A exposição da Coleção Imperatriz Teresa Cristina ocupava três salas no segundo andar do palácio, em um dos poucos locais onde o piso e o teto não desabaram. Porém, as vitrines de exposição tombaram no incêndio. Outra parte estava guardada em armários no térreo, que sofreram o impacto da queda dos pisos superiores e do fogo, mas não tombaram e preservaram boa parte das peças.
Os afrescos de Pompeia, que ficavam isolados por uma vitrine de vidro, foram encontrados no chão, em pequenos fragmentos. A professora Neuvânia Ghetti, coordenadora do Núcleo de Conservação do Resgate de Acervos do Museu Nacional, explica que a coleta das partes foi feita com pinça e bisturi, num trabalho minucioso para separar o material de restaurações anteriores do desabamento do prédio e estabilizar os processos químicos desencadeados pelo incêndio.
“São muitos desafios. A superfície enegrecida do painel original, após o evento de uma energia que desequilibrou esse material, que agora retorna a uma nova estabilidade, ela está branca. O fogo alterou a coloração. Tivemos um esmaecimento da coloração negra. Então temos que pensar com cuidado no tratamento desse material. Mas traz muita esperança de conseguirmos retornar à melhor condição de estabilidade desse material”.
Inventário
A coordenadora do Núcleo de Resgate, Cláudia Carvalho, disse que as ações na parte interna do palácio estão 90% concluídas, com 4.500 registros de resgates, podendo ser lotes ou peças únicas. A maioria são dos departamentos de antropologia, geologia e paleontologia.
“Estávamos finalizando o trabalho de resgate quando começou a pandemia e o isolamento, faltavam cerca de dois meses de trabalho. Nós paralisamos as atividades naquele momento, por ser uma atividade que já inclui várias ações de segurança. O trabalho agora tem sido de vistoria e organização dos acervos já coletados e preparação para a etapa de inventário”.
Da Coleção Teresa Cristina, Cláudia disse que os materiais mais afetados foram os vidros, que se perderam diante da exposição ao calor intenso do incêndio.
Neuvânia Ghetti, coordenadora do Núcleo de Conservação do Resgate de Acervos do Museu Nacional, destaca que o trabalho de inventário vai ser feito em paralelo com a restauração.
“É importante nessa etapa que vai se iniciar, do inventário e do trabalho de conservação continuada, fundamental vai ser esse contato mais próximo com cada um desses fragmentos e peças íntegras e semi-integras, estabelecendo um grau de priorização para as ações de restauro”.
Obras
A previsão para a reabertura parcial do Museu Nacional é setembro de 2022, bicentenário da independência do Brasil. A reabertura total só deve ser possível no segundo semestre de 2025. Até o fim desses anos, estão programados o início da elaboração dos projetos de arquitetura, jardins e museografia; início da obra de recuperação dos elementos decorativos do Paço e Jardim das Princesas; e o início da obra de reforma e ampliação da Biblioteca Central.
Também deve ser concluída ainda em 2020 a obra de construção do prédio administrativo no novo campus da Cavalariça; o cercamento do campus Museu Nacional/UFRJ; a elaboração do projeto básico e executivo das edificações da área acadêmica no novo campus e dos prédios permanentes para abrigar os laboratórios de manuseio de coleções em meio líquido. Além da licitação da construção do Centro de Visitantes, com previsão de conclusão para o primeiro semestre de 2021.
Amanhã (2), para marcar os dois anos da tragédia, o Museu Nacional promove, a partir das 15h, o seminário virtual Relatos do Resgate: Conservação, Restauro e a Coleção Imperatriz Teresa Cristina. O encontro será transmitido pelo canal do Youtube do Museu Nacional.
Participam do evento o diretor do Museu Nacional/UFRJ, Alexander Kellner; a arqueóloga do Museu Nacional/UFRJ, Angela Rabello; a coordenadora do Núcleo de Conservação do Resgate de Acervos do Museu Nacional/UFRJ, Neuvânia Ghetti e a diretora executiva da APOYOnline (Associação para Preservação do Patrimônio das Américas), Beatriz Haspo.
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