Uma vida feliz e bem-resolvida é o objetivo de praticamente qualquer pessoa, mas, no mundo moderno, os obstáculos são vários. As incertezas, injustiças e pressões que sofremos no dia-a-dia, podem, com muita frequência, nos desestabilizar e provocar traumas, prejudicando nosso bem-estar a longo prazo. Como efeito, vemos uma explosão de casos de transtornos psíquicos como ansiedade e depressão, que, de acordo com a Organização Pan-Americana de Saúde, aumentaram 25% durante a pandemia, por exemplo.
Tratar esses problemas não é fácil, mas é possível. E um dos principais métodos para isso é a psicanálise: uma abordagem baseada nas teorias e técnicas desenvolvidas pelo médico austríaco Sigmund Freud no início do século XX. Mas como, afinal, funciona a terapia psicanalítica? As dúvidas ainda são comuns e, para esclarecê-las, conversamos com a psicanalista Denise Santos, que explica alguns conceitos importantes sobre o assunto.
A psicanálise e a busca pela felicidade
Alcançar a felicidade é um objetivo quase universal, mas, para abordá-lo, a psicanalista Denise Santos destaca que primeiro é preciso definir a própria felicidade à luz da psicanálise. De acordo com ela, o conceito está intimamente relacionado à maneira como lidamos com as diferenças entre as pessoas. “Essa diferença é justamente o que nos dá a possibilidade de criar arte, cultura, trabalho e relações. A diferença do outro em alguma medida sempre nos é ameaçadora. Mas ao mesmo tempo, a desejamos quando acreditamos que ela nos trará uma certa complementaridade, capaz de tamponar nossos buracos e vazios”, explica.
A especialista prossegue: “autoconhecimento, para a psicanálise, é consentir com essa realidade da diferença e desconstruir o que parece ser verdade absoluta, para só assim se relacionar melhor com o outro, seja no trabalho, no amor, na família ou nas relações diversas. Isso sim, para alguns, já poderia ser felicidade”.
Diante desses pontos, Denise Santos destaca que a terapia psicanalítica auxilia no crescimento pessoal quando desbanca certezas e coloca a pessoa numa posição de dúvida. “A pergunta movimenta e faz a pessoa caminhar. É se questionando e se pondo a pensar que essa pessoa sai da estagnação”, afirma. Alguns dos questionamentos mais comuns e importantes nesse contexto, segundo a especialista, são “o que posso fazer diferente”, “o que é que sinto como desagradável o que isso diz sobre mim” e “qual a minha responsabilidade na desordem da qual me queixo”.
As sessões na prática
A psicanalista Denise Santos explica que as sessões de psicanálise exigem que o paciente fale sem pensar, como se estivesse divagando. “Essa divagação pode ser mais fácil para alguns enquanto pode ser muito difícil para outros”, ressalta. Ela pontua, no entanto, que o paciente não deve se preocupar quanto a essa possível dificuldade. “É trabalho do analista direcionar esse percurso através de perguntas que abrem o discurso”, afirma. “O paciente entra numa sessão pensando que falará uma coisa e acaba sempre falando outra. Esse é o trabalho”.
O tempo de terapia também pode variar bastante, de acordo com Denise Santos. Ela destaca que quem procura psicanálise geralmente o faz porque já tentou outras abordagens que deram pouco ou nenhum resultado. “Esse comprometimento de ir até a psicanálise é feito muito por sofrimento, por depressão, ansiedade, síndrome do pânico ou tantos outros acometimentos. Geralmente o trabalho é longo”, diz ela. No entanto, alguns pacientes também procuram esse tipo de terapia para lidar com um problema pontual, mas que não necessariamente sustentará o trabalho de uma análise a longo prazo. “É sempre preciso ouvir caso a caso. Tudo em psicanálise trata da subjetividade daquele que fala”, lembra a especialista.
Os efeitos a longo prazo
A longo prazo, a psicanálise favorece um caminho para uma vida mais interessante, com menos sofrimento psíquico, como explica Denise Santos. As relações, o novo e o outro passam, por exemplo, a ser menos ameaçadores quando passamos a reconhecer o lugar que desejamos ocupar em nossas vidas.
É aprendendo a falar “não”, por exemplo, impondo os limites, escolhendo amores melhores, falando o que se sente e aprendendo novas formas de comunicação que reconhecemos a “interdependência entre o interno e o externo” — e vice-versa. “É essa interessância que pode ser nomeada como felicidade. E é isso que a psicanálise pode proporcionar para alguns”, diz Denise.
Ela destaca, ainda, que o hábito de negligenciar e reprimir as emoções, evitando assim a terapia, pode gerar consequências negativas com o passar do tempo, criando “uma receita para o caos” nas relações ou o surgimento de doenças psicossomáticas. De acordo com ela, quando os sentimentos não são exprimidos pela linguagem, a tendência é que o corpo receba e absorva essa energia, que passa então a provocar sintomas físicos. “São as emoções boas ou ruins, os afetos e a linguagem que nos tornam humanos. É impossível assim negligenciarmos a base de nossa existência”, alerta.
Deixe seu comentário sobre: "Entendendo você e os outros com auxílio da psicanálise"