Messi nunca se declarou autista. Também jamais houve um familiar ou uma fonte minimamente próxima a ele que confirmasse esse diagnóstico. Mas, de onde saiu essa “informação”, que pode ser encontrada em milhares de sites, e como ganhou repercussão mundo afora?
A fake news surgiu no Brasil. Essa lenda urbana nasceu em 27 de agosto de 2013, quando o escritor e jornalista Roberto Amado (sobrinho de Jorge Amado) publicou em seu site, à época, o “Poucas Palavras“, um longo texto dizendo que o craque Lionel Messi “foi diagnosticado aos 8 anos de idade, ainda na Argentina, com a síndrome de Asperger”.
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Amado enumerou diversas características que “provariam” que Messi é autista, como a timidez com a imprensa e a peculiaridade de sempre dar dribles e chutar a gol da mesma maneira, o que seriam indícios de padrões repetidos, típicos de um “portador da síndrome” (sim, ele ainda usou o termo “portador”!).
No mesmo texto — intitulado “Como o autismo de Messi ajudou-o a ser gênio” —, Roberto Amado destaca o famoso filme “Rain Man”, de 1988, com Tom Cruise e Dustin Hoffman, o que deixa o artigo mais atraente, e acaba por misturar pontos totalmente diferentes do espectro do autismo, comparando síndrome de savant com asperger. Uma confusão só!
Após esse diagnóstico à distância do brasileiro, a história (como toda boa fake news), depois de publicada na internet, se alastrou e ganhou o planeta.
Romário no Twitter
Poucos dias depois, em 8 de setembro de 2013, o ex-jogador Romário entrou na polêmica. Ele publicou na rede social Twitter: “Vocês sabiam que o Messi tem Síndrome de Asperger? É uma forma leve de autismo, que deu a ele o dom do foco e concentração acima de tudo e de todos. Newton e Einstein também tinham níveis de autismo. Espero que, como eles, Messi se supere a cada dia e continue nos apresentando esse belo futebol”.
Em seguida, postou o link do artigo de Roberto Amado. Isso foi parar na mídia internacional e chegou a Jorge Messi, pai do craque, que disse que processaria o brasileiro. Romário, novamente via Twitter, respondeu: “Sites da Espanha divulgaram que eu havia dito que Messi tem um transtorno mental e estão fazendo sensacionalismo em cima do assunto. Divulguei uma informação que veículos no Brasil têm abordado.
Vcs sabiam q o Messi tem Síndrome de Asperger? É uma forma leve de autismo, q deu a ele o dom do foco e concentração acima de tudo e d todos
continua após publicidade— Romário (@RomarioOnze) September 8, 2013
Ah, o pai do Messi disse que vai me processar por isso. Pode processar, a vontade.
— Romário (@RomarioOnze) September 9, 2013
Até uma TV abordou o assunto. Então fica aqui a informação: de acordo com o pai do Messi, ele não tem autismo. Não sou médico para confrontar a informação. Ah, ele disse que vai me processar por isso. Pode processar à vontade”, escreveu Romário.
No dia 26 de setembro de 2013, a reportagem do UOL Esporte falou com Diego Schwarzstein, médico que tratou o principal e conhecido problema de saúde de Messi: uma deficiência hormonal que comprometeu seu crescimento. O médico, que ainda mora em Rosário (Argentina), cidade natal de Messi, não deu margem a dúvidas: “Leo nunca foi diagnosticado como Asperger ou qualquer outra forma de autismo. Isso é realmente uma bobagem”, afirmou categoricamente.
Outro aspecto muito importante que corrobora a falsidade da afirmação é o “autismo” de Messi ter sido ignorado pelas principais e mais respeitadas biografias (em texto e em vídeo) já lançadas sobre sua vida e carreira em 2009, 2010, 2011, 2012 e 2015. Um exemplo vem do jornalista e escritor espanhol Guillem Balague, especialista em futebol e em biografias de craques, que naquele mesmo ano de 2013 publicou o livro “Messi“, uma biografia autorizada do argentino. “Essa história é um lixo!”, exclamou ele ao ser perguntado sobre o assunto.
Dois anos depois, em 2015, no jornal Extra, o sobrinho de Jorge Amado reafirmou a história e ainda desafiou: “Conversei com pessoas envolvidas com o assunto e ninguém sequer contestou o contrário. Se eu cometi uma imprudência é problema meu. Não preciso provar nada para ninguém. Se ele quiser me processar, que vá provar na Justiça. Há dois anos que falo isso porque eu conheço o olhar e pessoas envolvidas nessa questão. Não é demérito nenhum ter autismo. É só uma curiosidade mesmo (sic)”, argumentou.
Uma mentira contada mil vezes…
Em 2017, no programa de TV “Encontro” (Rede Globo), Fátima Bernardes teve que corrigir um convidado que fez novamente tal afirmação sobre o autismo de Messi. O convidado Gustavo Cerbasi disse: “Um bom exemplo, Messi, astro do futebol, tem no autismo uma explicação para as qualidades que ele tem. Maior precisão, maior foco”. Mas, a apresentadora corrigiu-o de imediato, dizendo que isso é uma lenda urbana que não tem confirmação. E, minutos depois, ainda reforçou: “Olha, a gente tá aqui recebendo [a informação de] que o médico do Messi, por conta disso [a suspeita de que o atleta tem autismo] deu uma declaração dizendo que ele não tem autismo”.
Recentemente, a história voltou à tona, em julho de 2020, quando o ex-jogador francês Christophe Dugarry, ao comentar sobre a polêmica envolvendo o compatriota Griezmann, acabou atingindo também o craque argentino. “De que ele [Griezmann] tem medo? De um garoto de um metro e meio de altura que é meio autista? O que precisa fazer é se impor de vez em quando. Faz um ano que se diz que ele tem problemas com Messi. O que tem que fazer é dar um soco na cara”, disse Dugarry, de maneira rude, em entrevista à RMC Sport. Três dias depois ele se desculpou.
Famosos autistas, autistas famosos
Quer citar pessoas famosas que estão no espectro do autismo? Cite quem declara isso abertamente, como a escritora e especialista em ciência animal Temple Grandin, o ator Anthony Hopkins, a ecoativista Greta Thunberg, ou o mais recente famoso a mencionar publicamente seu diagnóstico de autismo, o bilionário Elon Musk, e tantos outros.
As informações são do site Canal do Autismo.
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