A preocupação com os altos índices de suicídio entre agentes da segurança pública no Paraná motivou a realização, na manhã desta terça-feira (26), da audiência pública “Saúde mental dos servidores da segurança pública”, uma iniciativa do deputado Goura (PDT), em parceria com o deputado Delegado Recalcatti (PSD) e o deputado Soldado Fruet (PROS). “Venho sendo procurado por servidores com problemas que tem prejudicado o desempenho de suas funções e vidas pessoais. Há um forte crescimento nos índices de ansiedade, depressão, drogadição e suicídio nas forças e segurança. Em 2018, morreram mais policiais civis e militares por suicídio do que em confrontos. Onze policiais tiraram suas vidas”, apontou Goura, citando o 13º Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
Goura relatou ainda que problemas psicológicos e psiquiátricos são responsáveis por 23% dos afastamentos de policiais praças da Policia Militar. Ele destacou a defasagem entre o aumento do efetivo da corporação e a estagnação das contratações de profissionais da psicologia. “Há apenas dez psicólogos para atender quase 23 mil policiais na ativa e 20 mil na reserva”, contou. O parlamentar falou ainda da ausência de um quadro de estruturação de um quadro de psicólogos especialistas no serviço militar, além de não constarem no quadro da corporação terapeutas ocupacionais e psiquiatras. “Cortes de direitos trabalhistas, falta de reajuste salarial, efetivo nas ruas e adequação da carga horária de trabalho”, também foram listados como agravantes entre os militares.
“Precisamos atuar na promoção da saúde destes servidores da Segurança Pública, de estabelecer jornadas de trabalho definidas com condições dignas, sejam militares, civis ou agentes penitenciários. Estes dados, do número de suicídios, de caso de depressão e afastamento por licença médica devem ser debatidos para que se possa aumentar a qualificação dos profissionais para que prestem um serviço melhor à sociedade”, afirmou Goura. De acordo com ele, é preciso estabelecer 40 horas semanais para a jornada dos militares. “Bombeiros, que fazem parte do quadro, estão atuando até mais de 50 horas por semana, atendendo em pronto-socorro e no SIATE. É importante que seja regulamentado e avance na Assembleia. É um trabalho estressante e nós temos que ter esta sensibilidade”, falou.
Para o deputado Delegado Recalcatti, que atuou por 40 anos na Polícia Civil, a carga emocional envolvida nas ações é muito forte. “Eu sei o que um policial enfrenta em seu dia a dia no trabalho e o que ele leva disso para sua casa. Tínhamos no Paraná uma lei que tratava da saúde mental dos policiais, mas a Procuradoria Geral do Estado entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra ela e hoje não temos mais nada que proteja estes profissionais”, explicou. “O policial lida com a morte, o roubo, o tráfico e por vezes tem seus familiares assassinados e isso afeta profundamente seu emocional”, contou.
De acordo com o deputado Soldado Fruet, os policiais militares trabalham em estado de alerta constante, com medo de morrer em confronto, em matar ou prender inocentes. “O medo de errar é o que o soldado leva para a rua”, explicou. A falta de motivação também foi relatada pelo parlamentar, que atuou na ROCAN na região de Foz do Iguaçu. “Muitos entram no alcoolismo e outros tiram as próprias vidas. Muitos se separaram de suas famílias por um conjunto de situações que forçam estas separações. Muitos não conseguem assimilar”, afirmou.
Participaram da audiência ainda: o deputado Professor Lemos; a deputada Luciana Rafagnin (PT); o desembargador Marcos Antônio Galliano Daros, membro da Comissão Permanente de Segurança do Tribunal de Justiça do Paraná; O coronel do Exército, João Alfredo Zampieri; o delegado da policia Civil, Orlando Zaccone; o perito criminal, Guilherme Bertassoni da Silva; a oficial da reserva da PM, major Cristina Muzeka; O aspirante a oficial da PM, Martel Alexandre; A agente penitenciaria, Petruska Sviercoski; o advogado Marcelo Jugend; e o professor de meditação transcendental. Gustavo Frederico Cerna Herrera.
Experiências – Orlando Zaccone, delegado da Policia Civil do Rio de Janeiro, falou dos servidores da segurança no estado fluminense. Para ele, é preciso enfrentar a questão de forma reativa, com hospitais próprios e mais servidores para a área de saúde especifica. “As políticas de segurança não são definidas pelos policiais, são impostas e colocam os profissionais nesta grave situação”, apontou. Zaccone citou o Anuário de Segurança Pública: “Em 2018 foram 343 policiais civis e miliares assassinados fora de serviço. Mas o policial nunca está fora do serviço, ele tem o dever de agir, mesmo de folga”, explicou, cobrando atenção à sobrecarga da categoria.
Segundo a Major Cristina Muzeka, ex-diretora de Saúde e chefe do Centro Terapêutico da Polícia Militar do Paraná, o stress na corporação é alto. “Este tema traz mal estar e espanto porque a doença mental é considerada perigosa e estas pessoas são tratadas de forma cruel. A saúde mental é multifatorial, assim como o tratamento deve ser, com psicoterapia, psiquiatria, medicina clinica, terapia ocupacional e espiritualidade, porque é o tratamento do ser humano”, afirmou.
Petruska Sviercoski, diretora jurídica do Sindicato dos Agentes Penitenciários (Sidarspen), falou do problema na categoria. “Temos cerca de 50% dos agentes tomando remédios de uso continuo e 80% destes usam por doenças de origem psicossocial. Eles convivem diariamente em um ambiente hostil, violento, sob ameaças, com falta de estrutura e poucos servidores, com desgaste físico e mental da tensão do trabalho. Grande parte não procura ajuda, chegam ao suicídio por não ter amparo, principalmente do Estado, que não tem políticas para reduzir os danos do trabalho no cárcere”, frisou.
Martel Alexandre, aposentado da Polícia Militar por depressão, contou sobre os dez anos que serviu à corporação. Hoje, com 29 anos, aspira ao oficialato. “É preciso compreender que a saúde mental não se faz só com psicólogos e psiquiatras”, frisou. Martel falou da perseguição que sofreu dentro dos quadros da Polícia Militar por ter feito críticas à conduta dela. “A minha vida mudou, fui transferido duas vezes em um ano, ficou nítido que foi por razões persecutórias, como represálias que me levaram a prisão pelo descumprimento de uma destas transferências”, relatou. “É importante que as pessoas tenham seus direitos de se expressar assegurados”, afirmou.
Deixe seu comentário sobre: "Melhoria nas condições do trabalho de policiais e agentes é debatida em audiência pública"