A personalidade de Marcos Willians Herbas Camacho, o “Marcola”, apontado pelas autoridades paulistas como líder da temida facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), já foi alvo de várias análises por vários especialistas. O psicólogo Augusto Sá, da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) de São Paulo, esteve frente a frente com o número 1 do PCC em 2006. Ele tinha a missão de negociar o fim da onda de terror que afligia a capital paulista.
Ao sair do encontro, Sá tinha uma certeza e uma ressalva. A certeza: Marcola era um homem ““autodeterminado, lúcido e assertivo, de firmeza, ousadia e coragem, que teria uma ascensão profissional muito grande se tivesse oportunidade”. A ressalva: isso não era, de maneira alguma, um elogio.
Nos anos que sucederam os ataques de 2006, Marcola consolidou seu leque de atributos. Foi com ele no comando que o PCC extinguiu de vez o uso de crack nos presídios dominados pela facção e deu um basta nos estupros entre detentos. Em compensação, o assassinato de desafetos dentro e fora das cadeias virou rotina. Entre os alvos mais marcantes estiveram o juiz-corregedor Antônio José Machado Dias, executado com oito tiros na cabeça em uma rua de Presidente Prudente (SP).
Mais organizado e temido, o PCC dominou de vez o sistema prisional de São Paulo – o maior do Brasil, com 231 mil detentos. Focado no tráfico de drogas, o Partido do Crime estendeu suas operações a novos lugares do país e se internacionalizou, convertendo-se no maior grupo criminoso do Brasil. Apesar de estar no topo do organograma do PCC, Marcola sempre negou a posição de líder máximo.
Órfão aos 9 anos
O pequeno Marcos estava predestinado a uma vida no crime. Órfão aos 9 anos, ele perambulava pelas ruas de São Paulo batendo carteiras e roubando toca-fitas na região do Glicério, Zona Central. O apelido de Marcola vem do tempo em que cheirava cola na Praça da Sé. Teve diversas idas e vindas da Febem até que, aos 18 anos, acabou preso por roubo a banco.
Foi parar no Carandiru, mas a passagem por outro presídio seria crucial para sua carreira. Em 1993, Marcola cumpria pena no anexo da Casa de Custódia de Taubaté, o Piranhão, quando o PCC estava sendo criado. Não deu outra: ao lado de Sombra, ele integrou o grupo dos primeiros bandidos batizados pelo Partido do Crime.
Status
De volta ao Carandiru, seu status começou a mudar. Marcola conseguiu fugir do maior presídio da América Latina em mais de uma oportunidade. Fora das grades, não perdia tempo em capitanear assaltos a bancos e a empresas de transporte de valores. Em um deles, sua quadrilha levou R$ 10 milhões. Em outro, R$ 5 milhões. Mas a vida de foragido não durou muito. Embora vivesse no Paraguai, Marcola não resistia à tentação de visitar o Brasil.
Em 1999, foi capturado por policiais que acharam um tanto suspeito aquele homem que dirigia um Dodge Stratus (na época, um carrão importado) na Marginal Tietê. Agora, Marcola também era conhecido como Playboy – porque gostava de se vestir bem, usar roupas de marca e investir na vaidade. É assim até hoje: em 2016, a Justiça negou um pedido de seus advogados para fazer aplicações de botox numa clínica fora da cadeia.
Com fama de galanteador, Marcola costumava causar certo frisson entre as namoradas de outros apenados. Aos cuidados com a aparência soma-se a predileção pela literatura, que dá ao líder do PCC um nível intelectual acima da média.
Fã de Nietzsche
Condenado a 232 anos e 11 meses por formação de quadrilha, roubo, tráfico de drogas e homicídio, Marcola rechaça a posição de chefe do PCC. Na CPI do Tráfico de Armas, em 2006, declarou: “Não existe um ditador. Embora a imprensa fale, romanticamente, que existe um cara, o líder do crime. Existem pessoas esclarecidas dentro da prisão, que com isso angariam a confiança de outros presos”.
Perspicaz, ele sabe o que pode acontecer quando o poder sobe à cabeça. Seus antecessores foram depostos da facção justamente por conta dos excessos de uma hierarquia abusiva. E Marcola sempre teve a sabedoria de se colocar entre os insatisfeitos – especialmente depois da morte de sua ex-mulher, Ana Olivatto.
Sereno na CPI
Durante a CPI, Marcola se manteve sereno e, muitas vezes, foi irônico. Em certo momento, disse que a sua relação com o PCC era apenas ideológica, sem envolvimento em qualquer tipo de crime. Noutro diálogo, sorriu quando um deputado perguntou se o seu livro predileto era A Arte da Guerra, de Sun Tzu – conforme uma reportagem da época. “Nem gosto muito. Meu preferido é Assim Falou Zaratustra, do Nietzsche.”
Em fevereiro de 2017, a Justiça de São Paulo determinou que Marcola e outros 10 membros do PCC permanecessem um ano no regime disciplinar diferenciado (RDD). Na penitenciária de segurança máxima de Presidente Bernardes, durante 12 meses ele viveu numa cela individual 22 horas por dia.
Fonte: Superinteressante/Editora Abril
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