MARCO AURÉLIO CANÔNICO
RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Na milionária e interminável briga familiar pela vida e obra de João Gilberto, 86, sua filha mais velha, Bebel, ganhou o round mais recente: conseguiu na Justiça a curatela provisória do pai, por 120 dias.
Com isso, pode decidir por ele sobre assinaturas de contratos e movimentações financeiras. A decisão foi noticiada pelo colunista Ancelmo Gois, de "O Globo". O processo corre em segredo de Justiça.
"João Gilberto está sob a curatela de Bebel. Ele apresenta, há alguns anos, um quadro confusional que não o permite compreender com clareza os atos jurídicos que lhe são solicitados por terceiros, resultando numa situação atual de absoluta penúria financeira", afirmou a advogada Simone Kamenetz, que representa Bebel.
Em junho, a Folha de S.Paulo noticiou que os filhos mais velhos de JG -além da cantora, o primogênito João Marcelo Gilberto, de mães distintas- buscavam interditá-lo para impedir que ele tomasse novas decisões sobre seu patrimônio.
O catalisador dessa iniciativa foi um contrato que João assinou com o Opportunity sob influência de Claudia Faissol, mãe e representante de sua filha caçula, Luiza, a quem os outros dois se opõem.
O contrato, ao qual a Folha de S.Paulo teve acesso, previa um empréstimo de R$ 10 milhões em duas parcelas iguais. A primeira foi paga na data da assinatura; a segunda ainda não saiu e é o foco da discórdia atual.
Pelo empréstimo, o banco levou 60% dos direitos autorais dos quatro primeiros discos de João, tornando-se responsável por administrá-los.
O Opportunity também assumiu uma briga que se arrasta há mais de 20 anos, contra a gravadora EMI, por royalties não pagos e lançamentos de CDs não autorizados.
Os filhos mais velhos, que vivem em Nova York, acusam Faissol de estar induzindo o cantor a tomar más decisões. "Eu e Bebel só estamos precisando tomar conta da situação e afastar oportunistas", disse João Marcelo à reportagem em junho. Procurado novamente para esta reportagem, ele não respondeu. Sua irmã e Claudia Faissol tampouco o fizeram.
Ao assumir o controle, Bebel Gilberto pode frear iniciativas planejadas por Faissol, como novos shows e a criação de um holograma do cantor.
CONTRATO FIRMADO
Ainda que tenha garantido a curatela temporária do pai, Bebel dificilmente conseguirá anular contratos anteriores, como o do Opportunity.
Os termos do acordo com o banco já se aplicavam a partir da assinatura que liberou o primeiro empréstimo (de R$ 5 milhões) ao artista. Na prática, o Opportunity já é dono dos percentuais da obra gilbertiana que negociou. Os advogados do banco assumiram a defesa de João contra a EMI e afirmam que "diversas vitórias importantes nos tribunais já foram obtidas".
Claudia Faissol, que intermediou o acordo e levou 10% da parte dos direitos autorais que ficaram com o banco, tem uma visão crítica sobre a atuação do Opportunity até agora.
"A morosidade do processo contra a EMI em muito tem prejudicado o artista, deixando parte importante da obra em estado de desleixo."
Ela também acusa o banco de não cuidar da gestão dos direitos autorais de João Gilberto, como deveria fazer desde que levou 60% deles. Em resposta, o Opportunity diz que "já investiu quantia superior a R$ 8 milhões, o que possibilitou elevar o potencial de exploração das obras", mas não detalha esse investimento.
AMEAÇA DE DESPEJO
A disputa entre seus familiares já havia feito João Gilberto desistir de pegar a segunda parcela do empréstimo do banco, apesar de sua situação de "absoluta penúria financeira", como definiu a advogada de Bebel.
"João está enfrentando um processo de despejo, além de responder a processos por não ter comparecido a compromissos profissionais contratados por terceiros em seu nome, o que acarretou em condenações indenizatórias em valores superiores a sua baixa renda", disse Kamenetz.
A advogada se refere a turnê dos 80 anos do cantor, em 2011, que chegou a ter ingressos vendidos. Como recebera adiantamentos e não os devolveu, JG foi processado e perdeu.
"Adicionalmente, a saúde de João vem se deteriorando, sem que os cuidados necessários estivessem sendo promovidos. Por todas essas razões, Bebel não viu alternativa senão a de interditar seu pai", afirmou Kamenetz.
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