Os pedidos de prisão por falta de pagamento de pensão alimentícia cresceram quase 44% na Comarca de Apucarana. Levantamento da Vara da Família, Infância e Juventude aponta 95 mandados de prisão expedidos pelo Judiciário no ano passado contra 66 no acumulado de 2020. Os números registrados em 2021 superaram até mesmo o período pré-pandemia (2019) que teve 75 mandados expedidos na comarca que, além do município sede, abrange também Cambira e Novo Itacolomi (veja o infográfico). Juristas consideram que a alta é reflexo do cenário de crise econômica gerado pela pandemia da Covid-19 que ainda implicou na suspensão temporária da prisão em regime fechado.
A juíza Ornela Castanho, titular da Vara de Família, Infância e Juventude, aponta uma sucessão de acontecimentos que impactaram os ajuizamentos. Entre as principais está a Determinação do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que suspendeu as prisões em regime fechado aos devedores de pensão alimentícia em março de 2020 para evitar a proliferação de casos de Covid.
“Diante da tal determinação os credores de pensão alimentícia preferiram aguardar até que se pudesse voltar a determinar a prisão em cárcere, já que a prisão domiciliar não surte o efeito desejado. O que pudemos perceber, claramente, no período em que não se pode, realmente, prender os devedores, quase não houve pagamentos, mesmo com a instalação da tornozeleira eletrônica”, observa a juíza Ornela Castanho.
Segundo a juíza, com a melhora no cenário da pandemia, em dezembro do ano passado o STJ autorizou a volta do regime fechado nas prisões por dívida alimentícia.
“Infelizmente, só com o estímulo de uma decisão que determina o encarceramento é que os devedores resgatam a responsabilidade pelo sustento dos filhos e pagam o débito, com o fim de evitar a prisão. Ou pagam o débito, ou entram em contato com os alimentados e fazem um acordo para pagamento, ou seja, na maioria das vezes, só mesmo com o decreto prisional é que a dívida se resolve e o filho tem garantido seu sustento”, afirma a juíza.
A queda registrada em 2020 também está diretamente ligada aos efeitos gerados pela pandemia, que impôs medidas restritivas a população e afetou seriamente a economia, causando desemprego. A magistrada lembra que naquele período as pessoas realmente ficaram em suas casas e que por isso não foram atrás de cobrar pensões atrasadas.
“Penso também que o fato de que os credores da pensão entenderam que os devedores estavam passando por dificuldades, assim como todo mundo estava. Todos ficaram assustados e em compasso de espera, então, com espírito de colaboração, penso que esperaram um pouco e toleraram atrasos e aceitaram, voluntariamente, pagamentos menores”, comenta.
No ano seguinte a situação mudou. A juíza comenta que mesmo compreendendo a dificuldade econômica dos devedores, não foi mais possível esperar e novas execuções foram ajuizadas.
Ela reforça ainda que a Justiça não parou de trabalhar durante a pandemia, contudo foi uma fase de mudanças em que todos os atendimentos passaram a acontecer de forma virtual.
Encargo de sustentar filhos recai sobre um dos genitores
A advogada Elaine Caliman Soares, que atua na área da família, considera o aumento bastante expressivo e preocupante. Segundo ela, o índice revela que o encargo de sustentar o filho está recaindo exclusivamente sobre um dos genitores, o que é absolutamente injusto.
“Principalmente se pensarmos que muitas das vezes esse genitor que detém a guarda do filho não dá conta de prover integralmente suas necessidades e a criança acaba sendo tolhida de um crescimento minimamente saudável”, analisa.
A advogada reforça que a legislação brasileira coloca como dever do pai e da mãe o sustento dos filhos na proporção dos seus recursos. “Logo, se o genitor deixa de pagar a pensão, evidentemente a criança sofrerá privações materiais que poderão impactar no seu desenvolvimento”, considera.
Desemprego e distanciamento social contribuíram com aumento
O desemprego gerado pela quebra de muitas empresas durante a pandemia da Covid-19, aliado ao distanciamento dos pais em relação aos filhos, contribuíram para o descumprimento das pensões alimentícias, aumentando, por consequência, o número de prisões civis, acredita a advogada Elaine Caliman Soares.
De acordo com ela, o Código Civil e Estatuto da Criança e do Adolescente, estabelecem que os pais têm o dever de prover as necessidades dos filhos. Quanto ao valor da pensão, depende da necessidade dos filhos e a possibilidade do genitor ou genitora. A pensão corresponde a 1/3 da renda do devedor dos alimentos ou 1/3 de um salário mínimo, quando não há emprego formal.
O não cumprimento da obrigação alimentícia é o único ilícito civil que pode levar uma pessoa à prisão, segundo explica a advogada. Pela falta de pagamento, o infrator pode ficar em reclusão de 30 a 90 dias, a depender do entendimento do juiz responsável pelo processo. Lembrando que o cumprimento da pena não exime o devedor do pagamento da pensão devida. Além disso, o Código Civil prevê ainda a penhora de bens do devedor.
Por, Cindy Santos
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