A Câmara de Apucarana acertou no processo de substituição do cargo de vereador aberto após a morte do vereador Pastor Valdir. A análise é do advogado Paulo Ferraz, especialista em direito eleitoral e advogado do partido Podemos, que avaliou o caso a pedido do TNOnline.
O vereador Pastor Valdir (PSL) morreu na última quinta-feira (21), vítima de complicações da Covid-19. Na sexta-feira (22), a Câmara de Vereador deu posse para Eliana de Lourdes de Lima Rocha (PP). Com 1.422 votos, Eliana foi diplomada como suplente do partido. "Pelos fundamentos lançados pela Câmara Municipal, a posse não foi dada ao candidato Toninho Garcia do PSL, posto que esse obteve 467 (quatrocentos e sessenta e sete voto), ou seja, não alcançando o limite mínimo de 10% (dez por cento) do quociente eleitoral determinado pela norma do art. 108 do Código Eleitoral", analisa o advogado no parecer.
Segundo o advogado, com a reforma ocorrida no Código Eleitoral no ano de 2015 (Lei n.º 13.615/2015) o legislador entendeu por bem estabelecer o que chamamos de “cláusula de desempenho” dos candidatos. "Tal regra foi inserida na legislação eleitoral a fim de inibir os casos de candidatos com inexpressiva votação, mas que alçavam um local no legislativo em razão dos chamados “puxadores de voto”", destaca.
A posse de Eliana Rocha foi suspensa em controversa decisão liminar proferida na noite de sexta-feira (26) pela juíza eleitoral substituta Marcia Pugliese Yokomizo em ação impetrada pelo Partido dos Trabalhadores (PT), que pede a redistribuição da vaga. Além de suspender a posse de Eliana Rocha, a decisão determinou que a Câmara dê posse a Toninho Garcia.
Veja o documento na íntegra
PARECER JURÍDICO
ASSUNTO:
Análise sobre a possibilidade da Câmara Municipal de Apucarana dar posse a candidato que não atingiu a cláusula de barreira, em razão Da vacância por falecimento do titular.
EMENTA
VACÂNCIA POR FALECIMENTO – VEREADOR – SUPLENTE QUE NÃO ULTRAPASSOU A CLÁUSULA DE DESEMPRENHO – ART. 108 DO CÓDIGO ELEITORAL – IMPOSSIBILIDADE DE POSSE DEFINITIVA – RECÁLCULO DAS CADEIRAS ENTRE OS DEMAIS PARTIDOS.
RELATÓRIO
O vereador Pastor Valdir Silvério dos Reis, filiado ao Partido Social Liberal (PSL), foi eleito para o cargo de vereador no município de Apucarana no pleito de 2020, obtendo 764 (setecentos e sessenta e quatro votos).
Foram contabilizados nas eleições de 2020 no referido município 60.271 (sessenta mil duzentos e setenta e um) votos válidos. A Câmara Municipal de Apucarana possui 11 (onze) vagas a serem preenchidas, o que, dessa forma, leva-se à conclusão de que o quociente eleitoral foi de 5.479 (cinco mil quatrocentos e setenta e nove) (Q.E. 60.270 / 11 = 5.479).
Após a posse do candidato eleito Pastor Valdir Silvério dos Reis, esse veio a falecer, extinguindo-se, nos termos do 22 da Lei Orgânica do Município, o seu mandato.
A Câmara então procedeu com a posse da candidata Eliana de Lourdes de Lima Rocha, do Partido progressista (PP), tendo a mesma alcançado o número de 1.422 (mil quatrocentos e vinte e dois votos).
Pelos fundamentos lançados pela Câmara Municipal, a posse não foi dada ao candidato Toninho Garcia do PSL, posto que esse obteve 467 (quatrocentos e sessenta e sete voto), ou seja, não alcançando o limite mínimo de 10% (dez por cento) do quociente eleitoral determinado pela norma do art. 108 do Código Eleitoral.
Cinge-se, então, o presente a analisar se a referida decisão da Câmara foi ou não acertada. Vejamos.
FUNDAMENTAÇÃO
Com a reforma ocorrida no Código Eleitoral no ano de 2015 (Lei n.º 13.615/2015) o legislador entendeu por bem estabelecer o que chamamos de “cláusula de desempenho” dos candidatos.
Tal regra foi inserida na legislação eleitoral a fim de inibir os casos de candidatos com inexpressiva votação, mas que alçavam um local no legislativo em razão dos chamados “puxadores de voto”.
Assim o art. 108 do Código Eleitoral assim prevê atualmente:
“Art. 108. Estarão eleitos, entre os candidatos registrados por um partido ou coligação que tenham obtido votos em número igual ou superior a 10% (dez por cento) do quociente eleitoral, tantos quantos o respectivo quociente partidário indicar, na ordem da votação nominal que cada um tenha recebido.” (grifo nosso).
De imediato percebe-se que o legislador determinou de forma clara e indene de dúvidas que “estarão eleitos” apenas os candidatos que obtiverem número igual ou superior a 10% (dez por cento) do quociente eleitoral.
Certo ainda que, nos moldes da própria jurisprudência formada, o mandato pertence ao partido e não mais ao candidato, não havendo o que se discutir nas últimas eleições acerca de Coligação, visto que vedada para as eleições proporcionais.
Assim, com o falecimento do candidato eleito Pastor Valdir Silvério dos Reis do PSL, em primeira análise, o mandato deve ser preenchido pelo candidato subsequente mais bem votado.
E é nesse momento em que se inicia a análise das condições legais de elegibilidade para que o suplente tome posse em definitivo, dentre elas a regra do art. 108 do Código Eleitoral.
No caso em análise tem-se que o suplente mais bem votado do PSL é o candidato Toninho Garcia que obteve 467 (quatrocentos e sessenta e sete voto), número de votos abaixo dos 10% (dez por cento) do quociente eleitoral), mais especificamente, 8,52% (oito virgula cinquenta e dois por cento).
O suplente somente pode tomar posse definitiva se preencher todos os requisitos legais, dentre eles o número mínimo de votos, não podendo se confundir a norma do art. 108 do Código Eleitoral com a norma do art. 112 do mesmo codex, posto que essa, é inerente única e exclusivamente para fins de diplomação e casos de posse temporária.
E nesse sentido trazemos julgado do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba que muito bem esclareceu a questão de necessidade de preenchimento dos requisitos legais para a posse definitiva do suplente:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDATO ELETIVO. VEREADOR. REPRESENTAÇÃO PROPORCIONAL. SUPLENTE. CLÁUSULA DE BARREIRA. VOTAÇÃO QUE NÃO ALCANÇOU, EM NÚMEROS ABSOLUTO, DEZ POR CENTO DO QUOCIENTE ELEITORAL PARA SER CONSIDERADO ELEITO. DECISÃO DO JUÍZO AGRAVADO DETERMINANDO A SUSPENSÃO DA POSSE DO RECORRENTE. IRRESIGNAÇÃO. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ARTIGO 300 DO CPC. DECISÃO LIMINAR DO RELATOR MANTENDO A DECISÃO AGRAVADA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL COMUM. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. NECESSIDADE DE AFERIÇÃO DE QUESTÃO CONSTITUCIONAL PARA A RESOLUÇÃO DA LIDE. APRECIAÇÃO DA MATÉRIA PELO TRIBUNAL PLENO. IMPOSSIBILIDADE DO ASSUNÇÃO A TITULARIDADE DO MANDATO ELETIVO, PELO SISTEMA PROPORCIONAL, SEM ATINGIMENTO DA CLÁUSULA MÍNIMA DE DESEMPENHO PREVISTA NO ARTIGO 108 DO CÓDIGO ELEITORAL. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. DESPROVIMENTO DO RECURSO.
...
- O art. 108 do Código Eleitoral, com a redação dada pela Lei n.º 13.165/2015, passou a prevê que serão eleitos, entre os candidatos registrados por um partido ou coligação, aqueles que alcancem votos em número igual ou superior a 10% (dez por cento) do quociente eleitoral, contudo, o parágrafo único do art. 112, do Código Eleitoral, com redação dada pela mesma Lei n.º 13.165/2015, prevê: “Na definição dos suplentes da representação partidária, não há exigência de votação nominal mínima prevista pelo art. 108.”
...
- A cláusula de barreira, criada pela Lei n. 13.165/2015, encontra ampla ressonância no princípio da soberania popular, prevista no art. 1.º, parágrafo único, da Constituição Federal, bem como com o princípio da adequada representatividade, prevista no art. 44 da Constituição Federal.
...
- Se o partido, ou coligação, não possui em seus quadros de suplência um candidato com um número mínimo de votos, o mandato do titular, extinto, levará a extinção da representatividade partidária na Casa Legislativa, devendo o cargo vago ser ocupado nos termos do art. 109 do Código Eleitoral.
...
- Logo, a norma contida no art. 112, parágrafo único do Código Eleitoral é constitucional, contudo, comporta limitação limitações na sua interpretação, a fim de adequar-se, inteiramente, aos princípios da soberania popular e da adequada representação proporcional.
- TESE FIRMADA: É constitucional o art. 112, parágrafo único do Código Eleitoral, para fins de formação da lista de suplência da representação partidária, podendo o primeiro suplente do partido, ou da coligação, assumir o Mandato, sem ter atingido a cláusula mínima de desempenho, apenas em caráter temporário, sendo vedada a titularidade do mandato por Suplente que não preencha todas as condições de elegibilidade, dentre as quais destaca-se o número mínimo de sufrágios, conforme previsto no art. 108 do Código Eleitoral. Devendo a vaga, caso não existam suplentes dentro do partido ou da coligação, que preencham os requisitos legais para titularizar o mandato, ser preenchida nos moldes do art. 109 do Código Eleitoral.” (TJPB, Agravo de Instrumento n.º 0800670-50.2019.8.15.0000, Rel. Des. Leandro dos Santos, 1ª Câmara Cível, juntado em 24.outubro.2019) (grifo nosso).
Não restam dúvidas, assim, que o suplente Toninho Garcia do PSL, embora primeiro na linha sucessória da referida agremiação, não poderá tomar posse definitiva em razão da “cláusula de desemprenho”.
Assim resta sabermos quem efetivamente deve assumir a referida vaga.
E para isso traz o art. 109 do Código Eleitoral a solução, qual seja, de recalculo das cadeiras pertencentes a cada um dos partidos, in verbis:
“Art. 109. Os lugares não preenchidos com a aplicação dos quocientes partidários e em razão da exigência de votação nominal mínima a que se refere o art. 108 serão distribuídos de acordo com as seguintes regras:
I - dividir-se-á o número de votos válidos atribuídos a cada partido ou coligação pelo, mais um, cabendo ao partido ou coligação que apresentar a maior média um dos lugares a preencher, desde que tenha candidato que atenda à exigência de votação nominal mínima;
II - repetir-se-á a operação para cada um dos lugares a preencher;
III - quando não houver mais partidos ou coligações com candidatos que atendam às duas exigências do inciso I, as cadeiras serão distribuídas aos partidos que apresentem as maiores médias.”
Ou seja, somente seria autorizado dar posse definitiva a um candidato que não tenha obtido a votação mínima se, nenhum dos demais também tivesse alcançado a referida votação.
Havendo partido(s) com candidato(s) que tenha(m) ultrapassado a “cláusula de desempenho” deverá a esses serem divididas as cadeiras remanescentes, dentre elas as provenientes de vacância por falecimento.
Diante disso, realizando-se o recálculo no caso em concreto, verifica-se que o Partido Progressista (PP) é quem teria direito à referida cadeira e, nesse caso, possuindo a referida agremiação candidato(a) que alcançou o mínimo de 10% (dez por cento) do quociente eleitoral, deverá ao mais votado(a) ser dada posse definitiva.
CONCLUSÃO
Diante dos fatos e fundamentos acima esposados, nosso entendimento é de que a Câmara de Vereadores da cidade de Apucarana/PR agiu de forma correta e em respeito à legislação vigente, quando da determinação de posse definitiva à vereadora eleita Eliana de Lourdes de Lima Rocha em razão da vacância por falecimento pelo então vereador Pastor Valdir Silvério dos Reis.
É o parecer.
Curitiba, 25 de janeiro de 2021.
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