O vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) foi alvo nesta segunda-feira, 29, de buscas na investigação que apura suspeita de uso indevido da estrutura da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante o governo Jair Bolsonaro (PL). Agentes da Polícia Federal cumpriram mandados no gabinete de Carlos, na Câmara Municipal do Rio, na residência dele, na Barra da Tijuca, zona oeste da cidade, e na casa de veraneio de Bolsonaro, em Angra dos Reis, no litoral sul do Estado, onde Carlos passa as férias. Foram apreendidos um celular do vereador, além de notebook, computadores desktop e documentos.
A nova etapa do inquérito mira o "núcleo político" vinculado aos servidores da Abin sob suspeita. A PF busca identificar os "principais destinatários e beneficiários das informações produzidas ilegalmente".
De acordo com os investigadores, no governo passado, foi instalada uma "Abin paralela" para monitorar pessoas consideradas adversárias de Bolsonaro e atuar por interesses políticos e pessoais do ex-presidente e de seus filhos.
A ofensiva foi um desdobramento da Operação Vigilância Aproximada, que, na semana passada, vasculhou endereços do ex-diretor da Abin Alexandre Ramagem. O hoje deputado pelo PL do Rio é suspeito de acobertar a espionagem durante sua gestão no comando da agência. Ele nega. Ramagem é pré-candidato à prefeitura do Rio este ano, com apoio da família Bolsonaro, e é próximo de Carlos.
Mensagens
Além do vereador, são citados na investigação uma assessora de Carlos na Câmara Municipal, Luciana Paula Garcia da Silva Almeida; uma assessora de Ramagem na Câmara dos Deputados, Priscila Pereira e Silva; e um militar do Exército cedido para a Abin, Giancarlo Gomes Rodrigues.
Na casa de Rodrigues, em Salvador, foi apreendido um notebook da Abin. A mulher do militar é servidora da agência. Houve, ainda, diligências em Brasília e em Formosa (GO). Os mandados foram autorizados pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.
Foram mensagens de Luciana Almeida que, segundo a PF, colocaram Carlos no centro das investigações. A assessora do vereador pediu a uma auxiliar de Ramagem, na época diretor da Abin, informações sobre dois inquéritos de interesse da família Bolsonaro. "Estou precisando muito de uma ajuda", escreveu Luciana.
Ela informa o número das investigações e indica que elas envolveriam o "PR (presidente da República) e 3 filhos".
Para a PF, as mensagens reforçam a suspeita de que aliados de Bolsonaro tinham acesso à chefia da Abin e usavam o canal para obter informações sigilosas e sobre "ações não totalmente esclarecidas". A conversa foi descoberta com a quebra dos sigilos telefônico e de mensagens de Ramagem.
Pescaria
O advogado da família Bolsonaro, Fábio Wajngarten, afirmou nas redes sociais que o ex-presidente e os filhos não estavam na casa de Angra dos Reis quando os agentes da PF chegaram. Segundo Wajngarten, eles saíram para pescar às 5h.
Além Carlos e do pai, estavam em Angra o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP).
Imagens registradas pela GloboNews mostraram Bolsonaro e Carlos, por volta das 11h, em frente à casa, acompanhando a saída de policiais. O vereador não havia se manifestado até a noite da segunda-feira.
Live
No domingo, Bolsonaro e os três filhos fizeram uma live da casa de veraneio para lançar um programa de formação para candidatos a vereador e reforçar a polarização com o PT nas eleições municipais. Na transmissão ao vivo, o ex-presidente negou a existência de uma "Abin paralela" durante seu governo e defendeu Ramagem, a quem chamou de "um cara fantástico".
Bolsonaro ainda disse que, como presidente da República, não recebia informações dos sistemas de inteligência "oficiais". "Para mim não chegava nada", declarou ele, acrescentando que mantinha outros canais de informações. "Muitas vezes eu ligava para um posto militar e perguntava: 'Como é que foi a chacina na cidade?' Essa era a minha inteligência", afirmou o ex-presidente ao lado dos filhos.
Na segunda-feira, Bolsonaro negou ter recebido qualquer informação da Abin de forma ilegal. Eduardo Bolsonaro criticou a operação da PF e afirmou que a ordem de buscas autorizada por Moraes é "imoral".
Crimes
Ao autorizar novas buscas, Moraes falou em "contrainteligência". "A organização criminosa identificada na Abin era, potencialmente, uma das células de organização criminosa de maior amplitude, cuja tarefa primordial era realizar a 'contrainteligência' de Estado", disse o ministro, relator do caso no STF.
Os investigadores afirmam ter encontrado indícios de que, além da espionagem ilegal de desafetos e adversários políticos, os sistemas de inteligência do Estado podem ter sido usados para conseguir informações sobre investigações sigilosas da PF.
De acordo com a PF, a ofensiva apura possíveis crimes de invasão de dispositivo informático alheio, organização criminosa e interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.
Um dossiê com dados de inquéritos eleitorais em tramitação na PF no Rio teria sido impresso em fevereiro de 2020, ano de eleições municipais, por Ramagem. O documento foi mencionado pela PF ao pedir autorização do Supremo para deflagrar a nova fase ostensiva da investigação, desta vez com buscas em endereços de Carlos Bolsonaro.
A Operação Vigilância Aproximada é continuação da Operação Última Milha, que, em outubro de 2023, prendeu servidores da Abin suspeitos de usar o sistema FirstMile - de geolocalização de telefones celulares - para coerção.
As informações são do jornalO Estado de S. Paulo.