Narcisista tem pouco molejo, diz filósofo Luiz Felipe Pondé

Autor: Da Redação,
sexta-feira, 03/07/2015

JULIANA GRAGNANI, ENVIADA ESPECIAL
PARATY, RJ (FOLHAPRESS) - Lotada, a Casa Folha recebeu o filósofo e colunista da Folha de S.Paulo Luiz Felipe Pondé para falar sobre narcisismo na manhã desta sexta-feira (3), em Paraty, onde ocorre a 13ª edição da Festa Literária Internacional de Paraty, a Flip.
No debate, medidado pelo jornalista da Folha de S.Paulo Fernando Canzian, Pondé também comentou seu livro recém-lançado, "Os Dez Mandamentos (+ um)" (Três Estrelas, R$ 29,90, 128 págs.).
Canzian iniciou o debate chamando atenção para os mecanismos da atualidade que podem reforçar o aspecto narcisista do dia a dia, como o Facebook e outras redes sociais e a prática de tirar "selfies" -há uma "relação de amor enorme" entre os instrumentos e o narcisismo, disse o filósofo.
"Narcisista tem pouco molejo", afirmou Pondé. "Se você não tiver amor próprio, você vai ao solo."
Para o filósofo, a tendência é ficar mais dependente das redes sociais ao longo do tempo -ou seja, quanto mais velha uma pessoa for, mais ligada será ao ser perfil na rede-, e não o contrário.
Divertiu o público ao dizer que "todo mundo está mal". "Quando você está pensando muito em você, você está mal", afirmou. "Os melhores dias são aqueles em que você nem lembra que você existe."
Pondé citou pesquisas do historiador e critico social Christopher Lasch (1932-1994), cuja previsão, feita nos anos 1970, de que o narcisismo seria uma espécie de epidemia social, se cumpriu, segundo Pondé. E definiu o narcisismo: "Você se olha o tempo inteiro. É uma espécie de epidemia de pessoas solitárias com muita dificuldade de vínculos".
O envelhecimento seria o inimigo do homem narcisístico e o sinal de que a velhice está chegando, segundo pontuou Pondé -provocando mais risos-, é a perda da "saúde, beleza e a capacidade de encher a cara e acordar uma hora depois e fazer o que tem que fazer".
O colunista da Folha citou também a teoria do "narcisismo antecipado", que enxerga a condição como algo positivo. "É como se fosse melhor ser narcisista. A pessoa sabe que amor não existe, que é melhor não investir nos outros. O narcísico sabe que vínculos duradouros são uma obsessão neurótica."
Mas é preciso desvendar a mentira desse narciso, disse Pondé. "Uma das saídas do depressivo é dizer que na realidade ele é cínico, dizer que não precisa das outras pessoas, que é bem resolvido", disse. Como solução, propôs lançar luz sobre a dificuldade de amadurecimento da pessoa narcísica.
Uma leitora que disse ora amar, ora odiar as colunas de Pondé na Folha lhe perguntou sobre as pessoas que não querem ter filhos -relacionadas por ele à cultura do narcisismo.
"É um marcador comportamental da ideia de vínculos. Há pessoas que não querem ter filhos e há pessoas que é melhor mesmo que não tenham", afirmou, sob aplausos. E reproduziu o que seria um discurso narcisístico: o filho entraria na lista de coisas para se ter ou cumprir, entre outros desejos mais banais, como ter um cachorro e viajar para o Vietnã.
CORAGEM
Em seu novo livro, o filósofo propõe um 11º mandamento: "terás esperança no mundo". "Quando chegou a proposta [de escrever um livro que desse continuidade aos dez mandamentos], pensei: 'putz, vou fazer uma errata dos dez mandamentos?'", contou, arrancando risos da plateia.
"É difícil. Para ter esperança no mundo, é preciso coragem", disse. "Escrevi o 11o mandamento porque eu não consigo!".