Em dia de inapetência por risco na B3, desconectada da disparada de preços dos ativos listados em Nova York - especialmente os de tecnologia (Nasdaq +2,51%), mais sensíveis no curto prazo aos juros norte-americanos -, prevaleceu na Bolsa brasileira o sentimento pós-Copom, combinado de certa forma ao pós-Fed. Por lá, as dúvidas sobre recessão têm ficado para trás, e com sinais mais amenos sobre a inflação, a expectativa é de que o BC americano siga adiante com os cortes de juros - o que em tese beneficiaria emergentes como o Brasil, e não apenas os ativos de risco nos Estados Unidos, como nesta quinta-feira.
Por aqui, contudo, embora Selic mais alta tenha o potencial de atrair recursos especialmente para renda fixa, o olhar imediato para o comunicado do Copom foi de alerta para a mudança na visão do BC sobre o hiato do produto, de neutra para o campo positivo, combinada também à assimetria altista destacada no balanço de riscos, observa Guilherme Jung, economista da Alta Vista Research.
Assim, a curva de juros doméstica avançou neste pós-Copom, com olhar detido do mercado sobre a elevação da projeção do Comitê, ainda que leve, na estimativa para o IPCA no horizonte relevante da política monetária, até o primeiro trimestre de 2026. O conjunto da obra, no comunicado, é de um BC ainda hawkish na transição de comando que se avizinha, no fim do ano. Nesse contexto, avançam apostas de que os próximos dois aumentos da taxa de juros de referência sejam mais graúdos, de meio ponto porcentual cada, o que colocaria a Selic a 11,75% no fim do ano - e chegando a 12% já na reunião seguinte, em janeiro de 2025, como reiterou na noite da quarta-feira, 18, Rodolfo Margato, economista da XP.
Pelo segundo dia seguido, o Ibovespa fechou, nesta quinta, na mínima da sessão, em baixa de 0,47%, aos 133.122,67 pontos, agora no menor nível desde 13 de agosto. Nesta quinta, oscilou entre a mínima do fechamento e a máxima de 134.758,76 pontos, saindo de abertura aos 133.747,64. Após o vencimento de opções sobre o Ibovespa no dia anterior, o giro financeiro recuou nesta quinta-feira para R$ 22,1 bilhões, convergindo para patamar um pouco acima da média recente. Na semana, o índice da B3 cai 1,30% e, no mês, cede 2,12%. No ano, acumula perda de 0,79%.
Nesta quinta-feira, o ajuste se manteve relativamente contido porque a ação de maior peso no Ibovespa, Vale ON, subiu 1,20% - com o minério em alta na China na sessão -, em fechamento negativo para os grandes bancos, como Bradesco (ON -1,03%, PN -1,38%), e misto para Petrobras (ON -0,30%, PN +0,33%) apesar da alta acima de 1,5% para o petróleo Brent e WTI no dia seguinte à suavização dos juros americanos. Na ponta ganhadora nesta quinta, Marfrig (+4,32%), BRF (+4,20%) e Prio (+1,90%). No lado oposto, Brava (-9,40%), Assaí (-5,72%) e Hapvida (-4,08%).
"Lá fora, o mercado reagiu muito bem ao início de corte de juros nos Estados Unidos, e com tom substancialmente mais dovish ameno, o oposto de hawkish de Jerome Powell, o presidente do Fed", diz Matheus Falci, sócio e assessor da One Investimentos. "Como esperado, o Copom veio na contramão do Fed, com alta da Selic e tom mais duro no comunicado, enfatizando ainda preocupação frente à desancoragem das expectativas de inflação, o que desenha a magnitude do ajuste ainda esperado para a política monetária brasileira, adiante", acrescenta.
"O Fomc do Fed cortou em meio ponto e o Copom subiu em 0,25 ponto porcentual ontem. A decisão do BC americano, de certa forma, estava um pouco menos precificada do que a que se viu aqui. Era de se esperar abertura na curva de juros doméstica, ainda nos próximos dias, antes que venha uma normalização", diz Camilla Dolle, head de renda fixa da XP.
"Momento é de o investidor olhar para renda fixa, que deve atrair mais fluxo, inclusive estrangeiro com o início dos cortes de juros nos Estados Unidos, que beneficia emergentes - e o Brasil ainda tem ativos descontados. Eventualmente, deve-se olhar também para algumas teses específicas em Bolsa, que pode ainda atrair recursos de estrangeiros para segmentos com os de bancos e energia", diz Charo Alves, especialista da Valor Investimentos.