Após três pregões seguidos de queda, o dólar não apenas voltou a subir no mercado doméstico nesta sexta-feira, 6, como renovou novo pico histórico nominal no fechamento. Além de ajustes de prêmios de risco associados à incerteza fiscal, diante de receios crescentes de desidratação do pacote de contenção de gastos do governo no Congresso, a queda do real está ligada à valorização global da moeda americana e ao tombo das commodities, em especial do petróleo e do minério de ferro.
Dados do relatório de emprego (payroll) nos EUA em novembro vieram mistos, com geração de vagas acima do previsto, mas aumento da taxa de desemprego. Já os números preliminares da confiança do consumidor americano subiram para nível superior às expectativas na passagem de novembro para dezembro. Embora tenham aumentado hoje as apostas de que o Federal Reserve vai promover nova redução da taxa básica americana em 25 pontos-base neste mês, há receio de que haja menos espaço para afrouxamento monetário ao longo de 2025.
Com máxima a R$ 6,0925 à tarde, em sintonia com o exterior, o dólar à vista fechou em alta de 1,02%, a R$ 6,0708, maior valor nominal de fechamento da história do real, após os R$ 6,0680 no último dia 2. A moeda encerrou a primeira semana de negócios em dezembro com valorização de 1,16%, após ter subido 3,81% em novembro. No ano, o dólar tem ganhos de 25,54% em relação ao real.
Lá fora, o índice DXY, termômetro do comportamento da moeda americana em relação a uma cesta de seis divisas fortes, voltou a superar os 106,100 pontos, com máxima aos 106,121 pontos à tarde, sobretudo em razão de ganhos frente ao euro. Parte dos analistas aposta em enfraquecimento ainda maior da moeda europeia, dado o dinamismo da economia americana e a perspectiva de cortes maiores de juros pelo Banco Central Europeu (BCE). Entre divisas emergentes e de exportadores de commodities, as maiores perdas foram do real e do dólar australiano e neozelandês.
O economista-chefe da Nova Futura Investimentos, Nicolas Borsoi, pondera que, apesar dos fatores globais desfavoráveis, o real sofreu mais que pares hoje com a busca de posições mais defensivas à medida que se aproxima a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), na próxima quarta-feira, 11. Ele chama a atenção para a possibilidade de o relatório Focus, que sai na segunda-feira, 9, trazer revisão significativa para cima do IPCA de 2025.
"Parte do mercado já espera 100 pontos-base de alta da Selic na semana que vem. Vejo já um movimento de investidores tentando se proteger do risco de o comitê entregar menos do que precisa para estancar a desancoragem das expectativas em momento de aumento da incerteza fiscal", afirma Borsoi, acrescentando que parecem crescer as chances de desidratação do pacote de corte de gastos, "que já não era ideal", durante a tramitação das medidas no Congresso.
Deputados ouvidos pelo Estadão, em especial do PT, admitiram resistência a aprovar regras que endurecem o acesso de idosos e pessoas com deficiência de baixa renda ao Benefício de Prestação Continuada. Alterações no BPC constam tanto no projeto de lei complementar (PLP) que revê programas sociais quanto na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que traz as medidas fiscais. O governo espera economizar R$ 2 bilhões por ano com a revisão no BPC e R$ 12 bilhões ao longo de seis anos.
"Os desdobramentos do pacote de corte de despesas continuam influenciando os mercados, com impacto possivelmente menor que o estimado pelo governo. A resistência a pontos específicos, como os ajustes do BPC, indica uma possível desidratação do projeto inicial, contribuindo para a piora dos ativos domésticos", afirma a economista-chefe da Armor Capital, Andrea Damico, ressaltando que o real termina a semana com desempenho pior em comparação com o seus pares.