O dólar emendou o terceiro pregão consecutivo de queda em relação ao real nesta quinta-feira, 5, e esboçou fechar abaixo do nível psicológico de R$ 6,00, algo não visto desde 28 de novembro. Os sinais de que o pacote de gastos do governo vai ser apreciado com celeridade no Congresso e o enfraquecimento da moeda americana no exterior abriram espaço para ajustes nos prêmios de risco embutidos na taxa de câmbio.
No fim da noite de ontem, a Câmara dos Deputados aprovou requerimento de urgência para dois projetos que compõem o plano da equipe econômica: um relacionado ao crescimento real do salário e outro que traz novos gatilhos para o arcabouço fiscal, como limitação na compensação de créditos tributários e autorização de contingenciamento e bloqueio de emendas parlamentares.
Operadores e analistas ouvidos pelo Broadcast nos últimos dias consideravam que havia espaço para uma recuperação, ainda que parcial, da moeda brasileira, em caso de sinais favoráveis de Brasília e acomodação do dólar no exterior. Isso apesar de mostrarem ceticismo em relação à economia estimada com as medidas fiscais e apontarem uma derrapada de comunicação do governo ao anunciar conjuntamente o pacote de contenção de gastos com a proposta de isenção de Imposto de Renda para quem recebe até R$ 5 mil por mês.
Em baixa desde a abertura, o dólar à vista furou o piso de R$ 6,00 na primeira hora de negócios e registrou mínima a R$ 5,9608 pela manhã. Com uma moderação do ritmo de baixa ao longo da tarde, a divisa encerrou a sessão em baixa de 0,63%, a R$ 6,0097. Apesar do recuo nos últimos dias, o dólar ainda acumula valorização na semana (0,14%)
O economista André Galhardo, consultor econômico da plataforma de transferências internacionais Remessa Online, já classificava, na semana passada, a reação dos investidores ao pacote de gastos como "desproporcional" e esperava uma recuperação do real, embora reconheça que havia motivos para um aumento do estresse, em especial "a intempestividade" do anúncio da isenção do IR.
"O problema foi a magnitude desse estresse. O mercado tem reagido muito mal aos acontecimentos recentes. No começo do ano, mesmo sem os impactos do Rio Grande do Sul, já se falava em déficit primário superior a R$ 100 bilhões neste ano", afirma Galhardo. "Em alguma medida, essa votação de pedido de urgência para matérias de corte de gastos ajudou a moeda brasileira, porque o dólar também caiu no exterior."
Termômetro do comportamento da moeda americana em relação a uma cesta de seis divisas fortes, o DXY recuou e voltou a ser negociado abaixo dos 106,000 pontos. Houve fortalecimento do euro após o desenlace da crise política na França, com a renúncia do primeiro-ministro, Michel Barnier. A safra mais recente de indicadores mostra certa acomodação da economia dos EUA e embasa a perspectiva de que o Federal Reserve vai promover novo corte de 25 pontos-base da taxa básica de juros neste mês. Amanhã, sai o relatório oficial de emprego (payroll) em outubro, o que pode reforçar essa expectativa.
Galhardo observa que, após o relatório ADP divulgado ontem, com criação de vagas de emprego no setor privado aquém das expectativas, sugerir continuidade do processo de desaceleração do mercado de trabalho nos EUA hoje saíram números de pedidos semanais de auxílio-desemprego acima do esperado.
"Estamos no médio de um processo de desaceleração da atividade econômica nos EUA, ainda que incipiente. E isso traz um movimento de perda de força do dólar em nível global. Isso contribuiu também para a valorização do real", afirma o consultor da Remessa Online.
Apesar da queda do dólar nos últimos dias, o desconforto com o quadro fiscal ainda permeia os negócios e leve casas relevantes a revisar para cima a projeção para a taxa de câmbio. O Deutsche Bank, por exemplo, espera dólar a R$ 6,10 no fim deste ano, argumentado que o governo não conseguiu apresentar "medidas críveis" e que o Banco Central "não tem sido capaz de assegurar aos mercados sua capacidade de conter a desvalorização do real".