O Estado de São Paulo deu início à primeira saída temporária a pessoas presas no regime semiaberto após mudanças na lei aprovadas pelo Congresso. Apesar da restrição implementada pela nova legislação, que veta a chamada "saidinha" para visitas de presos às famílias, o Tribunal de Justiça paulista disse que não houve alteração na portaria que regulamenta o benefício. A Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP) estima que 35 mil tenham sido liberados.
A mudança foi aprovada pelo Congresso e parte dela recebeu veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Esse veto acabou derrubado pelos parlamentares, restituindo o fim das saidinhas para visita de presos às famílias. Uma discussão jurídica está em andamento para decidir se a alteração já vale para a população carcerária atual ou apenas para pessoas presas a partir do início da validade da alteração. Em decisão monocrática, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) André Mendonça decidiu pela validade apenas para os novos detentos.
No Estado paulista, cerca de 35 mil pessoas presas foram beneficiadas, devendo retornar aos presídios na próxima segunda-feira, 17, apesar de mudança na lei. Esta é a segunda saída temporária do ano.
Questionada, a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) disse que apenas cumpre decisão judicial e quem determina as regras é o TJ-SP.
Por sua vez, o TJ-SP disse que "por ora, não houve alteração da Portaria nº 02/2019 do Departamento Estadual de Execução Criminal (Deecrim), que regulamenta as saídas temporárias."
Além disso, segundo o órgão, os juízes do Deecrim que cuidam das execuções de pena em regime semiaberto analisaram se os presos preenchiam os requisitos para essa saída temporária antes da extinção do benefício. Portanto, a saída de 11 de junho foi mantida.
Conforme o órgão, a questão ainda será estudada, pois é preciso decidir se se trata de uma questão de direito material penal ou de direito processual.
"Se for determinado que se trata de um direito penal material, então a lei não retroagirá. Caso contrário, ou seja, se for decidido que é uma questão de direito processual, então não será mais concedido o benefício. Porém, isso será analisado caso a caso."
Mais de cem são recapturados no primeiro dia
Ao menos 115 detentos beneficiados pela saída temporária foram recapturados pela Polícia Militar na terça-feira, 11, no primeiro dia da "saidinha" autorizada pela Justiça. Conforme a SSP, eles estavam violando as regras impostas para ter direito a medida.
Segundo a SSP, a maioria das prisões aconteceu na região de Campinas, com 37 detentos recapturados. Na capital paulista, foram 31 prisões. Em seguida aparecem Piracicaba (15), Ribeirão Preto (12), Bauru (8), Sorocaba (6), Araçatuba (2), São José dos Campos (2) e São José do Rio Preto (1) e Santos (1).
"Assim que recebem o benefício e saem do presídio, os presos ficam proibidos de sair da cidade, frequentar bares, boates, envolver-se em brigas, andar armado ou praticar qualquer outro ato considerado grave perante a Justiça. Ainda devem permanecer em casa no período noturno", acrescenta a secretaria.
No Estado paulista, após ser flagrado infringindo as regras, o detento é encaminhado ao Instituto Médico Legal (IML). Posteriormente, ele é conduzido para um dos Centros de Detenção Provisória ou para a Penitenciária Feminina da capital.
"O acordo de cooperação entre a SSP e o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) permite que os policiais tenham acesso às informações dos detentos beneficiados. Dessa forma, é possível verificar durante a abordagem se as regras da saída temporária estão sendo cumpridas", afirma a SSP.
A primeira saída temporária de presos neste ano ocorreu entre 12 e 18 de março. Na ocasião, a polícia recapturou 452 detentos violando as medidas judiciais. A maioria das prisões, naquela época, aconteceu na capital paulista, com 162 registros.
Segundo relatório da Defensoria Pública do Estado, como reportado pelo Estadão no início de maio, que analisou ao menos 157 prisões efetuadas no período, a maioria dos presos em saída temporária recapturados pela polícia em São Paulo não estava cometendo crimes. Em 61,7% dos casos, as pessoas foram detidas por estarem em vias públicas entre 19 horas e 6 horas da manhã, quando deveriam estar em casa. A Defensoria vê as prisões como ilegais pela ausência de ordem judicial prévia que as embase.
A SSP disse na ocasião que está realizando desde 2023 operações com foco nos presos beneficiados com a saída temporária. Nas abordagens, o objetivo é verificar se as regras administrativas do benefício estão sendo cumpridas. A pasta afirmou ainda que todas as prisões passaram pelo crivo da Justiça em audiências de custódia.
Congresso derruba veto de Lula e acaba com a saidinha de preso para visitar família
No dia 28 de maio deste ano, o Congresso Nacional derrubou veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao projeto que trata da saída temporária de presos do regime semiaberto, a "saidinha". Quando vetou, Lula queria manter a permissão de visita de presos à família.
No entanto, com a derrubada do veto, esse benefícios fica impedido. Foi mantido apenas o direito de condenados deixarem a prisão para fazer cursos profissionalizantes ou de ensinos médio e superior.
STF julgará diretamente no plenário ação contra proibição da saidinha de presos
Relator da ação que questiona o fim da saída temporária de presos, o ministro Edson Faschin, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu enviar o processo para julgamento direto no plenário. A informação foi divulgada pelo STF na segunda-feira, 10.
"Entendo que a matéria apresentada ostenta evidente relevância e possui especial significado para a ordem social e para a segurança jurídica, razão pela qual aplico o rito", escreveu o ministro ao submeter o processo diretamente ao plenário.
A ação sobre a "lei das saidinhas" é movida pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A entidade pede que a reforma promovida pelo Congresso seja declarada inconstitucional. Segundo a OAB, o poder público tem o dever de promover a ressocialização dos detentos e as saídas temporárias são uma política eficiente para a reintegração gradual dos presos ao convívio social.
O processo ainda não foi liberado para ser incluído na pauta. Antes disso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o Congresso Nacional poderão enviar informações. Da mesma forma, a Advocacia-Geral da União (AGU) e a Procuradoria-Geral da República (PGR) também devem se manifestar, sucessivamente. (Colaboraram José Maria Tomazela, Weslley Galzo e Augusto Tenório)