O Ministério da Justiça estima que deverá arrecadar, até o fim deste ano, cerca de R$ 200 milhões com mais de 100 leilões de bens apreendidos de organizações criminosas. De acordo com as autoridades brasileiras, esse tipo de medida representa também economia de recursos públicos gastos com a manutenção dos bens pelo Estado, enquanto o trânsito em julgado dos casos é aguardado.
Segundo o secretário nacional de Políticas sobre Drogas, Luiz Roberto Beggiora, em muitos casos leva-se até dez anos até que o julgamento seja finalizado, o que resulta, inclusive, na deterioração de muitos dos bens.
“Não era comum a venda antecipada desses bens. Antes se aguardava o trânsito em julgado, que podia durar até dez anos, para poder transformar esse bem em recurso público, o que resultava na deterioração, na perda do valor econômico e no acúmulo de bens em pátios, o que gerava custos para o Estado, inclusive para a manutenção”, disse nesta terça-feira (18) o secretário durante o webinário União Europeia-Brasil: melhores práticas na gestão de bens apreendidos, organizado pelo Ministério da Justiça.
Segundo ele, a gestão de ativos “é problema mundial em função do trabalho das polícias, no sentido de descapitalização de organizações criminosas”.
Crimes diversos
Durante a abertura do webinário, o ministro da Justiça, André Mendonça, disse que a criminalidade que tem seus bens apreendidos atua em diversas áreas, “envolvendo desde crimes de extração ilícita de minérios e madeira a tráfico de drogas e armas, até corrupção, tráfico de pessoas e de órgãos. E, no meio de todo esse emaranhado, está a lavagem de dinheiro do produto ilícito”.
Mendonça acrescentou que esses criminosos atuam “de modo empresarial”, em uma rede estruturada não só nacionalmente mas internacionalmente, e em uma cadeia que tem por objetivo último a obtenção do lucro da atividade ilícita.
“Se enfrentamos a criminalidade que está em rede, precisamos atuar em uma rede estruturada. Daí a importância de uma agência especializada em recuperação de ativos e de uma rede cooperativa integrada de sistemas, seja no território nacional, seja em um ambiente de cooperação internacional”, afirmou o ministro.
Cooptação de empresas
O embaixador da União Europeia (UE) no Brasil, Ignacio Ybañez, falou sobre os aspectos transnacionais de diversas práticas criminosas e o que elas representam em termos de perda de tributação, concorrência desleal frente a negócios legais, violência e do alto custo social da violência para famílias e indivíduos.
“Em uma situação de pandemia, tem tido impacto tão forte nas nossas economias que empresas frágeis podem se tornar presas fáceis de atividades criminosas, piorando ainda mais a situação”. Ibañez defendeu que o Estado investigue, analise e processe as atividades criminosas complexas.
Segundo ele, há mais de 5 mil grupos de organizações criminosas sob investigação na Europa. As receitas desses grupos naquele continente movimentam cerca de 110 bilhões de euros por ano. No entanto, a Europol estima que apenas cerca de 2% das receitas dos crimes estão congeladas e somente 1% é confiscado na UE.
“A reutilização de propriedades apreendidas para o interesse público, com fins sociais, é uma forma clara de devolver o que foi roubado ou adquirido ilegalmente”, argumentou o embaixador.
Aplicação dos recursos
Beggiora, da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, listou alguns dos benefícios que são esperados a partir das mudanças implementadas na legislação brasileira. Entre eles estão a redução da curva de desvalorização dos ativos, os menores custos ao Poder Público e a disponibilização de informações mais confiáveis sobre a localização dos bens.
Ele citou também algumas aplicações bem-sucedidas dos recursos obtidos a partir de ações de combate às organizações criminosas. É o caso da criação do Centro de Desenvolvimento de Cães de Faro na Polícia Rodoviária Federal, que será inaugurado em janeiro de 2021 a um custo de R$ 4,2 milhões.
“Além de formar os profissionais que trabalharão com esses cães, o centro distribuirá matrizes de cães para todo o país”, disse o secretário.
Outro projeto que vem sendo beneficiado com esses recursos é o Cloacina, que por meio da análise de esgotos gera estimativas sobre o uso de drogas nas cidades brasileiras. “Além de identificar o uso, o projeto ajudará na identificação de descarte de material de laboratório de produção de droga, já que consegue mapear a existência desse tipo de laboratório, de forma a melhor focar as ações da segurança pública na área”.