Bicheiro Rogério de Andrade é preso por assassinato de rival

Autor: Renata Okumura e Weslley Galzo (via Agência Estado),
quarta-feira, 30/10/2024

Apontado como o maior bicheiro do Rio, Rogério de Andrade foi preso na manhã desta terça-feira, 29, em sua casa, na Barra da Tijuca, em ação conduzida pelo Grupo de Atuação Especializada de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público fluminense. Também foi cumprido mandado de prisão contra o ex-policial militar Gilmar Eneas Lisboa. A reportagem não localizou a defesa de nenhum dos dois.

O Gaeco os denunciou à Justiça pelo homicídio qualificado de Fernando de Miranda Iggnácio, ocorrido em novembro de 2020, no estacionamento de um heliporto no Recreio dos Bandeirantes. Segundo as investigações, Rogério seria o mandante do crime. Os mandados da operação Último Ato foram expedidos pela 1.ª Vara Criminal do Tribunal do Júri e foram cumpridos na Barra da Tijuca e em Duque de Caxias.

De acordo com informações do MP-RJ, Rogério será transferido para presídio federal. Conforme decisão da 1.ª Vara Criminal, ele aguarda a transfrerência em Bangu 1 (presídio de segurança máxima do Rio).

Segundo a Justiça, a prisão preventiva dos denunciados se mostra necessária à garantia da ordem pública diante da gravidade dos crimes. "Praticados de forma audaciosa e cinematográfica, com espetacularização do poder paralelo, o que incute na população temor e incerteza quanto à intervenção do poder público em solucionar a situação de violência que aterroriza a população", diz o documento.

Família em guerra

Iggnácio e Andrade eram, respectivamente, genro e sobrinho de Castor de Andrade, um dos mais famosos contraventores da história do Rio. Rogério assumiu o controle do jogo após a morte do tio, em 1997. À época, o filho de Castor, Paulinho, era apontado como sucessor natural, mas ele foi morto cerca de um ano depois. Rogério chegou a responder como mandante, mas foi absolvido.

Ele já tinha sido denunciado pela morte de Iggnácio em março de 2021. Mas, em fevereiro de 2022, a 2. Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) trancou a ação penal contra Rogério, alegando falta de provas (leia nesta página).

Seguindo a tradição familiar, Rogério tem fortes ligações com o carnaval do Rio. Ele é patrono da Escola de Samba Mocidade Independente de Padre Miguel, do Grupo Especial, seis vezes campeã do carnaval, a primeira em 1979 e a última em 2017. As primeiras cinco conquistas foram quando Castor de Andrade era patrono da escola. Na mais recente, o sobrinho já havia sucedido o tio. Rogério tem aparecido com mais frequência nas redes sociais desde que sua mulher, Fabíola Andrade, se tornou rainha de bateria da Mocidade neste ano.

Relembre o crime

Iggnácio foi morto a tiros de fuzil em 10 de novembro de 2020, após desembarcar de um helicóptero no Recreio dos Bandeirantes, na zona oeste da cidade. Segundo informado pela polícia à época, por volta das 13h15, ele chegou na aeronave, vindo de Angra dos Reis, no sul fluminense. Após sair do helicóptero, no heliponto da empresa Heli-Rio, na Avenida das Américas, ele caminhava para embarcar em um carro, quando foi atingido pelos tiros. De acordo com a nova denúncia do Gaeco, Lisboa foi o responsável por monitorar a vítima até o momento do crime.

Conforme o Tribunal de Justiça do Rio, pela acusação do assassinato de Iggnácio serão levados ao 1.º Tribunal do Júri os PMs Rodrigo Silva das Neves, Otto Samuel dOnofre Andrade Silva Cordeiro e o ex-PM Pedro Emanuel dOnofre Andrade Silva Cordeiro, irmão de Otto. No decorrer do processo, morreu Ygor Rodrigues Santos da Cruz, que também havia sido denunciado pelo crime. As defesas não foram localizadas.

STF já suspendeu prisão e trancou processo

Não foi a primeira vez que Andrade foi denunciado pelo MP e teve prisão expedida. Outro mandado pela acusação de crime contra o rival Fernando Iggnácio já havia sido tema de ação no Supremo Tribunal Federal (STF) e teve resultado favorável ao contraventor.

Em março de 2021, o MP-RJ ofereceu denúncia contra Andrade na 1.ª Vara Criminal do Rio e pediu a prisão preventiva dele e de outros denunciados. A demanda dos procuradores foi atendida, mas o caso virou alvo de uma disputa de recursos entre o bicheiro e o MP que só se deu por encerrada no STF. Os advogados do bicheiro pediram que o caso fosse trancado.

O processo de Andrade foi distribuído por prevenção ao ministro Kassio Nunes Marques, que já atuava como relator de um habeas corpus apresentado pelo chefe da segurança de Andrade, o policial reformado Márcio Araújo de Souza. O guarda-costas é acusado de ter contratado, a mando do bicheiro, os criminosos que assassinaram Iggnácio.

Pouco mais de um mês após o caso do bicheiro chegar ao seu gabinete, Nunes Marques suspendeu o decreto de prisão preventiva até que a ação que pedia a suspensão do caso fosse julgada definitivamente. A Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestou contra a decisão do ministro.

Em fevereiro de 2022, a Segunda Turma do STF julgou o pedido do bicheiro e decidiu encerrar a ação penal oferecida pelo MP-RJ contra ele. Nunes Marques, na condição de relator do processo, argumentou que o trancamento do caso não impediria que as investigações continuassem, tampouco que nova denúncia fosse apresentada contra o bicheiro. O voto de Nunes Marques foi acompanhado pelos ministros André Mendonça, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes. Apenas o ministro Edson Fachin divergiu.

Andrade chegou a ficar preso alguns meses em 2022, mas foi solto após um habeas corpus concedido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e passou a ser monitorado pelo equipamento eletrônico. Em abril, outra decisão favorável ao bicheiro foi tomada pelo ministro Nunes Marques. Na ocasião, ele suspendeu a necessidade do uso de tornozeleira e do recolhimento noturno.

Equipe jurídica

Os advogados de Andrade no STF são bem conectados no mundo jurídico. Um deles é o ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Paulo Galloti. Outro nome importante do meio jurídico que integra a equipe é o ex-presidente do Tribunal de Justiça de Santa Catarina Rodrigo Collaço. (COLABOROU JOSÉ MARIA TOMAZELA)

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.