Em exame para engravidar, mulher acha câncer raro e agora luta pelo bebê

Autor: Da Redação,
quinta-feira, 26/10/2017

THAIZA PAULUZE

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A decisão de ter um filho marcou o início da batalha pela saúde de Luciana Cafure, 32, médica em Campo Grande (MS). Recém-casada, ela decidiu fazer exames de rotina antes de engravidar quando descobriu um tipo raro e maligno de câncer no abdômen, chamado de mesotelioma peritoneal. A cirurgia indicada no seu caso envolve a retirada dos dois ovários, acabando com as chances de uma gravidez do modo tradicional.

"A operação custa R$ 150 mil e, após 3 meses de muita negociação, o convênio irá cobrir 70% do valor. O restante será parcelado e pago direto do meu salário", diz ela, que, em meio a tantos custos, tratamentos e operações, sente o baque da infertilidade.

Luciana conta que ser mãe sempre foi um sonho, assim como se formar em medicina e casar de véu e grinalda, os dois últimos já realizados. "Meu futuro filho salvou minha vida", diz, enquanto chora. Agora, uma fertilização in vitro é sua única chance de ter bebês biológicos. O processo custa R$ 25 mil, dinheiro que ela e o marido, Kelvin Felipe Gimenes, não têm.

Ansiosos pela chegada do primogênito, o casal apelou para a solidariedade via internet. Mobilizaram amigos, criaram uma "vaquinha" on-line e em cinco dias conseguiram cerca de 60% do valor, o suficiente para iniciar as duas injeções diárias que Luciana terá que tomar antes do congelamento de seus embriões.

A força-tarefa conta também com a ajuda dos agentes de saúde que trabalham com a médica. Eles estão vendendo em vários bairros da cidade as 1.200 rifas feitas pelo casal com prêmios doados.

Os presentes arrecadados vão desde ensaio com o fotógrafo do casamento, hidratação de cabelo no salão de uma amiga, cama infantil doada por uma paciente, bolo oferecido pela cunhada doceira e até bolsa de grife, dada por uma blogueira e youtuber que se comoveu com a luta de Luciana. Tem ainda um bazar solidário sendo organizado para o próximo sábado (28).

OUTRO LADO DO ATLÂNTICO, MESMA DOR

A 9.604 km de Campo Grande, em Londres, outra jovem se viu impelida a ajudar. A motivação foi sentir na pele o sofrimento da brasileira. Danielle Smalley, 23, descobriu o mesmo tipo de câncer raro, em abril, mês em que Luciana abria o envelope com o diagnóstico no Brasil.

As duas mulheres irão fazer, no início de novembro, o procedimento para fertilização in vitro e, em três semanas, a cirurgia que pode deixar as duas inférteis.

"Eu estou muito assustada. Eu vou sobreviver? Eu vou poder ter filhos? Ser mãe é algo que nunca imaginei na minha idade, mas estou feliz de ter tempo suficiente para congelar os meus óvulos", contou Smalley ao jornal britânico "The Daily Mirror", notícia na qual Luciana se reconheceu. Ela entrou em contato com a mulher que agora chama de "gêmea" e, desde então, as duas se falam diariamente pela internet.

As doações para a "vaquinha" da brasileira também atravessaram continentes, vindo não só da Inglaterra, mas de Estados Unidos, Irlanda e Noruega.

CÂNCER MASCULINO

A história das duas, ao mesmo tempo, faz parecer que esse câncer é comum, mas o mesotelioma atinge apenas uma pessoa a cada 1 milhão de habitantes no mundo por ano, segundo dados do Inca (Instituto Nacional de Câncer). O diagnóstico é frequentemente tardio e grave e, na maioria dos casos, acomete homens com mais de 55 anos.

Aparecer em duas mulheres novas e sadias fez surgir uma série de dúvidas, nos dois países. No caso delas, a doença é no peritônio, que envolve todos os órgãos do abdômen. Por isso, talvez seja necessário retirar também o útero durante a cirurgia, impossibilitando uma fertilização in vitro, plano A delas.

No caso de Luciana, o plano B é a "barriga de aluguel" da sogra, que se ofereceu para gerar os embriões que serão guardados antes do procedimento cirúrgico –que deve durar cerca de 17 horas. Já para Smalley, mais nova, ainda é cedo para pensar em alternativas.

Esse tipo de tumor é também conhecido como o câncer do amianto, embora para os médicos a relação entre a exposição à substância tóxica e o aparecimento da doença não seja consenso.

No Brasil, sete Estados proíbem o uso e o comércio de produtos com amianto: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Pernambuco, Santa Catarina, Amazonas e Mato Grosso do Sul, onde Luciana vive. No Reino Unido, onde Smalley mora, também é proibido.