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Tornei-me escritora para dar sepultura aos meus mortos, diz ruandesa na Flip

FERNANDA MENA PARATY, RJ (FOLHAPRESS) - A curadora Josélia Aguiar abriu a última mesa da quinta-feira (27) citando o fato de a Flip -Festa Literária Internacional de Paraty já ter tido uma mesas chamadas Em Nome do Pai e Em Nome do Filho, mas nunca Em Nom

Da Redação

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Escrito por Da Redação
Publicado em 27.07.2017, 23:25:06 Editado em 27.07.2017, 23:25:06
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FERNANDA MENA

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PARATY, RJ (FOLHAPRESS) - A curadora Josélia Aguiar abriu a última mesa da quinta-feira (27) citando o fato de a Flip -Festa Literária Internacional de Paraty já ter tido uma mesas chamadas Em Nome do Pai e Em Nome do Filho, mas nunca Em Nome da Mãe, título do encontro entre a escritora ruandesa que vive na França Scholastique Mukasonga e a brasileira Noemi Jaffe.

Scholastique, 61, é autora de "A Mulher de Pés Descalços" (ed. Nós), livro dedicado a sua mãe, assassinada no genocídio de Ruanda, em 1994. A escritora teve outros 26 familiares assassinados no massacre que vitimou 800 mil pessoas naquele ano, exterminando 70% das pessoas da etnia tútsi.

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Jaffe, 55, escreveu "O Que os Cegos Estão Sonhando?" (Companhia das Letras) com sua mãe, uma sobrevivente do campo de Auschwitz.

"Não acho que é possível comparar graus de sofrimento, mas li na obra da Scholastique níveis de tortura que nunca encontrei em nenhum registro sobre o nazismo. Então, as shoás continuam acontecendo em locais como Ruanda ou, agora, a Síria", disse Jaffe.

As autoras foram incitadas a refletir sobre Primo Levi (1919-1987), escritor italiano que foi prisioneiro de Auschwitz e relatou os horrores do Holocausto em "É Isso um Homem?", obra que declaradamente influenciou ambas.

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Scholastique afirmou ter compreendido, como Levi, o dever do sobrevivente de testemunhar, de preservar a memória do genocídio para que ele nunca seja esquecido. "Você pode ser cego mesmo enxergando, mesmo com os olhos abertos. E eu havia sido salva e tinha de salvar essa memória."

Já Jaffe explicou que a necessidade e o dever de escrever sobre a guerra são a mesma coisa. "Além de saber que tenho uma mãe que passou por tudo aquilo, eu sinto culpa por não ter passado por aquilo. Uma culpa absurda, mas que existe. Uma vontade de poder ter estado lá para impedir que acontecesse com ela aquilo que aconteceu", disse, questionando-se se não teria se tornado escritora justamente para poder "lembrar o que minha mãe precisou esquecer".

"Minha mãe viveu a tragédia e eu vivo o drama, que fica sempre aquém", disse, emocionada neste e em muitos outros momentos da conversa.

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A escritora ruandesa explicou que nunca havia sonhado em se tornar escritora. "Mas o destino fez de mim escritora pelo dever de memória, porque houve o genocídio."

"Tornei-me escritora para encontrar meios de dar uma sepultura aos meus mortos. Eu tinha de tirá-los da vala comum e a solução que se apresentou para mim foi a de construir uma sepultura com as palavras. Fazer um túmulo de papel e poder assim esperar passar pelo meu luto, que não é um esquecimento."

A escritora africana contou que a mãe sempre pediu às cinco filhas que, quando ela morresse, cobrissem seu corpo com uma mortalha. "Mas eu não estava lá para fazer isso. E foi a escrita que me permitiu tecer a mortalha para cobrir o corpo de minha mãe. As palavras têm poder de reparação."

Ela falou que chama a mãe pelo nome próprio, e não de "mamãe", porque mãe é um termo universal -mas Stefania era uma só.

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