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Paulistanos enfrentam assédio e desinformação ao enterrar parentes

FABRÍCIO LOBEL E MARIANA ZYLBERKAN SÃO PAULO, SP E SÃO PAULO (FOLHAPRESS) - Assim que a última pá de terra cobriu o caixão de Dirce Machado, 59, no cemitério municipal Campo Grande, na zona sul de São Paulo, um coveiro se aproximou da família. Como se coc

Da Redação

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Escrito por Da Redação
Publicado em 26.06.2017, 07:20:08 Editado em 26.06.2017, 17:05:17
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FABRÍCIO LOBEL E MARIANA ZYLBERKAN

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SÃO PAULO, SP E SÃO PAULO (FOLHAPRESS) - Assim que a última pá de terra cobriu o caixão de Dirce Machado, 59, no cemitério municipal Campo Grande, na zona sul de São Paulo, um coveiro se aproximou da família. Como se cochichasse, disse que poderia fazer um jardim de flores sobre o túmulo. A homenagem sairia R$ 300, pagos ali, na hora, e sem recibo.

David da Cruz, filho de Dirce, achou a abordagem inapropriada e negou o pagamento. "Estavam tentando se aproveitar da nossa fragilidade naquele momento para induzir a cobrança de um serviço que não era regular."

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Desinformação, constrangimento, falta de estrutura, cooptação de funerárias particulares e tentativa de cobrança de taxas extraoficiais são problemas enfrentados por quem sepulta parentes e amigos em São Paulo.

A prefeitura, que detém o monopólio dos serviços funerários na cidade, anunciou que deve concedê-los à iniciativa privada, assim como a administração dos 22 cemitérios municipais, na expectativa de cortar despesas e melhorar a qualidade da atividade, segundo a gestão João Doria (PSDB).

Hoje, a saga das famílias começa na porta do IML (Instituto Médico Legal) ou do SVO (Serviço de Verificação de Óbitos). São esses dois órgãos que emitem atestados de óbito quando a morte ocorre em circunstâncias que devem ser apuradas, como em casa ou em locais públicos e de forma violenta.

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Logo nessa fase, a família pode ser assediada por agentes funerários particulares que atuam de forma irregular na capital. Eles trabalham em funerárias de cidades da Grande São Paulo, onde suas atividades são permitidas, e ficam a postos na frente dos dois órgãos à espera de "negócios".

A falta de informação e o momento delicado das famílias são terreno fértil para os agentes abordarem e venderem pacotes funerários que custam até R$ 5.200. Quem aceita a oferta enterra o parente em cemitérios da região metropolitana de SP.

CAMINHO DIFICULTADO

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Desde o final do ano passado, as direções do IML e do SVO decidiram dificultar o trabalho desses agentes e instalaram, dentro de cada órgão, contêineres com funcionários do serviço funerário municipal.

Antes, os interessados que apareciam nesses locais para organizar um enterro tinham que ir até um posto de atendimento fora dali, o que facilitava os atravessadores.

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Incomodados com a queda da clientela, esses agentes funerários reagiram. Um deles entrou com pedido de abertura de inquérito do Ministério Público acusando dirigentes do IML e SVO de prestar indevidamente serviços funerários dentro dos órgãos. Mas o pedido foi arquivado em abril.

Ao mesmo tempo, altos funcionários dos dois órgãos registraram boletins de ocorrência na polícia após ameaças de morte recebidas por mensagens de celular. Um deles passou a andar com segurança particular e carro blindado. A Polícia Civil está investigando as denúncias.

Para dificultar a ação dos agentes, o Ministério Público tenta transformar o entorno dos órgãos em área de segurança nacional, para que o acesso seja controlado.

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SAGA

Após os trâmites no IML e no SVO, o caminho correto para a família é contratar da prefeitura um kit com caixão, flores e ornamentos, além de taxas pelo sepultamento e pelo transporte do corpo até o cemitério. Os preços vão de R$ 263 a R$ 20 mil (famílias carentes têm opção gratuita).

Os preços do kit são determinados pelo tipo de caixão escolhido. Há 22 opções, mas em abril apenas nove modelos eram encontrados nas agências. O tipo mais em conta custa R$ 138, no entanto nem sempre está disponível.

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A falta de acesso à versões mais baratas, aliada ao receio em relação à qualidade do material, faz a maioria das famílias gastar mais para enterrar seus parentes —46% compram o caixão que custa R$ 843. Apenas 19% escolhem um dos modelos mais baratos. Entre esses dois, há apenas um tipo de caixão com preço intermediário, ao custo de R$ 634.

Segundo agentes do serviço funerário, porém, ele quase nunca está disponível e, por isso, representa apenas 3% das vendas da prefeitura.

A urna mais barata encontrada pela secretária Claudia Santos, 38, para enterrar sua mãe custava custava R$ 717, além de ornamentos. Ela conta que se preocupou com a qualidade do material para aguentar o peso. "Perguntei se o caixão era de papelão, e a atendente me disse: 'É como se fosse'." Com medo, a secretária optou pelo modelo seguinte na escala de preço, no valor de R$ 1.940.

Até os ornamentos podem sair bem mais caros. O conjunto de três ou quatro velas pode custar R$ 2,12 ou R$ 60, a depender do tipo de caixão escolhido pela família. É muito comum também a família ser constrangida a pagar taxas extraoficiais. Em abril, um agente funerário foi exonerado após denúncias de que teria cobrado indevidamente pelo transporte de um corpo até o cemitério Vila Carmosina, na zona leste.

Jesiel Calazans, 49, relata que o funcionário de um hospital público cobrou R$ 100 para limpar e arrumar o corpo de seu pai. "O agente da prefeitura disse que eu teria que aprontar o corpo. Eu não sabia o que isso queria dizer."

Da família de Claudia Santos foram cobrados cerca de R$ 150 pelo mesmo serviço dentro de um hospital público. "Agora eu vou ter que pagar para que o funcionário público faça o trabalho dele?", questiona. Segundo a prefeitura, essa tarefa cabe à unidade de saúde.

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